Notícia n. 4358 - Boletim Eletrônico IRIB / Fevereiro de 2003 / Nº 623 - 10/02/2003
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
623
Date
2003Período
Fevereiro
Description
Anulação de contrato de c/v. Vício de consentimento. Prazo prescricional. Contagem: início na data do registro e não na da lavratura da escritura. - Sérgio Jacomino, seleção e verbetação Civil e processual civil. Recurso especial. Ação de conhecimento. Anulação de contrato de compra e venda de bem imóvel. Vício do consentimento. Prazo prescricional. Termo a quo. Em se tratando de ação pela qual se busca a anulação de contrato de compra e venda de bem imóvel por vício do consentimento, o prazo prescricional inicia-se da data do registro da respectiva escritura no cartório competente, e não de sua lavratura. Precedentes. O prequestionamento dos dispositivos legais tidos por violados constitui requisito especifico de admissibilidade do recurso especial. É vedado o reexame do acervo fático-probatório dos autos em sede de recurso especial. Decisão. Cuida-se de recurso especial, interposto por L.C.K.C. e outros, contra acórdão exarado pelo eg. Tribunal de Justiça do Paraná. E.H.S., D.H.F. e seu marido A.C.F., J.H., R.H., J.W.H., J.H. e L.H.P. propuseram ação de conhecimento sob o rito ordinário em face dos recorrentes, visando à declaração de nulidade de procuração em causa própria pela qual se estipulou a compra e venda de bem imóvel. Sustentaram que são parentes e herdeiros de E.I.H., proprietária de uma casa adquirida através da partilha dos bens de seu marido, o finado W.H.. Em 06/11/1989, a Sra. E.I.H. veio a falecer, deixando para seus herdeiros alguns bens móveis e o aludido imóvel. Aberto o inventário da de cujus, restou esse paralisado em virtude do conhecimento, pelos seus herdeiros, de que o único imóvel que ela possuía e no qual residia havia sido vendido. Afirmaram que em 08/08/1983, a de cujus havia comparecido ao Cartório do Taboão, e outorgado uma procuração em causa própria em favor de A.G.C., já falecido, que era casado com L.C.K.C., ora recorrente. A procuração outorgada teve por finalidade alienar o bem mencionado pelo preço de cinco milhões de cruzeiros, montante que, à época do negócio jurídico, não representava nem um décimo do valor real do imóvel, segundo afirmaram os recorridos. Sustentaram que a de cujus teria sido a primeira pessoa a informar-lhes da venda do imóvel, o que não ocorreu. Assim sendo, defenderam a tese de nulidade da assinatura lançada na mencionada procuração e, em caso de constatação de sua autenticidade, de indução da de cujus em erro no momento de sua outorga. A descoberta da fraude foi possível porque em 01/02/1990, sete anos após a outorga da procuração, A.G.C., na condição de advogado, peticionou ao d. Juízo de Registros Públicos a retificação do registro do imóvel para que constasse como seu atual proprietário o herdeiro E.H., com quem provavelmente o patrono estaria mancomunado. Tendo solicitado o d. Juízo que o requerente comprovasse a sua legitimidade para promover a retificação solicitada, foi necessário que se trouxesse à tona a procuração anteriormente outorgada pela de cujus ao Sr. A.G.C. Assim sendo, pugnaram os recorridos pela declaração de nulidade da procuração, caso fosse constatada a falsidade da assinatura da finada E.H. Caso não restasse atendido esse pedido, que fosse declarado nulo o negócio jurídico celebrado pelo fato de ter sido a de cujus induzida em erro essencial, simulação ou fraude, pois o preço lançado na procuração não restou pago. O d. Juízo a quo julgou procedente o pedido formulado pelos recorridos para anular a procuração em causa própria outorgada a A.G.C., bem como anular os efeitos decorrentes dessa, tendo por fundamento o fato de que o contrato entabulado entre as partes deu-se a preço vil. Inconformados, os recorrentes apelaram ao eg. Tribunal a quo. O v. acórdão restou assim ementado: “Ordinária. Anulação de procuração em causa própria. Preliminar de prescrição do direito à ação. Inocorrência. Venda de imóvel a preço vil. Outorgante, senhora idosa, viúva, doente. Cumplicidade do respectivo filho. Ato mantido oculto pelo outorgado. Registro público após a morte da outorgante. Improvimento do recurso.” Interpostos embargos declaratórios pelos recorrentes, restaram rejeitados. Irresignados, interpuseram recurso especial, com fulcro no artigo 105, inc. III, alíneas “a” e “c” da Constituição Federal, sob o argumento de ofensa aos artigos: a) 165, 177 e 178, § 9.