Notícia n. 4695 - Boletim Eletrônico IRIB / Junho de 2003 / Nº 701 - 12/06/2003
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
701
Date
2003Período
Junho
Description
IRIB é recebido pelo Incra para debates sobre projetos internacionais - BID questiona sobre o marco legal para os registros imobiliários - O Presidente do Irib, Sérgio Jacomino, participou ativamente das discussões agendadas para o dia nove de abril de 2003, realizada na sede do Incra (DF) para apresentar aos técnicos do Ministério do Desenvolvimento Agrário, do próprio Incra, e do Banco Interamericano de desenvolvimento (BID) uma visão panorâmica dos registros imobiliários brasileiros. O objetivo da reunião cingiu-se à necessidade de um diagnóstico preciso da atual situação dos registros prediais do país, tendo em vista os financiamentos que o BID tem alocado para a instituição de cadastros imobiliários e regularização fundiária. Há tempos os técnicos do BID têm instado o Grupo de Trabalho encarregado do desenvolvimento do projeto BR-0392 (vide texto integral traduzido abaixo) para apresentar um estudo aprofundado acerca da situação dos cartórios de registro de imóveis brasileiros. O diagnóstico deveria enfocar a existência e consistência de infra-estrutura legal e regulamentar sobre registros públicos no país, o que permitiria avançar na execução do ambicioso projeto de cadastro e regularização da propriedade agrária. Diagnóstico dos registros prediais brasileiros Atendendo aos sucessivos pedidos dos técnicos do Banco Interamericano de Desenvolvimento, o Grupo de Trabalho, nomeado pela Portaria Conjunta MDA/INCRA N° 03, de 16 de Maio de 2002, elaborou o trabalho que se pode ver logo abaixo - Diagnóstico - a situação dos cartórios no Brasil. De lavra de Élcia Ferreira da Silva (ANOTER), o documento foi considerado um testemunho fidedigno da situação dos cartórios de registro de imóveis no país, embora, pelas circunstâncias em que elaborado, não tocasse em temas essenciais dessa instituição. Assim se compreende a insistência do BID, que estava relacionada diretamente à possibilidade de análise da realidade cartorária a partir de dados estatísticos, elementos que se não acham disponíveis em órgãos do Governo Federal. Por outro lado, é notória a dispersão de informações entre os vários tribunais estaduais, tendo em vista a organização difusa dos serviços notariais e registrais, o que não tem permitido, até o presente momento, conhecer, em profundidade, essa multissecular instituição brasileira. A edição da Lei 10.267/2001 tem suscitado inúmeras controvérsias, principalmente no que diz respeito ao deficiente tratamento sistemático dispensado à Lei 6.015/73 (Lei de Registros Públicos), que prevê, em sistema aparentemente fechado, hipóteses estritas de retificação de registro pela via judicial, o que está sendo considerado um obstáculo insuperável não só para a aplicação da Lei 10.267/2001, mas para a concretização do próprio projeto BR-0392. Não tendo conseguido obter informações em profundidade, ordenando as várias facetas do registro predial brasileiro, a permitir um diagnóstico seguro, o BID insistiu na audiência do Irib, que é um Instituto internacionalmente reconhecido e interlocutor obrigatório quando o tema versar sobre registro de imóveis no Brasil. Audiência na Câmara Federal No dia anterior, 8/4, o Presidente do Irib participou de importante evento em Brasília, mais precisamente na Câmara Federal, onde, a convite dos Srs. Deputados, respondeu a várias dúvidas e expôs à seleta e atenta platéia os problemas que atualmente afetam os registradores, especialmente na interpretação e cumprimento da novel Lei 10.267/2001, que tantos avanços promete para a questão agrária (vide reportagem completa no próximo BE). Os debates que estavam agendados para o dia seguinte, no Incra, iniciaram-se, de fato, no dia anterior, já que parte dos interlocutores da reunião com o BID compareceram ao dito evento congressual e puderam tomar um primeiro contato com os problemas que seriam expostos