Notícia n. 4154 - Boletim Eletrônico IRIB / Novembro de 2002 / Nº 569 - 20/11/2002
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
569
Date
2002Período
Novembro
Description
Loteamento - obras de infra-estrutura. Contrato-padrão - PRESTAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, C.C. PEDIDO DE FIXAÇÃO DE DIA-MULTA - Ação procedente - Possibilidade - Loteamento - necessidade de implantação de equipamentos urbanos - Exigência legal - Aplicação dos artigos 4º, inciso I, e 5º, parágrafo único, da Lei nº 6.766/79 - Recurso improvido. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - Ocorrência - Prova de que a requerida, sob argumento procrastinatório, provocou incidente desnecessário, e por consequência, resistência ao andamento regular do processo - Recurso improvido. Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL nº 164.428-4/5, da Comarca da Assis, em que é apelante M.R.M. Empreendimentos Imobiliários Ltda., sendo apelado o representante do Ministério Público: ACORDAM, em Nona Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por votação unânime, negar provimento ao presente apelo. Ao relatório da r. sentença de fls. 450/459, acrescenta-se ter sido julgada PROCEDENTE a ação de prestação de obrigação de fazer, c.c. fixação de dia-multa, proposta pelo representante do MINISTÉRIO PÚBLICO contra M.R.M. EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA., condenando-se esta à obrigação de realizar os serviços faltantes de rede de distribuição de água, de coletora de esgoto, de energia elétrica, e de guias e sarjetas, junto ao loteamento denominado "SAN FERNANDO VALLEY", sob pena de pagamento de multa por dia de atraso no valor de R$ 1.000,00 (um mil reais), a partir da citação, ordenando-se, também, que a ré arque com o pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em 15% (quinze por cento) sobre o valor dado à causa, e ainda, condenando-se a requerida ao pagamento de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, pela reconhecida litigância de má-fé. Não se conformado, apela a sucumbente (fls. 463/468), postulando a reforma do r. "decisum" atacado, sob o fundamento de que ficou impedida de cumprir a obrigação por impossibilidade financeira, além de que, "o loteador não é obrigado executar os serviços constantes do artigo 4º, da Lei 6.766/79, senão, tão somente, a, no mínimo, aqueles constantes do artigo 18, inciso V, da lei do parcelamento urbano"(fls. 467). Por fim, argumenta que, inobstante a perícia ter dado veracidade ao contrato de fls. 177/178, tal fato não caracteriza a má-fé da requerida, vez que, na defesa de seus direitos, acabou por demonstrar que a cláusula 13ª, inserta no aludido instrumento, não é originária do contrato padrão. O apelo foi recebido (fls. 471) e regularmente processado, sendo contra-arrazoado às fls. 472/474. É o relatório. Narra o petitório inaugural, em suma, que a suplicada, ao proceder a venda de lotes do loteamento denominado "SAN FERNANDO VALLEY", comprometeu-se a provê-lo dos equipamentos públicos de guia, rede de água, de luz elétrica, e de esgoto, porém, desde 1981 até a presente data, não cumpriu com sua obrigação. Contestando o feito, a requerida alegou, dentre outras coisas, que o contrato encartado às fls. 08/09 verso, foi adulterado. Contudo, com a juntada da via original do referido contrato, às fls. 177/178 verso, o MM. Juiz "a quo" houve por bem dispensar a perícia documentoscópica (fls. 187), motivo pelo qual a ré interpôs o Agravo Retido de fls. 188/189. Através da r. sentença de fls. 369/372, a presente ação foi julgada improcedente. Porém, em virtude de ter sido dado provimento ao Agravo Retido de fls. 188/189, sobreveio o decreto de nulidade do processo, a partir de fls. 187, mediante os termos contidos no V. Acórdão de fls. 395/397. Em seguida, elaborou-se o laudo de fls. 407/417, bem como o laudo de vistoria de fls. 