Notícia n. 3077 - Boletim Eletrônico IRIB / Novembro de 2001 / Nº 397 - 08/11/2001
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
397
Date
2001Período
Novembro
Description
Palestra 2 - 3º painel DIREITO DE PREEMPÇÃO Diogenes Gasparini - Advogado - Mestre e doutor pela PUC/SP - Direito de preempção, direito de preferência ou direito de prelação são expressões verbais sinônimas. Todas expressam os mesmos fatos e indicam uma restrição ao poder de disposição que o proprietário tem sobre a coisa móvel ou imóvel, na medida em que deve, antes da alienação do bem que lhe pertence, oferecê-lo, em igualdade de condições, a certa pessoa, conforme determinado por lei ou cláusula contratual. De outro lado, é o direito que assiste a uma pessoa de ser colocada, consoante determinado por lei ou contrato, em primeiro lugar na satisfação de seus interesses, quando outras desejam disputar sua primazia. É instituto tradicional do Direito Civil. Os romanos já o conheciam e o denominavam pactum prothimiseos. Na atualidade é encontrável em quase todos os ordenamentos jurídicos. No Estatuto da Cidade ou, simplesmente EC, o direito de prelação, como será visto mais adiante, tem, praticamente, o mesmo perfil jurídico de seu homônimo, instituído e regulado pelo nosso Código Civil. Por tal razão dito codex serve de legislação subsidiária na sua aplicação (art. 4°, § 1°, do EC). O plano diretor deverá instituí-lo e elencar as diretrizes requeridas à utilização desse importante instrumento da execução, pelo Município, da política urbana (art. 42, II, do EC), cabendo posteriormente à lei municipal promover a sua regulamentação. 1.- A PREEMPÇÃO NA LEGISLAÇÃO CIVIL O Código Civil no art. 1.149 prescreve que "A preempção, ou preferência, impõe ao comprador a obrigação de oferecer ao vendedor a coisa que aquele vai vender, ou dar em pagamento, para que este use de seu direito de prelação na compra, tanto por tanto". Embora o direito de preferência esteja, nesse codex, referido como uma das cláusulas especiais da compra e venda, é comum encontrá-lo em outras leis que regulam transações diversas da compra e venda, a exemplo da enfiteuse e da locação. Nessa legislação esparsa não se tem a regulamentação de uma compra e venda, mas se tem instituído e disciplinado o direito de preferência. Com efeito, no contrato de enfiteuse o senhorio tem direito à preferência quando o enfiteuta se dispuser a alienar os direitos enfitêuticos ou, de forma mais simples, sempre que pretender alienar o domínio útil. O mesmo se passa com a locação, pois nesse caso o locador deve dar preferência ao locatário sempre que desejar alienar o imóvel que lhe fora locado. Vê-se, também, que o beneficiário da preferência, tanto no emprazamento ou enfiteuse como na locação, não é o vendedor a que se refere o art. 1.149 do Código Civil quem deve cumprir essa obrigação, pois sequer há uma compra e venda no sentido indicado nesse diploma legal. De outra parte, a obrigação de oferecer o bem ao beneficiário do direito de preferência não decorre de cláusula contratual, mas de lei. Estabelece o art. 1.150 do Código Civil que a União, o Estado ou o Município, oferecerá ao ex-proprietário o imóvel desapropriado, pelo preço por que o foi, caso não tenha o destino, para que se desapropriou. O art. 1.151 estatui que o vendedor pode também exercer seu direito de prelação, intimando o comprador, quando lhe constar que esse vai vender a coisa. O direito de preempção, reza o art. 1.152 do Código Civil, não se estende senão às situações indicadas nos arts. 1.149 (compra e venda e dação e pagamento) e 1.150 (desapropriação), nem a outro direito real que não a propriedade. O direito de preempção caducará, se a coisa for móvel, não se exercendo nos três dias, e, se for imóvel, não se exercendo nos trinta dias subseqüentes àquele, em que o comprador tiver afrontado o vendedor, prescreve o art. 1.153 do Código Civil. Quando o direito de preempção for estipulado a favor de dois ou mais indivíduos em comum, só poderá ser exercido em relação à coisa no seu todo. Se alguma das pessoas, a quem ele toque, perder, ou não exercer o seu direito, poderão as demais utilizá-lo na forma sobredita, estatui o art. 1.154 do Código Civil. Prescreve o art. 1.155 desse diploma legal, que aquele que exerce a preferência, está, sob pena de a perder, obrigado a pagar, em condições iguais, o preço encontrado, ou o ajustado. Responderá, reza o art. 1.156 do Código Civil, por perdas e danos o comprador, se ao vendedor não der ciência do preço e das vantagens, que lhe oferecem pela coisa. Por fim, estabelece o art. 1.157 dessa lei civil, que o direito de preferência não pode ser cedido a terceiros, nem repassado aos herdeiros. Com base nessa disciplina, ANTÔNIO CHAVES ao dissertar sobre o direito de preempção ou preferência (Enciclopédia Saraiva do Direito, Coordenação de R. Limongi França, São Paulo, Saraiva, 1977, vol. 26, p. 237) dá a esse instituto do Direito Civil definição consentânea com a realidade do nosso ordenamento jurídico, pois considera as disposições do Código Civil e as diversas leis que o instituíram e o disciplinaram. Com efeito, define-o "como cláusula contratual, ou imposição de lei, em virtude da qual fica assegurado a uma determinada pessoa o direito de ser preferida como compradora, no caso de venda ou dação em pagamento de determinada coisa, em igualdade de condições". Sua definição não fica