no dia seguinte. A renovação verificada no âmbito do Governo Federal, em virtude das eleições passadas, impôs a necessidade de reprisar, a novos atores e interlocutores, velhos temas e problemas que ficaram pendentes de solução na gestão anterior. O Irib cuidou de elencar os mais importantes, expressando sua preocupação com a inação do Incra, o que poderia colocar em risco o sucesso dos projetos que se encontram em andamento e cujas discussões se achavam perfeitamente encaminhadas. Para acompanhar em profundidade a participação do Irib na audiência pública, confira a reprodução da manifestação do Presidente Sérgio Jacomino na próxima edição do BE. Irib sabatinado pelo BID A reunião contou com as honrosas presenças, dentre outros, dos Srs. Guilherme Cassel, Secretário-Executivo do Ministério de Desenvolvimento Agrário, Eugênio Conolly Peixoto, Secretário de Reforma Agrária e o Sr. Petrus Emile Abi-Abib, Diretor Executivo do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), Élcia Ferreira da Silva e demais membros do Grupo de Trabalho responsável pela preparação do Programa. Pelo BID, a missão era composta por Luis Macagno (COF/CBR) e Héctor Malarín (RE1/EN1), quem presidiu os trabalhos, sendo acompanhados pelos consultores Hugo Cohan e Francisco Echegaray. O Presidente Jacomino apresentou a todos uma breve notícia histórica acerca do nascimento dos registros imobiliários no Brasil, traçando um paralelo entre os tratamentos dispensados a imóveis públicos e privados, vincando cada um dos importantes eixos sobre os quais repousam as regras sobre titularidades de imóveis no Brasil. Especificamente sobre o sistema registral pátrio, Jacomino acentuou que a história do registro no Brasil aponta uma nítida linha ascensional de aperfeiçoamento e busca incessante de rigor técnico na organização dos serviços, consagrando um eficiente sistema de segurança jurídica preventiva. Mesmo os problemas que vêm sendo apontados por seus críticos, devem ser reputados a retrocessos técnicos e a desvios sistemáticos, decorrentes de simples desconhecimento das virtudes e do sofisticado mecanismo dos registros, de injunções políticas, e até manipulação dos registros por interesses escusos. A exposição do Presidente tocou os vários problemas que abaixo são indicados. Fraudes em cartórios – a falta de um marco legal As denúncias de fraudes perpetradas por cartórios, acentuadamente em regiões mais remotas do país, demonstram que o sistema, em sua inteira pureza e rigor técnicos, não logrou alcançar o alto grau de desenvolvimento que ostenta em regiões localizadas nos grandes centros urbanos, onde os serviços são efetivamente delegados a agentes particulares em colaboração com a administração pública. Nesses rincões afastados é bastante comum a falta de profissionais qualificados, exigüidade de infra-estrutura material, humana e tecnológica, dispersão geográfica dos serviços registrais, atomização e falta de integração em redes informáticas, falta de interesse profissional para se submeter a concursos públicos e ocupar posições de registradores e notários e, finalmente, falta de atrativos econômicos para desempenhar a atividade. A combinação aziaga desses fatores tem acarretado que os serviços sejam prestados de maneira inadequada, sendo desempenhados por profissionais não qualificados, indicados pelos Tribunais de Justiça, de cujos quadros ordinários são extraídos. Os registros públicos imobiliários ainda padecem dos efeitos de atomização dos serviços, sofrem com o efeito de entropia de fontes variegadas de regulação e normação, de profusão de regras estadualizadas e em parte contraditórias, prestação de serviços por agentes públicos não especializados em localidades em que o registro é estatizado, alheamento dos principais atores (os próprios registradores) nas discussões institucionais etc. Em virtude de ainda não se ter atingido a plena maturidade institucional – em decorrência da falta de um claro marco legal – tudo isso tem levado o registro imobiliário a sofrer