Notícia n. 3349 - Boletim Eletrônico IRIB / Fevereiro de 2002 / Nº 433 - 05/02/2002
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
433
Date
2002Período
Fevereiro
Description
Domínio. Reivindicatória. Posse injusta. - Sérgio Jacomino, seleção e verbetação Recurso especial. Processual civil e civil. Prequestionamento. Ausência. Divergência jurisprudencial. Comprovação. Acórdão recorrido. Embargos de declaração. Excepcionais efeitos infringentes. Possibilidade. Ação reivindicatória. Domínio. Posse injusta. Reexame de prova. Inadmissibilidade. Não se conhece o recurso especial quanto a questões carentes de prequestionamento. A ausência de confrontação analítica dos julgados e de identidade ou similitude de bases fáticas entre o acórdão recorrido e os apontados como paradigma impede o conhecimento do recurso especial pela letra "c" do permissivo constitucional. A atribuição de efeitos infringentes aos embargos de declaração é possível em hipóteses excepcionais, em que sanada a contradição, omissão ou obscuridade, a alteração do julgado surja como conseqüência necessária. Na ação reivindicatória, verifica-se devida a restituição do bem quando comprovado que o autor não-possuidor é proprietário atual do bem e que o réu não-proprietário detém posse atual injusta. A posse injusta que enseja a propositura da ação reivindicatória (art. 524, do CC) não se confunde com a posse violenta, clandestina ou precária a que se refere o art. 489, do CC. Na via especial, não é possível a incursão ao campo fático-probatório. Decisão. Cuida-se de recurso especial interposto por Elza Maria Nery Pereira, com fundamento no art. 105, III, letras "a" e "c" da Constituição Federal, contra acórdão proferido em ação de conhecimento em que se pretende a anulação da escritura pública de compra e venda de bem imóvel, a restituição deste, e a indenização por perdas e danos. O acórdão recorrido está assim ementado: "Recurso de apelação cível. Restituição de área. Ocupação injusta de imóvel. Descabimento. Área da autora e ré distintas. Escritura de origem diferente da área em litígio. Não comprovação da posse injusta da ré sobre a área. Domínio dos autores não comprovado. Indenização por perdas e danos. Descabimento. Não comprovação pelos apelantes. Falta de pressupostos essenciais para reivindicação. Recurso improvido. Se a escritura apresentada pela ré é de origem diferente da área em litígio, depreende-se que as áreas são distintas. Não tendo ficado comprovados a posse injusta da ré sobre área bem como o domínio dos autores, faltou pressuposto essencial para a reivindicação. A prova das perdas e danos é condição sine qua non para fazer jus à indenização." Opostos pelo ora recorrido Embargos de Declaração, foram estes acolhidos, com efeitos infringentes, em acórdão de seguinte ementa: "Recurso de embargos de declaração opostos nos autos do recurso de apelação cível. Contradição. Artigo 535 do código de processo civil. Efeito modificativo ao acórdão embargado. Procedência. Área da embargada de 1080 m² e a área reivindicada. Mesma origem dominial. Contradição entre as razões da decisão e a ementa. Não comprovação da aquisição da área de 1.80 m² pela embargada. Posse injusta caracterizada. Área de 1080 m² aproximadamente 72% (setenta e dois) maior que o imóvel em litígio. Forma diferente da do imóvel pretendido. Ausência de confrontante. Ação reivindicatória pelos embargantes. Cabimento. Embargos declaratórios providos. Anulação. Acórdão proferido. Provimento parcial do recurso de apelação interposto pelos embargantes. Parcialmente procedente ação reivindicatória. Condenação da embargada a restituir o imóvel em litígio aos embargantes. Indenização por perdas e danos pleiteada pelos embargantes. Improcedência. Pedido de anulação das escrituras públicas da área de 1080 m². Ausência de provas. Improcedência. Recurso de apelação interposto por litisdenunciado. Total provimento. Embargos de declaração providos. A contradição de que trata o artigo 535 do Código de Processo Civil é a que afeta a inteireza lógica do acórdão. É a que representa uma quebra no silogismo entre as premissas e a conclusão a que chegou o órgão julgador. A contradição para efeito de embargos declaratórios deve existir entre duas afirmativas constantes do aresto que se chocam entre si, podendo-se impingir efeitos modificativos