Notícia n. 2753 - Boletim Eletrônico IRIB / Julho de 2001 / Nº 348 - 17/07/2001
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
348
Date
2001Período
Julho
Description
Usucapião. Bem público - domínio útil. Enfiteuse. Imóvel foreiro - propriedade do Município. Admissibilidade. - Agravo de instrumento. Ação de usucapião extraordinário. Domínio útil referente a bem público. Imóvel que anteriormente já era foreiro. Admissibilidade. Súmula n. 83 desta Corte. Súmula n. 7 do STJ I- Esta Corte entende ser possível o usucapião do domínio útil de imóvel foreiro de propriedade do Município. II- Estando o aresto acoimado em consonância com o entendimento desta Corte, incide na espécie a súmula n. 83/STJ. III- A reinversão das molduras fáticas estabelecidas nas vias ordinárias demanda o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, o que é vedado na via especial. Decisão. Cuida-se de Agravo de instrumento interposto por Armando Kilson contra decisão que negou seguimento ao recurso especial interposto contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais em apelação em ação de usucapião extraordinário. O ora agravante ajuizou ação de usucapião extraordinário em face de Francisco Domiciano de Paula, para ver declarado em seu favor o usucapião de domínio útil, sustentando que vem exercendo a posse do terreno foreiro situado no Bairro Aguada medindo 10707 m2, de forma mansa e pacífica e sem oposição de nenhuma espécie, há mais de vinte anos. A sentença extinguiu o processo sem julgamento do mérito, por entender que o pedido é juridicamente impossível na medida em que o bem imóvel pertence ao patrimônio público municipal. Apelou a ora agravada, sustentando que reúne todos os requisitos necessários à declaração do usucapião sobre a área, objeto da ação, com posse mansa, pacífica, interrupta, sem oposição de quem quer que seja. O Tribunal a quo anulou de ofício o processo ab initio. Proferida nova sentença, julgou-se procedente o pedido. O ora agravante apelou aduzindo que os bens públicos não são suscetíveis de usucapião, ainda que se pleiteie apenas a aquisição do domínio útil, quando se trata de bem foreiro que, no caso, não houve transferência do domínio útil, pois jamais foi pago o foro devido, sendo que a propriedade plena pertence ao ente público que não foram demonstrados os requisitos mínimos para a caracterização da prescrição aquisitiva, mormente a posse mansa e pacífica que a apelada abandonou o imóvel, daí que a alegada posse não foi contínua e ininterrupta, como exige o art. 550 do CC. O Tribunal a quo negou provimento ao apelo, restando assim ementado o aresto: "É perfeitamente jurídico o pedido de usucapião extraordinário sobre domínio útil em terreno aforado pela municipalidade, desde que a ação não seja proposta contra esta, mas contra o terceiro, detentor do domínio útil. Sentença mantida." O ora agravante interpôs recurso especial fundamentado na alínea 'a' do permissivo constitucional, apontando contrariedade ao art. 550, do CC. Houve a interposição simultânea de recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal. A decisão ora agravada negou seguimento ao recurso especial sob os seguintes fundamentos: a orientação do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido contrário ao pretendido no recurso especial no que pertine à posse mansa e pacífica, a pretensão do recorrente consiste no reexame de provas, vedado pela súmula n. 7 do STJ. Assim relatado, passo a decidir. O aresto acoimado encontra-se em consonância com o entendimento desta Corte acerca do tema. Vejamos: "Usucapião. Domínio útil. Possibilidade jurídica. - Em tese, possível a via eleita, em se tratando de imóvel que já era foreiro. Verdadeira condição de imóvel a depender da dilação probatória. Incidência no caso da súmula nº 7- STJ. Recurso especial não conhecido." (REsp 183360/PE. Rel. Min. Barros Monteiro, DJ 13/12/1999) "Usucapião. Domínio útil referente a bem público. Imóvel que anteriormente já era foreiro. Admissibilidade. Admissível o usucapião quando imóvel já era foreiro e a constituição da enfiteuse em favor do usucapiente se faz contra o particular até então enfiteuta e não contra a pessoa jurídica de direito público que continua na mesma situação em que se achava, ou seja, como nua-proprietária. Precedentes do STF e STJ. Recurso especial conhecido e provido." (Resp 154123/PE, Rel. Min. Barros Monteiro, DJ 23/8/1999) "Civil e processual. Domínio útil. Usucapião. Imóvel foreiro. I- Doutrina e jurisprudência perfilham entendimento no sentido de que o domínio útil de imóvel foreiro de município é usucapiável. II- Recurso