Notícia n. 3536 - Boletim Eletrônico IRIB / Abril de 2002 / Nº 465 - 02/04/2002
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
465
Date
2002Período
Abril
Description
Promessa de c/v. Rescisão pelo promissário comprador. Perda das parcelas pagas. Cláusula abusiva. - Sérgio Jacomino, seleção e verbetação Direito civil. Promessa de compra e venda. Extinção. Iniciativa do promissário comprador. Perda das parcelas pagas. Cláusula abusiva. Código de defesa do consumidor. Norma de ordem pública. Arts. 51-IV e 53. Derrogação da liberdade contratual. Redução. Possibilidade. Recurso acolhido. I- A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça uniformizou-se pela redução da parcela a ser retida pelo promitente vendedor, nos casos de desfazimento do contrato de promessa de compra e venda, por inadimplência do comprador. II- O caráter de norma pública atribuído ao Código de Defesa do Consumidor derroga a liberdade contratual para ajustá-la aos parâmetros da lei, impondo-se a redução da quantia a ser retida pela promitente vendedora a patamar razoável, ainda que a cláusula tenha sido celebrada de modo irretratável e irrevogável. 1. Os recorrentes, na qualidade de promissários compradores, ajuizaram "ação de rescisão contratual com restituição de quantias pagas". Alegaram que, por questões financeiras, ficaram impossibilitados de continuar a pagar as demais parcelas ajustadas no contrato. Em sentença, foi o pedido dos autores julgado procedente, declarando "rescindido" o contrato, condenando a ré a devolver à ré 90%(noventa por cento) de todas as parcelas pagas, inclusive o sinal, devidamente atualizadas. Apelou a ré, tendo o Tribunal, por maioria, dado provimento ao recurso, julgando improcedente o pedido. Entendeu a Turma Julgadora que, estando os compradores inadimplentes e havendo cláusula estabelecendo a irrevogabilidade e irretratabilidade do contrato, não poderiam os autores postularem a resolução do contrato. Aduziu o Colegiado que a ré "é quem teria o direito de opção entre executar a parcela descumprida ou pugnar pela rescisão". Rejeitados os embargos infringentes, adveio recurso especial dos autores, com fulcro nas alíneas "a" e "c" do permissor constitucional, alegando além de dissídio jurisprudencial, ofensa ao artigo 53 da Lei n. 8.078/90. Sem as contra-razões, foi o recurso inadmitido, subindo os autos a esta Corte em razão do provimento de agravo. 2. Entendeu a Turma Julgadora, como se viu, que havendo cláusula contratual de irrevogabilidade e irretratabilidade, o contrato não poderia ser resolvido. No ponto, de um lado, é cediço que a extinção do contrato pelo promissário comprador, unilateralmente, faz incidir em regra a cláusula penal pactuada. De outro lado, todavia, as cláusulas "que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada" (art. 51-IV, CDC) reputam-se "nulas de pleno direito", vale dizer, restringem a liberdade contratual aos limites da paridade entre as partes contratantes, o que, em se tratando de relação de consumo, levam em consideração a hipossuficiência do consumidor. Em outras palavras, a Lei 8.078/90 insere-se entre as normas de ordem pública, como reiteradamente tem afirmado esta Corte ao anular a cláusula eletiva nos contratos de adesão, como exemplifica o CC 20.826-RS (DJ 24/5/1999), da Segunda Seção, com esta ementa: "Conflito de competência. Cláusula eletiva de foro lançada em contrato de adesão. Nulidade com base na dificuldade de acesso ao judiciário com prejuízo à ampla defesa do réu. Caráter de ordem pública da norma que institui o código de defesa do consumidor. Inaplicabilidade do enunciado n° 33 da Súmula/STJ. - Tratando-se de contrato de adesão, a declaração de nulidade da cláusula eletiva, ao fundamento de que estaria ela a dificultar o acesso do réu ao Judiciário, com prejuízo para a sua ampla defesa, torna absoluta a competência do foro do domicilio do réu, afastando a incidência do enunciado n° 33 da súmula/STJ em tais casos". Com base nessa premissa, de que a norma de ordem pública derroga a livre vontade para ajustá-la aos parâmetros da lei, é que se reduz a patamar razoável a quantia a ser retida pela promitente vendedora nos casos de extinção do contrato de promessa de compra e venda, ainda que por iniciativa e culpa do promissário comprador. 3. No mais, à jurisprudência desta Corte se uniformizou pela redução da parcela a ser retida pela promitente vendedora, nesses casos. É o que se extrai, por exemplo, do REsp 114.071-DF (DJ 21/6/99), com esta ementa: "Civil. Promessa de compra e venda de imóvel em construção. Inadimplemento. Perda parcial das quantias pagas. Mesmo se o contrato de promessa de compra e venda de imóvel em construção estabelecer, para a hipótese de inadimplemento do promitente-comprador, a perda total das quantias pagas, e ainda que tenha sido celebrado antes da vigência do Código de Defesa do Consumidor, pode o juiz, autorizado pelo disposto no art. 924, CC, reduzi-la a patamar justo, com o fito de evitar enriquecimento sem causa que de sua imposição integral adviria à promitente-vendedora. Devolução que, pelas peculiaridades da espécie, fica estipulada em 90% (noventa por cento) do que foi pago pelo comprador. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, provido". Também no REsp 239.576-SP (DJ 15/5/2000), esta Quarta Turma assentou o percentual de 10% (dez por cento) como razoável nas hipóteses de desfazimento por inadimplência do comprador, como se extrai do voto condutor do acórdão: "De acordo com os precedentes desta Turma, por força do disposto no CDC (art. 53) e no C.Civil (art. 924), tem sido deferido ao vendedor, em caso de inadimplemento do comprador, o direito de extinguir o contrato e reter parte do pagamento recebido na execução, a título de indenização pela frustração da avença. Assim, a multa prevista para o caso deve ficar circunscrita, de acordo com as circunstâncias do negócio, a um percentual dos valores pagos, comumente estabelecido em 10%. Tudo o mais que ficar estipulado deve ser considerado excessivo, especialmente a regra que condiciona a devolução, se houver, à nova venda do imóvel, a ser efetuada em 12 parcelas mensais, como constou do contrato, item 9-7. E é abusiva porque se trata simplesmente de restituir o que já foi recebido, restituição essa que tem como contrapartida a retomada do imóvel pela vendedora, e que não depende de novos negócios a serem eventualmente realizados. No caso dos autos, a Eg. Câmara [...] condenou os réus à perda de 10% do que foi efetivamente pago, a título de multa, o que se harmoniza com os nossos precedentes. O que exceder desse valor, até o total atualizado das prestações pagas, deve ser desde logo ordenado que seja restituído aos compradores. E isso independe de nova ação, pois a ação de resolução intentada pela vendedora com base no art. 1.092 do C.Civil, é o momento próprio para a restituição das partes à situação anterior, das duas partes, e não apenas da vendedora". Na espécie, a sentença considerou inexistente a prova de prejuízos por parte da empresa vendedora, o que autorizaria a devolução das parcelas, e chegou a mencionar a culpa dos compradores pelo desfazimento do contrato. Todavia, ao decotar 10% (dez por cento) sobre o montante pago, aplicou a norma do art. 53, CDC, em conformidade com a jurisprudência deste Superior Tribunal. Destarte, independentemente de o pedido de "rescisão" ter sido formulado pelos compradores e de não haver culpa da promitente vendedora, certo é que o abatimento de 10% (dez por cento) visa exatamente a reparar a empresa pelo rompimento prematuro da avença, ao qual deu causa os promissários compradores. Neste mesmo sentido, dentre outros, os REsps 198.480-MG (DJ 12/3/01 ) e 287.248-MG (DJ 5/3/01), da Terceira e Quarta Turmas, respectivamente, assim ementados: - "Comercial. Promessa de compra e venda de imóvel. Perda do valor das prestações (Cláusula abusiva). Inteligência dos arts. 924 do Código Civil e 53 do Código do Consumidor. I- A jurisprudência acolhendo lição doutrinária, na exegese do art. 924 do Código Civil e, mais recentemente, do art. 53 da Lei nº 8078/90, possibilita à compromissária vendedora reter parte do valor das prestações pagas a título de indenização pelo extinção do contrato a que não deu causa, e para cuja realização teve despesas. II- Recurso especial conhecido e provido, em parte". -"Civil. Promessa de compra e venda. Contrato firmado posteriormente à vigência do Código de Defesa do Consumidor. Devolução de parcelas pagas. Precedentes da Corte. Juros. Art. 1062 do Código Civil. I- Celebrado o contrato posteriormente à vigência do Código de Defesa do Consumidor, inválida é a cláusula que prevê a perda das prestações pagas de um contrato de promessa de compra e venda. II- Cabível, no entanto, a retenção de 10% (dez por cento) do valor pago, a título de pena pelo inadimplemento contratual, na esteira de precedentes do STJ. III- Não tendo sido convencionado entre as partes, deverão ser aplicados juros sobre o valor corrigido de cada desembolso, de acordo com o art. 1062 do Código Civil, limitados em 6% ao ano, a partir da citação. IV- Recurso especial parcialmente conhecido e parcialmente provido" 5.À vista do exposto, com arrimo no art. 557, CPC, conheço do recurso e dou-lhe provimento para restabelecer a sentença. Brasília 26/6/2001. Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. (Recurso Especial nº 326.156/MG DJU 9/8/2001 pg. 532/533)
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