º V, “b”, do CC - sustentam estar prescrito o direito de ação dos recorridos, posto que a procuração em causa própria foi outorgada em 08/08/1993 e dessa data deveria ser contado o prazo prescricional de quatro anos previsto na lei civil, e não de 20/03/1991, data em que à procuração foi registrada no cartório de imóveis competente. Quanto a essa questão também alegaram dissídio jurisprudencial b) 535 do CPC - o eg. Tribunal a quo não se manifestou sobre questões colocadas quando da interposição de embargos declaratórios e) 1.089 e 1.317, I, do CC, 364 e 517 do CPC - o eg. Tribunal a quo, ao afirmar que o preço acordado pelo imóvel foi vil e que não houve vestígio de seu pagamento, ignorou o instrumento público de mandato em causa própria, que possui presunção de irrevogabilidade, irretratabilidade e autenticidade, e pelo qual se infere que o preço não foi vil e restou devidamente pago Relatado o processo, decide-se. I - Artigo 178, §9.º, V, “b” A questão posta a desate pelos recorrentes consiste em aferir o termo inicial para contagem do prazo prescricional de ação visando à anulação de contrato maculado de vício de erro, dolo, simulação ou fraude: se do dia em que se realizou o ato ou contrato, nos exatos termos do dispositivo legal tido por violado, ou da data de transcrição do contrato no cartório de registro competente. O tema já foi apreciado por este Tribunal. Resta assente o entendimento no sentido de que, no caso de negócio jurídico que envolve bem imóvel, o termo inicial do prazo prescricional da ação proposta visando à sua anulação por vício do consentimento conta-se da data do registro do título aquisitivo no respectivo assento imobiliário, e não da data de celebração da avença. Nesse sentido: “Direito civil. Ação pauliana. Fraude na alienação de imóvel. Invalidação. Prazo prescricional/decadencial (art., 178, par. 9., 14 b, CC). Termo a quo de fluência. Data do registro do título aquisitivo no álbum imobiliário. Recurso acolhido. - A par da divergência doutrinária acerca da natureza jurídica do prazo quadrienal previsto no artigo 178, parágrafo 9., 14 b, CC, se prescricional ou decadencial, impõe-se considerar como termo inicial de sua fluência, em se tratando de invalidação de bem imóvel postulada com base em alegação de fraude, a data do registro do título aquisitivo respectivo no assento imobiliário.” (Recurso Especial 36.065, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 10/10/1994). “Direito civil. Ação pauliana. Fraude na doação de imóveis. Prazo de decadência. Termo inicial da contagem. Código Civil, artigo 178, 9.º, 14 “b”. Interpretação. I- Em se tratando de ação pauliana em que se postula a invalidação da doação de imóveis com base em alegação de fraude, o termo inicial do prazo de decadência conta-se da data do registro da respectiva escritura e não da lavratura desta. Precedente do STJ. II - Recurso especial não conhecido.” (Recurso Especial 118.051, Rel. Min. 01/08/2000). No caso em tela, a procuração em causa própria pela qual restou celebrado o contrato de compra e venda de imóvel entre E.I.H. e A.G.C, restou registrado no Cartório de Registro de Imóveis em 20/03/1991. A ação intentada pelos herdeiros da alienante foi proposta em 20/09/1994, ou seja, dentro do prazo prescricional de 4 anos a que alude o artigo 178, §9.