Notícia n. 2638 - Boletim Eletrônico IRIB / Junho de 2001 / Nº 323 - 20/06/2001
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
323
Date
2001Período
Junho
Description
Execução Hipotecária. Embargos do devedor. Efeito suspensivo. - Processo civil. Agravo de instrumento. Meio utilizado para destrancar recurso especial retido. Juízo de admissibilidade diferido. Possibilidade do relator, no STJ, apreciar os pressupostos recursais pertinentes ao recurso especial. Execução hipotecária. Ajuizamento de ação de embargos do devedor. Suspensão da execução. Art. 5º, parágrafo único da Lei nº 5.741/71 - Revogação pelo art. 739, § 1º do Código de Processo Civil I- O agravo de instrumento destina-se a verificar a correção ou o desacerto do juízo que aprecia a admissibilidade do recurso especial e obsta a sua ascensão à Corte Superior. A decisão que determina a sua retenção, nos termos do art. 542, § 3º, do CPC, equivale à sua inadmissão. Assim sendo, está o órgão julgador desta Corte Superior autorizado a proceder a análise dos requisitos extrínsecos e intrínsecos do recurso especial, ainda quando inexistia prévio juízo delibatório manifesto pelo Tribunal a quo. Tal medida, que atende as exigências da praxe forense, justifica-se pela imperiosa necessidade de se impedir o perpetrar de delongas e dispêndios no manejo dos recursos, com manifesto prejuízo à prestação jurisdicional, sua satisfatividade e celeridade. II- À devedora hipotecária devem ser asseguradas garantias processuais mínimas, que estão expressas no texto constitucional vigente, como a ampla defesa e o contraditório, não se admitindo, que no vigente Estado democrático de direito, alguém seja privado de sua propriedade sumariamente, o que exsurge com a simples propositura da ação de execução hipotecária, regida pela Lei nº 5.741/71, uma vez que eventual propositura da ação de embargos do devedor, em execução hipotecária, não seria recebida, a princípio, com o efeito suspensivo, que é exceção nesse procedimento especial. III- A restrição de direito processual do embargante devedor de dívida hipotecária, com injusta e ilegal diferenciação dos efeitos em que é recebida a petição inicial, não é proporcional à garantia do credor hipotecário, não é necessária a privação antecipada do bem, e nem adequada, porque implica sumário apossamento de bens do devedor, sem o devido processo legal. Decisão. Cuida-se de agravo de instrumento interposto por Antonio Afonso Jardim e cônjuge objetivando destrancar recurso especial retido na origem. Os ora agravantes interpuseram agravo de instrumento contra decisão que indeferiu efeito suspensivo aos embargos por eles opostos na execução hipotecária que lhes move o banco agravado. O e. Tribunal a quo manteve a decisão agravada em acórdão assim ementado: "Execução Hipotecária. Ajuizamento com base na Lei 5.741/71. Embargos devem ser recebidos sem efeito suspensivo. Prosseguimento da execução. Inteligência dos arts. 739, parágrafo único do Código de Processo Civil e 5º, parágrafo único da lei especial. Decisão mantida." Irresignados, interpuseram os agravantes recurso especial, arrimado nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional para delatar vilipêndio ao art. 739, § 1º do Código de Processo Civil, bem como dissídio jurisprudencial. O e. Tribunal a quo determinou que ficasse o recurso especial retido nos autos de acordo o parágrafo 3º do art. 542 do Código de Processo Civil. Brevemente relatado, passo a decidir: Preliminarmente, cumpre apontar que o agravo de instrumento destina-se a verificar a correção ou o desacerto do juízo que aprecia a admissibilidade do recurso especial e obsta a sua ascensão à Corte Superior. A decisão que determina a sua retenção, nos termos do art. 542, § 3º, do CPC, equivale à sua inadmissão. Assim sendo, está o órgão julgador desta Corte Superior autorizado a proceder à analise dos requisitos extrínsecos e intrínsecos do recurso especial, ainda quando inexistia prévio juízo delibatório manifesto pelo Tribunal a quo. Tal medida, que atende às exigências da praxe forense, justifica-se pela imperiosa necessidade de se impedir o perpetrar de delongas e dispêndios no manejo dos recursos, com manifesto prejuízo à prestação jurisdicional, sua satisfatividade e celeridade. Afirmam os agravantes, que v. acórdão vergastado violou o disposto no art. 739 § 1º do CPC ao não conferir efeito suspensivo aos embargos à execução por ele opostos. Entendeu o e. Tribunal a quo que o referido dispositivo não se aplica à espécie por ser a execução hipotecária regulada por lei especial, estando amparada pelo art. 5º, parágrafo único da Lei nº 5.741/71, que rege, especificamente, só sendo admitida a suspensão da execução quando a matéria versada na ação de embargos do devedor trate do depósito integral da importância reclamada na petição inicial da execução, ou que a dívida foi resgatada. O cerne da quaestio juris é a vigência do art. 5º, da Lei nº 5.741/71, em face da nova ordem processual. Ao devedor hipotecário devem ser asseguradas garantias processuais mínimas, que estão expressas no texto constitucional vigente, como a ampla defesa e o contraditório, não se admitindo, que no vigente Estado democrático de direito, alguém seja privado