ao acórdão nos embargos de declaração. Estando perfeitamente comprovada a individuação do imóvel reivindicado pela embargante e a sua aquisição perfeitamente comprovada nos autos, caracterizada está a posse injusta da embargada, cabendo àquela o direito de propor ação reivindicatória, visando obter o bem de quem injustamente ou ilegitimamente o detenha." A ora recorrente opôs embargos de declaração, os quais foram rejeitados, nos seguintes termos: "Recurso de embargos de declaração oposto nos autos do recurso de apelação cível. Contrariedade da embargante contra acórdão que em recurso anterior do ex adverso, deu caráter infringente aos declaratórios, reconhecendo a existência de contradição no julgado, alterando a decisão embargada. Embargos opostos com a nítida intenção de rediscutir matéria apreciada e julgada, objetivando a desconstituição de acórdão embargado, inocorrência dos requisitos legais. Recurso conhecido e improvido. Não vulnera a lei o acórdão que, em caráter excepcional, espancando contradição no julgado, toma caráter infringente decorrente da alteração da decisão embargada. A embargante não demonstrou a ocorrência dos requisitos legais para a sustentação do recurso, evidenciando, no entanto, sua intenção de rediscutir a matéria apreciada e julgada, com finalidade de modificar a decisão agravada. Os embargos declaratórios, como cediço, não são adequados a questionar a correção e justiça do julgado e obter, em conseqüência, a desconstituição do ato decisório. Recurso conhecido e improvido." Sustenta a recorrente violação aos seguintes dispositivos federais: a) art. 535, I do CPC – não é possível a modificação do julgado por meio de embargos de declaração, e, ainda que considerada a jurisprudência que admite efeitos infringentes em hipóteses excepcionais, tal excepcionalidade não se encontra configurada no caso em exame b) arts. 165, 458 e 467, todos do CPC – no que diz respeito à existência de posse injusta, o acórdão recorrido não deu "o devido valor jurídico das provas produzidas" e violou a coisa julgada, uma vez que não considerou que o recorrente detém posse justa, conforme reconhecido em ação de reintegração de posse proposta anteriormente pelos ora recorridos. c) art. 524, do CC – os recorridos não preencheram os requisitos legais para o acolhimento do pedido de restituição (titularidade do domínio sobre a coisa reivindicada coisa individualizada, identificada posse injusta). Alega, ainda, a existência de divergência jurisprudencial no que diz respeito à atribuição de efeitos infringentes aos embargos de declaração. Em contra-razões, sustentam os recorridos: a) ausência de prequestionamento b) incidência do enunciado da Súmula 83 do STJ c) inexistência de violação aos apontados dispositivos federais, devendo ser mantido o acórdão recorrido pelos seus fundamentos. Relatado o processo, decide-se. I- Art. 535, I, do CPC. Com relação à alegada violação ao art. 535, I do CPC, o acórdão recorrido pronunciou-se nos seguintes termos: "A irresignação dos embargantes merece ser considerada, haja vista destacar-se claramente a contradição ora apontada: "O mesmo ocorre com a prova de domínio, que é totalmente favorável à ré. Está evidente no processo que os títulos de propriedades nasceram da mesma origem" "Ementa. Recurso de apelação cível. Áreas da autora e ré distintas. Escritura de origem diferente da área de litígio" "Constato que o título da autora corresponde à área reivindicada tanto na metragem quanto na localização geográfica, e que não há possibilidade física de o título da ré corresponder à área reivindicada". É clara a contradição, restando, pois, seu desfazimento. Sabe-se que a contradição de que trata o artigo 535 do Código de Processo Civil é a que afeta a inteireza lógica do acórdão. É aquela que apresenta uma quebra no silogismo entre as premissas e a conclusão a que chegou o órgão julgador. A contradição, para efeito de embargos declaratórios, deve existir entre duas afirmações antitéticas do próprio acórdão, isto é, entre duas afirmativas constantes do aresto que se chocam entre si, como se vê no presente caso. Por estar razões, filio-me ao entendimento de que, nestes casos, os embargos de declaração podem impingir efeitos modificativos ao acórdão embargado." A par da contradição concernente ao teor da referida ementa, verifica-se