Notícia n. 1698 - Boletim Eletrônico IRIB / Junho de 2000 / Nº 205 - 04/06/20
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
205
Date
2000Período
Junho
Description
Loteamento disfarçado contribuição condominial indevida - S. Jacomino - Associações ajudam na proliferação de lotes é o título da reportagem publicada pela Folha de São Paulo na sua edição de hoje (4.jun.2000). O jornal acaba demonstrando simplesmente a falência da administração pública da cidade de São Paulo na regulação e ordenação do uso do solo urbano da metrópole. Segundo o matutino, metade da população paulistana mora em habitação irregular. Os estudos da Professora Helena Menna Barreto Silva, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, citados na reportagem, demonstram, de forma irretorquível, que as associações de moradores têm um papel fundamental na proliferação de loteamentos clandestinos. São invasões, aquisições de áreas protegidas e principalmente associações de construção comunitária de fachada, explorando, como verdadeiras imobiliárias, a ocupação irregular do solo urbano, deformando a cidade e criando o caos urbanístico que todos conhecem. Por outro lado, são sobejamente reconhecidos os péssimos exemplos de contubérnio entre o poder público e as empresas piratas que exploram, ao zênite, um patrimônio cultural inalienável da sociedade: a cidade. Consumada a ocupação irregular do solo urbano, essas associações piratas encontram na contribuição compulsória do "condômino" a sua sustentação econômica, viabilizando o sucesso desses empreendimentos irregulares e sua multiplicação incontrolável. São taxas condominiais deliberadas em assembléias gerais de condomínio ou parcelamentos irregulares. Na verdade, criam-se verdadeiras empresas clandestinas autogestionárias, numa inversão paradoxal dos movimentos sociais históricos, pois tornam-se promotoras de interesses parcelares - alguns legítimos - contra os interesses da sociedade como um todo. Contam com a complacência das autoridades administrativas e o paternalismo daqueles que vêm o problema mas tergiversam, sustentando que a não contribuição daria ensanchas a enriquecimento ilícito daquele que é o beneficiário de bens e serviços promovidos pelo "condomínio" irregular. Além das reuniões de rateio de despesas condominiais, sem que o condomínio sequer exista, dando suporte jurídico a essa excrecência urbanística, encontram-se os impávidos contratos de gaveta. Aqueles mesmos, que apregoados como solução econômica e informal à aquisição de imóveis pela população de baixa renda, tornaram-se o título patrimonial remido do clube dos excluídos. Os debates que a Anoreg-Sp têm fomentado, inclusive com a opinião de especialistas - como o texto do Dr. Hélio Lobo Jr., nesta edição - visam a pôr o dedo na ferida. É preciso um grande esforço para recuperar a cidade clandestina, dando foros de cidadãos àqueles que resistem bravamente na clandestinidade imposta por interesses econômicos escusos e pelo descaso da administração pública. Abaixo reproduzimos uma sentença do juiz Elcio Trujillo que enfrenta o mesmíssimo problema dos condomínios irregulares. Vale a pena conferir seus argumentos. Proc. n. 2729/99 Vistos etc... SOCIEDADE AMIGOS ..., qualificada, ingressou com ação de cobrança contra ESD, também qualificada, aduzindo, em síntese, ser a requerida proprietária de imóvel junto ao residencial I. resultando em débito com as mensalidades indicadas a fls. 3, motivo pelo qual, juntando documentos de fls. 6/48, pediu a citação da requerente para responder aos termos da ação até final procedência. Designada audiência, citada a requerida, resultou infrutífera a composição. Cuidou a requerida da apresentação de contestação - fls. 57/67 - articulando, em preliminar, carência da ação por ausente regular documento a demonstrar a situação de condômina, não sendo, por outro lado, associada, motivo pelo qual, também quanto ao mérito, insistiu na improcedência da lide, tendo juntado os documentos de fls. 69/96. Documentos apresentados pela requerente a fls. 98/101 e a fls. 115/167. Em audiência, fixado prazo para manifestação do polo adverso. Relatado, DECIDO. Designado pela Presidência do Eg. Tribunal de Justiça para auxiliar e proferir decisões em processos da Décima Vara Cível da Comarca de Ribeirão Preto, recebi, entre muitos, o feito presente. Cumpre apontar que a lide seguiu, em primeira fase, o rito sumário. A contar da audiência, infrutífera a composição, apresentada contestação, fixado prazo para manifestação em prol da requerente, o feito seguiu o rito ordinário, sendo produzida prova documental. Ausente qualquer prejuízo, mesmo porque, em paralelo à ausência de reclamação pelas partes, surge este mais amplo, permitindo dilação probatória livre. Ademais, a própria requerente, em pedido de fls. 172, assumindo o rito ordinário, pediu o julgamento da lide no estado em que se encontrava. Ao que verifico dos autos, loteamento realizado, com venda de lotes, que os compradores denominam de chácaras. Criada, em torno do loteamento, uma sociedade civil que no caso, como requerente, pretende receber, junto à requerida, valores de despesas tidas como partilhadas, decorrentes de suposto condomínio. A requerida negou existência do condomínio, bem como o fato de não ser associada da requerente. Esse o quadro posto. Existente lide idêntica, com julgamento anterior impondo a responsabilidade do pagamento à requerida, conforme anotado na audiência, em fase de recurso. Tal circunstância não inibe, nesta fase, o conhecimento da matéria. Conforme apontado, ausente demonstração, pela requerente, da existência, nos moldes da legislação registral existente, de regular condomínio instituído e que, diante do regular registro, imporia, a todos os condôminos, as despesas, em ressarcimento, das realizações comuns praticadas. No caso, ao que observo, o empreendedor trouxe manifesto equívoco para os compradores dos lotes, apresentando a figura de um condomínio formal quando, em realidade, tal figura surge ausente. Feriu, no ato de negociação, os princípios registrais, bem como a legislação específica e que trata dos condomínios horizontais. Daí a figura, ao que observo, de Sociedade de Amigos. Contudo, nesse campo, resultando em associação, cumpre a solene adesão, sob pena de, não associado, não ser o ocupante do "lote" responsável por qualquer mensalidade exigida pela sociedade. No caso, cuidou a requerida de demonstrar regular pagamento dos tributos, valores que, efetivamente, incidem sobre o "lote". O mais, surge em cobrança e exigência sem amparo legal, ausente, por outro lado, qualquer possibilidade de restrição de ingresso ou circulação na área que, sendo decorrente de loteamento, ausente, repetindo, instituição de condomínio, surge como pública. Não se há, portanto, ausente associação da requerida, exigir qualquer valor em contribuição para a sociedade ou, valores de condomínio, por ausente, conforme já posto, sua formalização. POSTO ISSO e considerando o mais que dos autos consta, de se declarar a efetiva carência da ação, resultando, por conseqüência, extinto o feito - inciso VI, do artigo 267, do Código de Processo Civil - condeno SOCIEDADE AMIGOS ..., qualificada, ao pagamento em prol de ESD, também qualificada, das custas, emolumentos e honorária do patrono que arbitro em 15% sobre o valor da causa atualizada, a contar da distribuição, pelos índices das TRs. P. R. e Intimem-se. São Paulo p/ Rib. Preto, em 31 de maio de 2000. ELCIO TRUJILLO, Juiz de Direito, designado
Direitos
IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
Article Number
1698
Idioma
pt_BR