Notícia n. 2553 - Boletim Eletrônico IRIB / Maio de 2001 / Nº 314 - 15/05/2001
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
314
Date
2001Período
Maio
Description
Bem de família. Impenhorabilidade. Benefício estendido a qualquer pessoa integrante da entidade familiar - solteira, casada, viúva, desquitada, divorciada. - Agravo de instrumento. Embargos do devedor à execução. Bem de família. Impenhorabilidade. Lei 8.009/90. As expressões "casal" e "entidade familiar" constantes do art. 1º da Lei 8.009/90 devem ser interpretadas consoante o sentido social da norma, devendo a família ser caracterizada como instituição social de pessoas que se agrupam por laços de casamento, união estável ou descendência. Considerando que a lei não se dirige a um grupo de pessoas, mas permite que se proteja cada indivíduo como membro da instituição em apreço, mister se faz estender os seus benefícios a qualquer pessoa integrante da entidade familiar, seja ela casada, solteira, viúva, desquitada ou divorciada, uma vez que o amparo legal é dado para que seja a esses assegurado um lugar para morar. Precedentes desta Corte. Decisão. Cuida-se de agravo de instrumento interposto por A.S.P.S. contra decisão monocrática que negou seguimento a recurso especial arrimado no art. 105, inc. III, alíneas "a" e "c" da Constituição Federal, sob os fundamentos de incidência da súmula 7 e ausência de demonstração de dissenso pretoriano. A ora agravante opôs embargos do devedor à execução que lhe move o agravado, lastreada em título executivo extrajudicial. Alegou nulidade da penhora por ausência de citação do outro executado. Sustentou também a impenhorabilidade do imóvel, por se tratar de sua única residência, dizendo-se amparada pela Lei n. 8.009/90. Os embargos foram julgados improcedentes. Inconformada, a agravante recorreu ao eg. Tribunal a quo. O v. acórdão restou assim ementado: "Cambial. Notas promissórias. Embargos ofertados pela avalista e julgados improcedentes. Penhora. Lei 8.009/90. Imóvel que já foi dado ao mesmo credor em garantia hipotecária. Artigo 756 do Código Civil. Bem alienável. Recurso improvido." Irresignada, interpôs recurso especial alegando contrariedade ao art. 756 do CPC e à lei n. 8.009/90, além de dissídio jurisprudencial. Em que se pese a alegação de dissídio jurisprudencial, é forçoso assinalar que não se verificou comprovação da divergência jurisprudencial, exigida nos termos dos arts. 541, parágrafo único, do CPC, e 255, §2º, do RISTJ. A agravante limitou-se a colacionar julgados à sua peça especial, não realizando a necessária confrontação analítica entre os arestos, de modo a evidenciar o efetivo dissenso pretoriano. Mister se faz transcrever trecho do v. aresto hostilizado, em que trata da impenhorabilidade do bem em questão: "No caso, o imóvel é ocupado, segundo se depreende, apenas pela apelante e que ostenta estado civil de viúva. Ora, a par de inexistente qualquer subsídio que indique a existência de outro parente ou dependente que com ela viva sob o mesmo teto, bem se vê que o art. 1º da Lei n. 8.009/90 pressupõe bens possuídos pelo casal ou pela entidade familiar. A lei, como já destacou o E. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do recurso especial 67.112-4, relator o Ministro Barros Monteiro, 'destina-se a proteger, não o devedor, mas a sua família. Assim, a impenhorabilidade nele prevista abrange o imóvel residencial do casal ou da entidade familiar, não alcançando o devedor solteiro, que reside solitário'. Idêntica é a situação da mulher viúva." O art. 1º da Lei n. 8.009/90 assim dispõe: "Art. 1.º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraídas pelos cônjuges ou pelos pais e filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei." O v. aresto hostilizado, ao equiparar a pessoa solteira à pessoa viúva, decidiu que a agravante não encontra-se sob o amparo da Lei n. 8.009/90, por não restar caracterizado que o imóvel penhorado é residência de casal ou de entidade familiar. Contudo, assim prevê o art. 226, §4º, da Magna Carta: "Art. 226. ... §4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes." Registre-se, contrariamente, ao entendimento explicitado no v. acórdão recorrido, trecho do voto proferido pelo em. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, relator do Recurso Especial 182.223, DJ de 10/5/1999: "O diploma legal referido precisa ser interpretado consoante o sentido social do texto. Estabelece limitação à regra draconiana de o patrimônio do devedor responder por suas obrigações patrimoniais. O incentivo à casa própria busca proteger as pessoas, garantindo-lhes o lugar para morar. Família, no contexto, significa instituição social de pessoas que se agrupam, normalmente por laços de casamento, união estável ou descendência. Não se olvidem ainda os ascendentes. Seja o parentesco civil, ou natural. Compreende ainda a família substitutiva. Nessa linha, conservada a teleologia da norma, o solteiro deve receber o mesmo tratamento. Também o celibatário é digno dessa proteção. E mais. Também o viúvo, ainda que seus descendentes hajam constituído outras famílias, e como, normalmente acontece, passam a residir em outras casas. Data venia, a Lei n. 8.009/90 não está dirigida a número de pessoas. Ao contrário - à pessoa. Solteira, casada, viúva, desquitada, divorciada, pouco importa. O sentido social da norma busca garantir um teto para cada pessoa. Só essa finalidade, data venia, põe sobre a mesa a exata extensão da lei. Caso contrário, sacrificar-se-á a interpretação teleológica para prevalecer a insuficiente interpretação literal. Nessa extensão, desnecessário, na hipótese sub judice, fazer investigação probatória. O v. acórdão repeliu a pretensão do recorrente tão só porque solteiro." No mesmo sentido está o recurso especial 218.377, Rel. Min. Barros Monteiro, DJ de 11/9/2000. Assim sendo, mister se faz reconhecer a impenhorabilidade do bem em que reside a agravante. Quanto ao fato de já estar o imóvel gravado com hipoteca, trata-se de ônus advindo de título diverso do embasador da execução embargada. Inviável, assim, a invocação do art. 3º, inc. V, da Lei n. 8.009/90. Forte em tais razões, conheço do agravo para dar provimento ao recurso especial, com fulcro no art. 557, §1º - A, do CPC, pela alínea "a" do permissivo constitucional, para julgar procedentes os embargos do devedor à execução em tela, invertendo-se o ônus sucumbenciais. Brasília 11/10/2000. Ministra Nancy Andrighi, Relatora. (Agravo de Instrumento nº 240.297/SP DJU 24/10/2000 pg. 202/203)
Direitos
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Article Number
2553
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pt_BR