que o voto condutor do acórdão proferido em sede de apelação, depois de reportar-se aos fundamentos da sentença e ao laudo pericial, afirmou que "o título da autora corresponde à área reivindicada e que não há possibilidade física de o título da ré corresponder à área reivindicada". Em seguida, no entanto, concluiu que "não comprovada a posse injusta da ré sobre a área. Assim como não restou comprovado o domínio dos autores" e que "assim como reconheceu o nobre Julgador que ‘os autores não demonstraram que exercem sobre a área a mínima parcela do domínio’". Existem, assim, proposições opostas no acórdão que negou provimento à apelação, de forma a evidenciar a presença de contradição a ser sanada por meio dos embargos de declaração. Conforme entendimento assentado nesta Col. Corte de Justiça, a atribuição de efeitos infringentes aos embargos de declaração é possível em hipóteses excepcionais, em que sanada a contradição, omissão ou obscuridade, a alteração do decisório surja como conseqüência necessária. Assim, não se verifica, no caso, a alegada violação ao dispositivo processual indicado. II- Arts. 165, 458 e 467, todos do CPC. A alegada violação aos arts. 165, 458 e 467, todos do CPC, não foi examinada pelo Tribunal a quo, carecendo, assim, do prequestionamento viabilizador da via especial. Incide, no caso, o óbice do enunciado da Súmula 211 do STJ: "Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo." III- Art. 524, do CC. No que diz respeito ao art. 524, do CC, o acórdão recorrido assim se manifestou: "Possuindo, portanto, os referidos títulos dominiais a mesma origem, estando perfeitamente comprovada a individuação do imóvel reivindicado pela embargante e sua aquisição perfeitamente comprovada nos autos, via de consequência, caracterizada está a posse injusta pela ora embargada. Em suma, cabe à embargante o rei vindicatio, ou seja, o direito que tem o proprietário de reivindicar o bem, promovendo a competente ação, visando obtê-lo de quem injustamente ou ilegitimamente o detém." O entendimento esposado pelo acórdão recorrido está em harmonia com a jurisprudência desta Col. Tribunal, que se firmou no sentido dos seguintes precedentes: Resp 8.173/SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 9/3/1992 Resp 20.118/PR, Rel. Min. Dias Trindade, DJ 1/6/1992 Resp 45.374/MG, Rel. Min. Barros Monteiro, DJ 23/9/1996 Resp 109.450/MG, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 22/6/1998, este último assim ementado: "Civil. Reivindicatória. Posse em justo título. Compromisso de compra e venda não registrado que não abrange o imóvel litigioso. Denunciação da lide inacolhida. Posse injusta. Precedentes. Procedência. Recurso desacolhido. I- A reivindicatória pressupõe um proprietário não-possuidor que age contra um possuidor não-proprietário, desprovido de título oponível ao proprietário. II- O comprovado domínio do autor, aliado a posse sem justo título do réu, em linha de princípio induz a procedência da reivindicatória." Por outro lado, a posse injusta que enseja a propositura da ação reivindicatória (art. 524, do CC) não se confunde com a posse violenta, clandestina ou precária a que se refere o art. 489, do CC. Ressalte-se que, na via especial, não é possível apreciar o acerto do Tribunal a quo quanto ao exame das provas produzidas pelas partes, tendo em vista o óbice do enunciado da Súmula 7 do STJ. IV- Divergência jurisprudencial. A divergência jurisprudencial não está comprovada, uma vez que o recorrente não procedeu à confrontação analítica dos julgados, exigida nos termos dos arts. 541, parágrafo único, do CPC, e 255, §2º, do RISTJ. Ademais, o acórdão recorrido e aqueles apontados como paradigma carecem de identidade ou similitude de bases fáticas, tendo em vista que não cuidam os julgados colacionados pelo recorrente de hipótese em que, sanada a contradição existente no acórdão embargado, a alteração do julgado surgiu como conseqüência necessária. Forte em tais razões, nego seguimento ao recurso especial, com fundamento no art. 557, do CPC, por ser manifestamente inadmissível e contrário à jurisprudência dominante deste Col. Tribunal. Brasília 24/5/2001. Relatora: Ministra Nancy Andrighi. (Recurso Especial n.º 321.311/MT DJU 12/6/2001 pg. 548/549)
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Article Number
3349
Idioma
pt_BR