não conhecido." (REsp 20791/SP. Rel. Min. Waldemar Zveiter, DJ 7/12/1992) "Usucapião. Bem de que nu-proprietário o Estado possível o usucapião relativamente ao chamado domínio útil, quando a pessoa jurídica de direito público tem apenas a nua propriedade e a prescrição aquisitiva refere-se ao chamado domínio útil de que é titular um particular." (Resp 10986/RS, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ 9/3/1992) Destarte, incide na espécie a súmula n. 83 desta Corte. Ademais, a pretensão do ora agravante consiste no reexame de provas, tal qual se depreende do seguinte trecho da petição de interposição do recurso especial: "Compulsando-se os autos, não se pode verificar quaisquer dos requisitos mínimos para a caracterização da prescrição aquisitiva, dentre eles o mais importante, qual seja, a posse mansa e pacífica da coisa. Extraindo-se dos depoimentos testemunhais colhidos na audiência de instrução e julgamento realizada no dia 16/5/94, às 13:00 h, perante o juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Barbacena - MG, aproveita-se os seguintes testemunhos: (...) Analisando-se os depoimentos, nota-se a ausência de três dos mais importantes requisitos da prescrição aquisitiva, ou seja, a posse mansa, pacífica e contínua do imóvel, todos dispostos no artigo 550 do CC, in verbis: (...) E finalmente não existe, como já verificado alhures, usucapião de terreno foreiro, natureza esta confessada pela recorrida na exordial, incompatível com a prescrição aquisitiva, e verificada pelas informações prestadas pelo Município de Barbacena, às fls. 13 e 50. (...) Certamente, analisando a farta prova produzida, encontrar-se-ia posição diversa daquela adotada pelo Tribunal, bastando apenas a apreciação das razões para se concluir pelo indeferimento do pedido de declaração do usucapião e o provimento da apelação cível de cujo acórdão se recorre." O Tribunal a quo assentou-se as seguintes bases fáticas: "(...) Que o imóvel, objeto do usucapião, foi alvo de aforamento ou emprazamento concedido a Francisco Domiciano de Paula, testificam-no claramente a certidão da Prefeitura Municipal e a informação do Procurador do Município de Barbacena e, mais do que tais documentos, a certidão de Registro de Imóveis, não restando, pois, a menor dúvida de que o terreno, objeto do usucapião, era terreno aforado a Francisco Domiciano de Paula, contra quem foi proposta a presente ação, já que exercia ele o domínio útil sobre o referido imóvel. Assim, só se pode concluir que vasta citação jurisprudencial, trazida pelo segundo apelante, é inaplicável à espécie, eis que se refere, possivelmente, a usucapião proposto diretamente contra o poder público. (...) Ficou evidenciado através da prova testemunhal que a apelada possuía o domínio útil do imóvel, objeto da ação, como se proprietária fosse do mesmo portanto cum animo domini, o que nem necessário seria, pois, na verdade, tinha a posse exclusiva da área, que era objeto de domínio útil exercido por terceiro particular, no caso, Francisco Domiciano de Paula. A posse apelada sobre o terreno era ininterrupta, o que ficou comprovado com a prova testemunhal, pois ali chegou a fazer plantação, não perdendo, porém, o vínculo como posse, quando, por curto espaço de tempo, dado à precariedade da casa ali existente, passou a residir em Barbacena, sem, contudo, perder o vínculo possessório, já que, mesmo ali, sempre ia ao imóvel, dando-lhe a devida assistência e nele laborando, mantendo assim o vínculo físico e afetivo com o terreno, sem quebrar o elo da continuidade da posse. Por outro lado, a posse da apelada foi mansa e pacífica, em que pese a impugnação do apelante, que não tem a mínima procedência, pois o que restou bem provado com as testemunhas é que havia uma cerca na divisa do apelante com a apelada, cerca que foi destruída por aquele para que seu gado pudesse pastar no imóvel possuído pela apelada, o que levou esta a construir novamente a cerca que, uma vez mais, foi demolida pelo apelante que, mesmo assim, não se vexou de promover a ocorrência policial contra a apelada, quando ele e não ela quem, primeiro, desfizera a aludida cerca. (...)" Sendo assim, a reinversão das molduras fáticas estabelecidas nas vias ordinárias demanda o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, o que é vedado na via especial. Forte em tais razões, nego provimento ao presente agravo de instrumento, com fulcro no art. 557, do CPC. Brasília 12/12/2000. Ministra Nancy Andrighi, Relatora. (Agravo de Instrumento nº 250.436/MG DJU 18/12/2000 pg. 708/709)
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