430/442, e, posteriormente, lançou-se o r. "decisum" atacado de fls. 450/459. Inobstante os argumentos expendidos pela Insurgente, razão não lhe assiste, principalmente por ela mesma admitir que "É fato incontroverso, que como empresa responsável pelo parcelamento de solo, tinha a obrigação de executar os serviços de infra-estrutura" (fls. 464). Porém, afirma "que não tem qualquer obrigação na execução dos serviços de esgoto" (fls. 465), porquanto, além de inexistir previsão contratual acerca do mencionado encargo, restou pactuado junto à Municipalidade de Assis, quando da aprovação do empreendimento, que a coleta e os resíduos de esgoto seriam recolhidos em fossas sépticas a serem construídas pelos moradores dos lotes, e ainda, que a cláusula 13ª, inserida no instrumento de fls. 177/178, não serve de base para caracterizar a responsabilidade da apelante na execução dos serviços e esgoto (fls. 465). Ao que tudo indica, a Recursante não atentou para a fundamentação da r. sentença combatida, que sequer considerou as cláusulas contratuais, para impor à loteadora a obrigação de implantar os equipamentos enumerados na exordial. Ao revés das assertivas da requerida, o que se examinou para o deslinde da causa, não foi o contrato, mas sim, a lei que rege a matéria, qual seja, a que dispõe sobre o parcelamento do solo. Assim, inobstante as previsões contidas nos contratos de fls. 22/23, 37/38 e 177/178, referidos pela Apelante, às fls. 465, a controvérsia, de fato, deve ser analisada à luz das regras estabelecidas na Lei nº 6.766/79. É certo, como ressaltado pela suplicada, à fls. 466, que o artigo 18, inciso V, da aludida norma legal, obriga o loteador, quando do registro imobiliário, apresentar o projeto de loteamento, acompanhado da cópia do ato de aprovação do loteamento e comprovante do termo de verificação pela Prefeitura da execução das obras exigidas por legislação municipal, que incluirão, no mínimo, a execução das vias de circulação do loteamento, demarcação dos lotes, quadras e logradouros e das obras de escoamento das águas pluviais ou da aprovação de um cronograma, com a duração máxima de 2 (dois) anos, acompanhado de competente instrumento de garantia para a execução das obras. Ocorre que, tal exigência legal, é para o registro do imobiliário do loteamento. Contudo, o cumprimento dessa ordem legal, não tem o condão de suprir a obrigação do preenchimento dos requisitos estabelecidos para a implementação do loteamento, que encontram-se enumerados no artigo 4º, da mencionada lei, que determina, em seu inciso I, que os loteamentos deverão atender "as áreas destinadas a sistemas de circulação, a implantação de equipamento urbano e comunitário, bem como a espaços livres de uso público, serão proporcionais à densidade de ocupação prevista para a gleba, ressalvado o disposto no § 1º deste artigo". Por outro turno, o parágrafo único do artigo 5º, da legislação que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano, preceitua: "Consideram-se urbanos os equipamentos públicos de abastecimento de água, serviços de esgotos, energia elétrica, coletas de águas pluviais, rede telefônica e gás canalizado". Desume-se, portanto, que mencionadas regras, de ordem pública, devem ser observadas pelo loteador, que tem por obrigação implantar no loteamento os equipamentos urbanos definidos em lei. Nesse sentido, impõe-se reproduzir o entendimento doutrinário de ARNALDO RIZZARDO, ofertado pela Douta Julgadora, às fls. 455/456: "Nos contratos já deve integrar no preço o custo dos equipamentos como água, luz, vias internas, pavimentação, etc., cuja implantação é da responsabilidade do loteador. Efetivamente, o artigo 4º, inciso I, da Lei 6.766, impõe como um dos requisitos básicos do loteamento a implantação de equipamentos urbanos e comunitários, ensejando concluir que fazem parte do empreendimento. Assim, o preço de venda dos lotes terá em conta também o