injustas críticas e de se ter instaurado um indisfarçado processo de sucateamento do sistema, com críticas acérrimas e obtusas. O impulso selvagem de derriçagem dos registros imobiliários se instaura sem que ao menos se dêem condições de conhecê-los em profundidade. Derriba-se o modelo consagrado de registro pátrio para se erigir, desde logo, outro, curiosamente também desconhecido, fruto de arremedo de modelos malsucedidos (e pior ainda compreendidos). Pode-se dizer dessa tendência, o que já se disse alhures: corremos o risco de sairmos da fase de estruturação e desenvolvimento da instituição registral para cair na plena decadência – sem que nos déssemos, ao menos, a oportunidade de experimentar o apogeu e o pleno desenvolvimento da atividade. Nessa quadra se inscrevem as idéias de submissão dos registros às prefeituras municipais ou absorção dos cartórios pelos órgãos cadastrais, estatização em vários grados etc. Serviços atomizados - sistemas fragmentados A atomização e fragmentação do sistema registral é patente. Os cartórios não estão integrados. Não adotam sistemas padronizados para atuação coordenada. Com o advento da informatização, essas instituições não se desenvolvem segundo regras preestabelecidas – nem adotam protocolos de interconexão, condição indispensável para respostas instantâneas a demandas por informação registral. Em face dos complexos processos econômicos, acentuadamente globalizados, responde o Registro brasileiro de maneira disfuncional. Não há procedimentos estandardizados. O output do sistema é desconcentrado e dispersivo e os seus protocolos não podem ser reduzidos a padrões lógicos de conversibilidade e portabilidade. Com efeito, a informação registral não circula confortavelmente em redes eletrônicas, aumentando os custos de transação e informação, degradando, na outra ponta, o grau de certeza, rapidez e confiança dos operadores. Não raro, nesses casos, o sistema econômico acaba por edificar outros mecanismos de informação jurídica e patrimonial, afastando o Estado de uma atividade que, por sua própria natureza, e por envolver a tutela de direitos e interesses privados, deve merecer os cuidados da sociedade organizada. Pluralismo procedimental e o Conselho de Notários e Registradores O advento da informática teve o condão de pôr-nos à mostra as deficiências e anacronismo da Lei 6.015/73: excessiva como norma, exígua como regulamento, a Lei de Registros Públicos necessita urgentemente ser reformada. Divisam-se enormes lacunas. A lei que nos deu impulso para superação de velhos paradigmas do registro fundiário está a merecer nossos melhores cuidados. A lei envelheceu. Tal descompasso tem alimentado o furor normativo-administrativo estadual, dando ensanchas a improvisações e a interpretações assistemáticas em cada localidade (comarca) em que se acha um registro. De outro lado, em face da enorme avalanche legislativa, que nos últimos anos brindou-nos microssistemas que afetam diretamente o registro imobiliário – como a Lei de Incorporações e Condomínios, Lei de Parcelamento do Solo Urbano, Estatuto da Terra e Estatuto da Cidade, Leis do SFH e SFI e muito especialmente a recente Lei 10.267/2001 –, em face de todos esses diplomas legais, estamos desarmados de um regulamento harmônico que pudesse assentar, em sólidas bases sistemáticas, as regras de funcionamento dos registros imobiliários, tornando-os perfeitamente aptos e aparelhados para dar uma resposta consistente a todas essas demandas. Para fazer frente aos novos desafios, e como projeções homólogas do modelo que acabou por ser transplantado pelo novo espartilho constitucional e pela Lei 8.935/94, temos uma profusão normativa estadual, que se expressa por meio de decisões promanadas pelo juízo competente. Tais decisões administrativas, singulares ou coletivas, que ostentam um caráter normativo, visam a cumprir o preceito consagrado no art. 30, XIV, da Lei 8.935/94, que sujeitou os notários e registradores ao cumprimento das normas técnicas baixadas pelo juízo