Notícia n. 3480 - Boletim Eletrônico IRIB / Março de 2002 / Nº 452 - 08/03/2002
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
452
Date
2002Período
Março
Description
Testamento. Exclusão. Filhos ilegítimos. - Numa decisão tomada por maioria de votos (3 a 2), a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça não conheceu de um recurso especial e, com isso, confirmou o direito de dois filhos de uma relação concubinária à partilha de bens de um testamento, firmado em setembro de 1975, em que o paranaense R.F.M. (testador) deixou um legado em favor dos "filhos legítimos" de seu neto R.M.N, inclusive aos que viessem a nascer. A polêmica questão teve como relator, no STJ, o ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, que liderou a tese vitoriosa. A polêmica judicial teve origem logo após a morte do testador, ocorrida em junho de 1976. Naquela oportunidade, o neto R.M.N. possuía um único filho – C.R.M., nascido em 1972 de uma relação conjugal. Neste mesmo ano, entretanto, R.M.N. estava separado de fato da esposa e mantinha uma relação de concubinato que lhe deu um casal de filhos – L.H.M. (nascido em janeiro de 1977) e A.F.M . (nascida em janeiro de 1978), reconhecido pelo pai em 1984. O testamento previu a transmissão de uma loja e do quarto andar de um prédio (dois apartamentos) localizados à Praça Tiradentes, em Curitiba. O testador também estabeleceu a seu neto R.M.N. o usufruto vitalício dos imóveis. Com esta disposição, a transferência definitiva dos imóveis "aos filhos legítimos" ficou condicionada à morte de R.M.N. – numa situação jurídica não citada no legado, mas chamada de fideicomisso, que corresponde a uma disposição de última vontade pela qual o testador (no caso, R.F.M.) incumbe a uma pessoa (R.M.N.) a transmissão de bens a terceiros (os "filhos legítimos" de R.M.N.). Em fevereiro de 1985 R.M.N faleceu, e sua ex-companheira, representando os filhos nascidos fora do casamento, solicitou judicialmente a partilha dos bens previstos no testamento redigido dez anos antes. O pedido foi questionado em juízo por C.R..M. (o primeiro filho de R.M.N.) sob o argumento de que, mesmo reconhecidos pelo pai, os demais não faziam jus ao legado do bisavô, sob o argumento de que a vontade do testador foi a de beneficiar apenas os filhos que viessem a nascer durante a constância do casamento. A discussão em torno do testamento levou C.R.M. a propor uma ação declaratória a fim de que fosse reconhecida a inexistência de direito dos irmãos (L.H.M e A.F.M) aos bens deixados ou pelo menos a exclusão de A.F.M. da partilha, uma vez que nascida após a morte do bisavô. Para tanto, argumentou que a legislação em vigor à época da abertura do testamento estabelecia a diferença entre filhos havidos durante a união legal (legítimos) e os tidos fora do casamento (ilegítimos). A primeira instância reconheceu o direito exclusivo de C.R.C. ao legado, mas após julgar a apelação o Tribunal de Justiça paranaense reconheceu o direito dos três filhos à partilha. No órgão de segunda instância prevaleceu "o entendimento de que a disposição de última vontade beneficiou indistintamente todos os filhos sangüíneos, inclusive os que viessem a nascer, pouco importando serem frutos de casamento ou concubinato", ou seja, que os "filhos legítimos" do testamento deveriam ser entendidos como filhos verdadeiros e não somente como os oriundos de um casamento. Durante a análise do caso no STJ, o ponto central da discussão envolvia a adequada interpretação à expressão "filhos legítimos" utilizada no testamento. Segundo o ministro Sálvio de Figueiredo, a solução de tal controvérsia ficou restrita à Justiça estadual, uma vez que a análise da vontade do testador dependeria de interpretação de cláusula contratual e da reapreciação das provas dos autos – vedados pelas súmulas 5 e 7 do STJ. "Com efeito, não se trata apenas de escolher entre a acepção técnico-jurídica e a comum de "filhos legítimos", trata-se de esmiuçar o encadeamento dos fatos", observou o relator do recurso especial, que também reconheceu o direito de A.F.M. à partilha dos bens do bisavô. "Quando faleceu o testador, o primeiro réu (L.H.M.) estava concebido e ainda não nascido e a segunda (A.F.M.) sequer havia sido gerada, mas tinha capacidade sucessória, porque filha de pessoa (R.M.N.) determinada no testamento", acrescentou. O ministro Barros Monteiro, que pediu vista da matéria, concordou com a argumentação do ministro Sálvio de Figueiredo. "A interpretação de disposição testamentária, envolvendo o espírito que norteou a sua edição situa-se meramente no plano dos fatos", afirmou. "De outro lado, não se entrevê vulneração alguma das regras insertas nos arts. 1717 e 1718 do Código Civil", concluiu ao citar os dispositivos legais que trata do testamento e da possibilidade de inclusão da prole eventual no documento. O terceiro voto que assegurou a validade da decisão de segunda instância e o acesso indistinto dos filhos ao legado foi dado pelo ministro Ruy Rosado de Aguiar. Além de não conhecer do recurso especial, o ministro afirmou que, apesar do testamento ter sido redigido sob outra legislação, a ordem jurídica não mais admite diferenças em torno da origem dos filhos. "Na atual ordem constitucional, não existe a distinção entre filhos legítimos e ilegítimos. Esta distinção é hoje ilícita, pois não permitida pela Constituição. Daí não ser possível causar prejuízo aos filhos". Os ministros César Asfor Rocha e Aldir Passarinho Jr. entenderam que o testador quis contemplar apenas os filhos legítimos de seu neto e ao tempo da celebração do testamento a legislação fazia tal distinção. "Não vejo como dar outra interpretação ao caso", afirmou o ministro César Asfor Rocha. (Notícias do STJ, 01/03/2002: STJ reconhece direito de filhos de relação concubinária a testamento feito em 1975.)
Direitos
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Article Number
3480
Idioma
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