vinculada aos estritos dizeres do Código Civil, na medida em que entende a preferência como obrigação também decorrente de lei e não a restringe em favor do vendedor, pois pode privilegiar um terceiro. O Código Civil de 2001, ainda por entrar em vigor, ao conceituar o direito de preempção repete a definição do Código Civil de 1916. Com efeito, estabelece seu art. 513 que "A preempção, ou preferência, impõe ao comprador a obrigação de oferecer ao vendedor a coisa que aquele vai vender, ou dar em pagamento, para que este use de seu direito de prelação na compra, tanto por tanto", embora pudesse oferecer uma definição mais conformada com a utilização desse instituto. De qualquer modo nada mudará, pois o conceito acanhado do novo Código Civil, quando em vigor, não embotará a largueza que se observa na prática desse instituto, consoante o tratamento que lhes dão a doutrina, a jurisprudência e a própria legislação. Duas são as modalidade ou espécies de preferência à vista do nosso ordenamento jurídico positivo: a legal e a contratual. Legal é a preferência que a lei outorga à alguém, quando certa pessoa se dispõe a realizar um dado negócio, a exemplo, da locação, da enfiteuse e da venda de quinhão de propriedade condominial. Em tais casos, a lei dá preferência, em igualdade de condições, ao locatário para adquirir o objeto da locação, ao senhorio direto para exercer a opção na aquisição do domínio útil e ao condômino para a aquisição de quinhão posto a venda. Contratual é a preferência que as partes envolvidas num dado negócio, como é o caso da compra e venda, resolvem outorgar em favor de determinada pessoa, quase sempre o vendedor na aquisição do objeto da transação. Assim, por força dessa cláusula o comprador deve oferecer ao beneficiário desse direito, ou seja, ao vendedor, em igualdade de condições, o bem que deseja alienar ou dar em pagamento. O direito de preferência, no caso do Estatuto da Cidade, é da primeira espécie, ou seja, legal. 2.- A PREEMPÇÃO NO ESTATUTO DA CIDADE O Estatuto da Cidade previu e regulou, nos arts. 25 a 27, o direito de preempção em favor do Poder Público municipal. Com efeito, estabeleceu o primeiro desses dispositivos que "O direito de preempção confere ao Poder Público municipal preferência para a aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares". Esse diploma legal seguiu o modelo da legislação esparsa, na medida em que dá preferência ao Município na aquisição de certo bem imóvel urbano, situado em área delimitada por lei municipal embasada no plano diretor onde a incidência do regime de preempção será de observância obrigatória em favor desse ente da nossa Federação, estranho em relação à alienação onerosa que está sendo travada entre particulares. 3.- CONCEITO O direito de preempção, nos termos em que foi instituído e regulado pelo Estatuto da Cidade, deveria ser mais bem tratado para evitar discussões que certamente vão acontecer quando de sua aplicação. De qualquer modo, caberá aos doutrinadores e ao Judiciário o trabalho de interpretá-lo corretamente. O dispositivo refere-se a alienação onerosa, acolhendo, portanto, apenas as transferências dominiais ajustadas mediante contratos de compra e venda, restando fora, por conseguinte, a dação em pagamento, a permuta, a doação, os casos de herança e legado. De outra parte, não menciona se a preferência há de ser em igualdade de preço e condições de pagamento ou se pode ser sob outro preço e condições diversas. Qualquer que seja a interpretação, restrita ou ampla, há de ser entendido que somente se tem preferência nas mesmas condições de preço e pagamento. Com efeito, esse e outros instrumentos de execução da política urbana, nos termos do § 1° do art. 4° do Estatuto da Cidade, são regulados por legislação própria, aplicando-se, no entanto, o que esse diploma legal prescreve. Logo, no que o Estatuto da Cidade for omisso, aplica-se o Código Civil que disciplina a matéria e quando em vigor o novo Código Civil esse será, na hipótese, o diploma legal aplicável. A preferência instituída e regulada pelo Estatuto da Cidade deve ser entendida tanto por tanto, ou seja em igualdade de preço e condições de pagamento. Por fim, diga-se que a alienação pode ter início na própria vontade do proprietário que deseja se desfazer de sua propriedade ou na proposta de compra e venda formulada por terceiro, embora essa distinção não esteja claramente indicada no Estatuto da Cidade. No primeiro caso, o proprietário age sem qualquer provocação e resolve vender sua propriedade, mediante o recebimento de certo preço. No segundo, o proprietário é instado por terceiro a alienar sua propriedade, na medida em que lhe oferece uma proposta de compra e venda. Nas duas hipóteses a alienação há de ser onerosa e ajustada com particular. Assim, podemos definir o direito de preferência, previsto no art. 25 do Estatuto da Cidade, como o direito assegurado por lei ao Município, nas mesmas condições de preço e pagamento, de ser preferido quando o proprietário de imóvel urbano situado em área delimitada por lei municipal baseada no plano diretor e sujeita ao regime da preempção, se dispuser por vontade própria a aliená-lo onerosamente a particular ou se dispuser a aliená-lo, nessas condições, a terceiro em razão do recebimento formal de proposta de compra e venda. (...)
Direitos
IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
Article Number
3077
Idioma
pt_BR