competente. Ora, ainda que se possa reconhecer a extraordinária importância histórica da adscrição judiciária das atividades notariais e registrais – e que se possa louvar a instauração do marco fiscalizatório, com a atribuição cometida constitucionalmente ao Poder Judiciário (art. 236 da CF/88), o que nos torna a primeira instituição jurídica pátria com efetivo controle externo – não deixa de ser impressivo que a regra esculpida na Lei 8.935/94, em seu artigo 30, inciso XIV, acha-se na contramão dos esforços modernizadores do sistema e nos impõe um sério desvio do rumo sistemático que a legislação registral sempre apontava. Vamos tentar compreender em linhas muito gerais o porquê. Migrando da galáxia judiciária, as atividades notariais e registrais, tradicionalmente reputadas como órgãos auxiliares da Justiça, com limites e delimitação rígidos, com atribuições claramente definidas na Organização Judiciária de cada Estado da Federação, hoje se encontram sem um centro de gravidade. Historicamente figurando ao lado dos secretários, escreventes, amanuenses, contínuos, escrivães, meirinhos, distribuidores, partidores, contadores, depositários públicos etc., hoje os notários e registradores estão se afastando do núcleo duro do Judiciário, sem ter podido encontrar, ainda, uma referência que pudesse sinalizar autoridade e que pudesse, portanto, instaurar o estalão para referência de procedimentos em escala federal. Ficamos desfalcados de um bom sistema de organização colegiada, em virtude, simplesmente, de preconceitos e temores injustificados. A regra do citado artigo 30, XIV, da Lei 8.935/94 rendeu-se a um natural tropismo, estimulado historicamente pelo contubérnio das atividades notariais, registrais e judiciárias, e deve ser reformada. Uma coisa é a fiscalização outra, muito diferente, é a disciplina regulamentar e normativa. Uma coisa não deve necessariamente implicar a outra, ainda que possamos relevar e considerar a conaturalidade das atividades registrais, notariais e judiciais, especificamente no tocante à tutela pública de interesses privados e atentos à larga tradição do direito brasileiro. De qualquer maneira, as políticas públicas, que demandam um craveiro unívoco – como é o caso das políticas de regularização fundiária – para que possam ser desenvolvidas harmonicamente em todo o território, devem concretizar a regra da própria CF/88 (art. 22, I, XXV), que dispõe que compete privativamente à União legislar sobre registros públicos e direito civil (inc. I), salvo eventual lei complementar que poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas no referido artigo (parágrafo único do referido art. 22). Bastaria lembrar a experiência bem-sucedida que se deu entre nós com a regulamentação, via Ministério da Justiça, da microfilmagem no país e, especialmente, da autorização, via portaria ministerial,para instalação de equipamentos e para a realização de serviços micrográficos nos cartórios brasileiros.Tal antecedente, pelos excelentes resultados, dá-nos uma referência importante que deveria ser estudada detidamente. Aqui precisamente houve uma regra uniforme e harmônica, com regulamentação plenária, vinculada naturalmentea órgão da União Federal. Vale estudar a Lei Lei 5433/68 e o Decreto Federal 1.799/96 como indicação de caminhos bem-sucedidos que podem ser experimentados quando o tema versar, por exemplo, sobre documentos eletrônicos, firmas digitais, certificação, normas procedimentais para regularização fundiária etc. etc. Já anteriormente a esses aspectos nos referimos em http://www.irib.org.br/biblio/jacomino.asp. Experimentamos um momento propício para discutirmos a necessidade imperiosa de um regulamento de registro imobiliário e de um regulamento específico da Lei 8.935/94, dando maior coerência sistemática aos serviços, agilidade aos processos de registro, estabelecimento de padrões procedimentais, regulação de informatização etc.
Direitos
IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
Article Number
4695
Idioma
pt_BR