custo de tais encargos, máxime aqueles relativos ao calçamento das vias. Não é possível, dentro do espírito da Lei vigente, destacar o preço do terreno daquele das despesas de implantação dos melhoramentos e da infra-estrutura". E continua, citando Jurisprudência: "O loteador não pode transferir ao adquirente a sua responsabilidade legal de implantar as obras de equipamentos urbanos exigíveis pela lei federal e pelas legislações municipais. Pode repassar o custo dessas obras aos adquirentes, desde que embutidas no preço do lote não como obrigação contratual complementar". Conclui o mesmo autor que: "Não interessa a inserção, no contrato, de cláusula impondo a obrigação, pois, prossegue-se na decisão, em sede de parcelamento do solo urbano, assume especial relevância o princípio da supremacia da ordem pública e isto porque a Lei 6.766/79 é de ordem pública, o que retira do particular parcela considerável da autonomia da vontade porque as partes não são tão livres para contratar, devendo ser observadas as restrições legais sobre as quais as partes não podem dispor. E as normas da Lei 6.766/79 são de ordem pública e, portanto, cogentes, e sobre elas não podem prevalecer ajustes contratuais que com ela conflitem" (PROMESSA DE COMPRA E VENDA E PARCELAMENTO DO SOLO URBANO, São Paulo, RT, 1996, 4ª ed., p. 113)". Logo, se a Apelante ficou impedida de cumprir sua obrigação, "por impossibilidade financeira" (fls. 466), os adquirentes de lotes não podem ser prejudicados por esse fato, já que o seu encargo decorre de previsão legal. Não bastasse, é de suma importância destacar-se, que a circunstância de haver justificado o motivo pelo qual não deu cumprimento à sua obrigação, mostra, à evidência, que a Insurgente confessa ter assumido o encargo de implantar os equipamentos urbanos. Especificamente sobre o serviço de esgoto, frise-se, que ainda que se admitisse que a cláusula 13ª, do contrato de fls. 08/09 verso tivesse sido forjada, para o fim de incluir citado serviço, da mesma forma caberia à ré implantá-lo em virtude da lei. Todavia, na espécie, o laudo de fls. 408/417, foi suficiente para demonstrar a veracidade da inserção da mencionada cláusula, e do próprio contrato. Diante desses fatos, é de rigor impor à Recorrente a obrigação de executar os serviços descriminados pelo laudo de vistoria de fls. 430/442, que não mereceu ser impugnado pela ré (fls. 447), e que foram resumidamente discutidos pela Douta Magistrada, à fls. 458: Tocantemente à reconhecida litigância de má-fé da demandada, nada há que ser alterado, pois como bem observado pela MMª Juíza "a quo", "O laudo pericial serviu para demonstrar a má-fé com que agiu a ré, bem como o fato de que o custo dos serviços já foram embutidos no preço do imóvel, uma vez que tais serviços foram expressamente previstos nos contratos" (fls. 456/457). De fato, o Perito Judicial, em resposta aos quesitos formulados pelas partes, assegurou que a cláusula 13ª, inserida no contrato impugnado de fls. 177/178, existe nos instrumentos de fls. 22/23 e 37/38, e que aquela foi datilografada com a mesma máquina utilizada para o preenchimento das demais cláusulas do referido contrato (fls. 409/410). Logo, revela-se que a assertiva de que o documento de fls. 08/09 (177/178, via original), foi adulterado, porque "não confere com o modelo do contrato padrão adotado pela empresa loteadora" (fls. 144 - item 2.1), só serviu para procrastinar o regular andamento do feito, já que provocou incidente desnecessário, na medida em que, sabedora de suas obrigações, motivou resistência injustificada à tramitação da lide. Em face do exposto, nega-se provimento ao apelo. Participaram do julgamento, os Desembargadores MARCO CÉSAR (Revisor) e ALDO MAGALHÃES. São Paulo, 10 de outubro de 2000. Des. SILVA RICO Presidente e Relator
Direitos
IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
Article Number
4154
Idioma
pt_BR