de sua propriedade sumariamente, o que exsurge com a simples propositura da ação de execução hipotecária, regida pela Lei nº 5.741/71, uma vez que eventual propositura da ação de embargos do devedor, em execução hipotecária, não seria recebida, a princípio, com o efeito suspensivo, que é exceção nesse procedimento especial. Por outro lado, é inconstitucional, por ser desarrazoado, o condicionamento do recebimento de embargos do devedor, em seu efeito suspensivo, a que a parte "alegue e prove: I- que depositou por inteiro a importância reclamada na inicial II- que resgatou a dívida, oferecendo desde logo a prova da quitação". Estaria-se, dessa forma, esvaziando a utilidade da ação de embargos à execução hipotecária, bem como impondo que a ação seja manifestante procedente, in limine. A emérita Procuradora de Justiça Suzana de Toledo Barros, em sua obra "O Princípio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis restritivas de Direitos Fundamentais", pág. 27, Ed. Brasília Jurídica, 1996, leciona que: "Como anota Canotilho, o princípio considerado significa, no âmbito das leis interventivas na esfera de liberdades dos cidadãos, que qualquer limitação a direitos feita pela lei deve ser apropriada, exigível e na justa medida, atributos que permitem identificar o conteúdo jurídico do cânone da proporcionalidade em sentido amplo: exigência de adequação da medida restritiva ao fim ditado pela própria lei necessidade da restrição para garantir a efetividade do direito e a proporcionalidade em sentido estrito, pela qual se pondera a relação entre a carga da restrição e o resultado". Assim, a restrição de direito processual do embargante devedor de dívida hipotecária, com injusta e ilegal diferenciação dos efeitos em que é recebida a petição inicial, não é proporcional à garantia do credor hipotecário, não é necessária a privação antecipada do bem, e nem adequada, porque implica sumário apossamento de bens do devedor sem o devido processo legal. Patente a ofensa à cláusula constitucional de razoabilidade da lei federal restritiva, pela desproporcionalidade ilegítima da garantia processual do credor hipotecário em detrimento do sumário desapossamento de bens do devedor. Some-se a esse fundamento o fato de que o depósito da importância reclamada na inicial é outro aspecto que impede o livre acesso ao Judiciário, dada a reiterada prática dos agentes do sistema financeiro habitacional embutirem cláusula de vencimento antecipado da dívida total pelo inadimplemento parcial. Forçosa a conclusão de que o art. 5º, segunda parte, seus incisos e parágrafo único não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, nem se apresentam em consonância com a sistemática do Código de Processo Civil, especialmente com os arts. 745 e 739, § 1º. Não está aqui a se apregoar que a lei geral tem o condão de revogar tacitamente a lei específica, o que contraria os comezinhos princípios hermenêuticos. Entretanto, para se atender o fim social da lei posterior, qual seja a Lei nº 8.953/94, que alterou o § 1º do art. 739 do Código de Processo Civil, e adequar a sistemática do Código de Processo Civil, que prevê o efeito suspensivo, sem restrição, para a ação de embargos do devedor, deve o julgador conferir uma interpretação legal que se coadune com a estrutura orgânica do ordenamento jurídico em si. Sem adentrar no aspecto constitucional do art. 41 do Decreto-Lei nº 167/67 e não fosse a imperiosa necessidade de se uniformizar a sistemática processual de execução, os pretórios pátrios têm espraiado a inadequação dos ritos especiais de execução ao moderno processo civil, no que toca ao manejo da ação de embargos do devedor destituído do efeito de suspender o curso do processo de execução. Por fim, associado aos fundamentos constitucionais (ampla defesa, contraditório, proporcionalidade) e de revogação tácita do art. 5º da Lei nº 5.741/71 (pela Lei nº 8.953/94, que alterou o art. 739, § 1º do Código de Processo Civil, com o qual é incompatível), cabe pontuar que a incerteza do crédito pelo ajuizamento de ação consignatória e descumprimento contratual do credor, autoriza a suspensão da execução. Registrem-se os seguintes precedentes que ratificam tal entendimento: Resp 168.572/PR, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 31.8.1998 e Resp 191.124/PR, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 10.4.2000, esse último assim ementado: "Processual civil. Execução hipotecária. Embargos do devedor. Efeito suspensivo. Lei 5.741/71 (arts. 5º e 6º). CPC (arts. 739, § 1º) 1- Sendo os embargos do devedor ação autônoma de defesa do executado, nada impede sejam recebidos no efeito suspensivo a fim de evitar dano de difícil reparação à parte. Inteligência dos arts. 5º e 6º da Lei 5.741/71 c/c § 1º do art. 739/CPC. 2- Recurso especial conhecido, porém, improvido." Forte em tais razões, conheço do agravo de instrumento para dar provimento ao recurso especial, pelas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, conferindo-se efeito suspensivo aos embargos à execução opostos pelo agravante. Brasília 22/11/2000. Ministra Nancy Andrighi, Relatora. (Agravo de Instrumento nº 338.432/SP DJU 5/12/2000 pg. 545)
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