º, V, “b”, do CC. Assim sendo, não há que se falar em prescrição do direito de ação. II- Artigo 535 do CPC No recurso de embargos de declaração que interpuseram, os requerentes pugnaram por manifestação do eg. Tribunal a quo sobre o artigo 364 do CPC, na medida em que esse teria ignorado a autenticidade e valor probante do documento público avençado entre as partes. A respeito, assim se manifestou o v. acórdão recorrido: “A alegação de que há contradição ou omissão no fundamento do acórdão, por não se pronunciar quanto ao disposto no artigo 364, do Código de Processo Civil, e por acolher o entendimento de falta de prova do pagamento do preço, sob o argumento de que a escritura pública o comprova, e o recibo de fl. 49 o confirma, revela o propósito de rediscutir matéria julgada, através do recurso de embargos de declaração, ao que, todavia, a modalidade recursal não é adequada. Registre-se, contudo, que a sentença anulou a ‘procuração outorgada em causa própria a A.G.C.’, resultando que a escritura pública e outros documentos dela decorrentes também vieram a ser fulminados por efeito do convencimento do julgador e da decisão, em razão do que não podem os documentos servir ao desiderato objetivado pelo recorrente, não sendo aplicável ao caso o disposto no referido artigo da lei.” Também requereram manifestação sobre os artigos 165, 1.089 e 1.317, I, do CC, pois o prazo prescricional para a propositura da ação visando à anulação do negócio jurídico celebrado teria se esgotado antes da morte da alienante e, em virtude desse fato, não poderia ter sido transferido aos seus herdeiros. Nesse particular, se pronunciou o eg. Tribunal a quo: “Se, com efeito, o acórdão não fez menção aos artigos da lei, aos que não está obrigado o pronunciamento jurisdicional, resolveu a questão que lhe foi submetida, ao julgar que não se deu a prescrição, como se pode ver à fl. 382 com os fundamentos de fatos e de direito. Por outro lado, as demais arguições, de vedação de contratação de herança de pessoa viva, da irrevogabilidade do mandato, e de omissão quanto ao disposto no artigo 6.º, do Código de Processo Civil, que veda pleitear em nome próprio direito alheio, não foram objeto da apelação.” Ademais, alegaram que o eg. Tribunal a quo não teria especificado qual vício de conhecimento embasou a declaração de nulidade do contrato celebrado, e que as circunstâncias dos autos apontam que o preço pago pelo imóvel não foi vil. Consta do v. acórdão recorrido: “Do mesmo vício padece o recurso quanto à argüição de que o valor teria sido pago pelo imóvel não é vil, porque a irresignação não se conforta em qualquer das alternativas do artigo 535, do Código de Processo Civil, de obscuridade, de contradição ou de omissão do julgado. Não foi submetida a esta instância a questão de ser o vício de consentimento resultante de erro, dolo ou simulação. Como se pode ver nas razões de apelação, a f. 335, da apelante individual L.C.K.C., a breve referência feita à matéria não questionou quanto à espécie do defeito do ato jurídico, mas à sua prova.” Não houve, portanto, violação ao artigo 535 do CPC. III - Artigos 1.089 e 1.317, I, do CC, 364 e 517 do CPC Compulsando os autos, verifica-se que os artigos 1.089 e 1.317, I, do CC e 517 do CPC não foram apreciados pelo v. acórdão recorrido de modo a evidenciar o prequestionamento, requisito de admissibilidade do recurso especial. O recurso especial esbarra, pois, no óbice imposto pelo enunciado 211 da súmula deste Tribunal. Em relação ao artigo 364 do CC, mister se faz assinalar que o eg. Tribunal a quo, ao confirmar a anulação do negócio jurídico celebrado no caso presente, lastreou-se no conteúdo fático-probatório constante dos autos. Uma suposta modificação do julgado, como pretendem os recorrentes, importaria no reexame desse acervo, procedimento vedado em sede de recurso especial, a teor do entendimento consubstanciado no enunciado 7 da súmula deste Tribunal. Na medida em que o eg. Tribunal a quo não discrepa do entendimento jurisprudencial assente neste Tribunal, o v. acórdão recorrido não merece qualquer reparo. Forte em tais razões, nego seguimento ao presente recurso especial. Brasília 19/04/2002. Ministra Nancy Andrighi (Recurso Especial n. 410.828/PR, DJU 21/06/2002, p.407).
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4358
Idioma
pt_BR