Notícia n. 4901 - Boletim Eletrônico IRIB / Agosto de 2003 / Nº 783 - 19/08/2003
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
783
Date
2003Período
Agosto
Description
Novo Código Civil. Direito de família. Debate sobre mudanças. - Com a vigência não só do novo Código Civil, há mais de seis meses, mas também dos progressos alcançados pela Ciência e pelas diferentes correntes do pensamento, algumas reflexões têm desafiado os operadores do Direito. Entre elas: houve alterações significativas no Direito de Família? Como magistrados têm julgado questões polêmicas como direitos resultantes de uma união estável, guarda de filhos ou adoção por pessoas de mesmo sexo que estejam residindo sob o mesmo teto? Estimulado a responder a essas indagações, o juiz da 1ª Vara de Família de Belo Horizonte, Newton Teixeira Carvalho, avaliou que o legislador, com o novo Código, perdeu uma excelente oportunidade para regulamentar a Constituição Federal, principalmente, no capítulo dedicado à família, à criança e ao idoso. "Verifica-se que, com relação à união estável, por exemplo, houve, sim, um retrocesso, quanto à partilha de bens, alimentos e à sucessão, se compararmos às legislações então vigentes. Aliás, o grande avanço no Direito de Família veio com a Carta Magna que considerou, entre outras formas para a constituição de família, além do casamento, a união estável e a monoparental (comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes)", relata o juiz. Essa opinião é compartilhada pelo presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), Rodrigo da Cunha Pereira. "A jurisprudência e a doutrina, em muitos aspectos, já estavam mais avançados, quando da edição do novo Código Civil. O avanço mais significativo foi a possibilidade do reconhecimento da paternidade sócio-afetiva, quando foi regulamentado que o parentesco pode ser natural, civil ou de outra origem". Rodrigo Pereira avalia que alguns temas poderiam ter sido contemplados no novo Código, entre eles, a regulamentação da guarda compartilhada. "A discussão de quem é a culpa pelo fim do casamento continua sendo um dos sinais de atraso do ordenamento jurídico, afinal a separação é dos pais e não deveria envolver os filhos", diz. Nesse ponto, o juiz Newton Carvalho revela que as decisões, envolvendo guarda de filhos, têm procurado encontrar qual dos cônjuges tem melhores condições de cuidar dos menores, e, se for o caso, até mesmo terceiras pessoas poderão ficar com a guarda, se os pais separados não tiverem aptos a cuidar dos menores. A advogada, professora e mestre, Juliana Gontijo, avalia que no Direito de Família há regras que apenas consagram o que já estava incorporado e absorvido na teoria e na prática, entre elas, a isonomia no tratamento dos filhos, naturais ou não, e a igualdade dos direitos do homem e da mulher, havendo inovações pelas quais realmente a sociedade ansiava e está pronta para elas, por exemplo, a manutenção do dever alimentar independentemente da culpa do cônjuge necessitado e a possibilidade de se pedir alimentos, a qualquer tempo, renunciados na separação. "Por outro lado, perdeu-se a oportunidade para fazer inovações que passam da hora de acontecer, como eliminação da necessidade de publicação de editais no processo de habilitação para o casamento civil, o que só o encarece e o torna mais demorado". A assessora do TJMG, Sérgia Rosalina Gomes, considera que o novo Código Civil avançou "quando abre a possibilidade do reconhecimento de filhos gerados por fecundação artificial homóloga, tratando-se de embriões excedentários, decorrentes de concepção não natural e filhos havidos por inseminação artificial". No entanto, ela acredita que o novo Código deixou de tocar na questão da união civil entre homossexuais. "A jurisprudência tem reconhecido a união de fato, como se sócios fossem os parceiros, mas nunca uma entidade familiar, estando os juízes a proferirem decisões em diversos sentidos, sem que haja um posicionamento definido na legislação civil. Entretanto, não se pode negar que o tema é por demais polêmico no meio social, não obstante as evoluções anti-discriminatórias", reforça. Quanto a questões polêmicas, como adoção por pessoas do mesmo sexo e que estejam residindo sob o mesmo teto, tanto Rodrigo Pereira, quanto o juiz Newton Carvalho, entendem que esse tema envolve discussões que passam por determinados conceitos há muito estabelecidos, aceitos e mantidos pela sociedade. "Do ponto de vista teórico-jurídico é simples, ou seja, basta responder à indagação prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, que é um dos textos normativos mais avançados do mundo: qual o melhor interesse da criança? Do ponto de vista prático é que não é simples, porque aí há uma subjetividade que é variável, de acordo com a concepção moral de cada julgador. Entretanto, se atentarmos para uma ética, acima da moral, será possível, em cada caso, estar mais próximo do ideal de Justiça", diz Rodrigo Pereira. Já o juiz Newton Carvalho pondera que o magistrado pode decidir sem respaldo na lei, principalmente quando a própria legislação fere princípios fundamentais, como o da liberdade e o da igualdade. "Assim, o juiz poderia considerar inconstitucional o dispositivo da própria Constituição (artigo 226 e respectivos parágrafos) que entende como requisito para constituir família apenas a união entre pessoas de sexo diferente e, por conseqüência, deferir a adoção", sustenta. Contudo, o magistrado Newton Carvalho pondera que algumas dificuldades relacionadas à ascendência materna e paterna no registro de nascimento do menor constituem um importante obstáculo. "Afinal, quem seria a mãe e quem seria o pai da criança, para fins de registro? Como contornar tal problema? Evidentemente que, havendo cirurgia para modificação de sexo, não há que se falar em impedimento legal, desde que a pessoa consiga, antes, alteração de sexo e do nome no assento de nascimento. Neste caso, não se fala mais em mesmo sexo". A mudança de sexo, conforme esclarece, só é autorizada após um rigoroso acompanhamento médico. Existe uma resolução, nº 1.482/97, do Conselho Federal de Medicina, permitindo tal cirurgia, entre os transexuais. O juiz explica que a questão se complica quando se trata de mudar o nome e o sexo no assento de nascimento. A opinião majoritária, segundo ele, é a de que não é possível, ou seja, não adianta a medicina fazer a parte dela, já que, inexistindo Lei ou entendimento que reconheça tal mudança, a pessoa continuará com o mesmo sexo e o mesmo nome. Nesse cenário, o juiz entende que a Justiça não pode desconhecer questões como essa, ou seja, "é fechar os olhos ao que acontece no mundo atual, não querer discutir a união estável entre pessoas do mesmo sexo, e suas conseqüências, é distanciar-se do real. O próprio Direito é, contraditoriamente, fator de marginalização, de exclusão", conclui. (Notícias do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, 6/8/2003: Especialistas debatem mudanças no Direito de Família).
Direitos
IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
Article Number
4901
Idioma
pt_BR