Notícia n. 1692 - Boletim Eletrônico IRIB / Junho de 2000 / Nº 204 - 01/06/20
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
204
Date
2000Período
Junho
Description
Contratos de gavetas estrelas do ocaso político do senador - O Estadão de 30 de maio passado noticia a existência dos "contratos de gaveta" que denunciam o verdadeiro controle acionário da empresa Incal, implicada, segundo o noticiário, no escândalo do fórum trabalhista de São Paulo. A condição de sócio clandestino do Senador Luiz Estevão põe às escâncaras a falência dos registros públicos brasileiros no tocante à publicidade efetiva dos fatos cuja relevância jurídica, econômica e social é indiscutível. Clandestinismo negocial O registro público mercantil é vítima do "clandestinismo negocial". Os fatos jurídicos mais importantes, no tocante ao tráfico jurídico mercantil, passam ao largo do registro público. São milhares de contratos que dormitam nas gavetas de contadores e dos sócios, criando uma situação que é muito próxima daquela encontrada nos albores da instituição desses mecanismos de publicidade registral, saudados então como uma conquista da sociedade. São ecos de uma vontade racionalmente dirigida à solução do clandestinismo: "como toda função indispensável à vida tende a criar, no corpo em que ela se exercita, o seu próprio órgão, a moralidade essencial às transações mercantis, uma vez desaparecida a fiscalização, neste caso, benéfica, das antigas corporações de mercadores, se criou o seu órgão peculiar na publicidade e com ele limitou as desordens do excessivo individualismo de nossa época. Ela surge espontaneamente na vida comercial como função de uma necessidade orgânica que o Estado disciplinou, coordenou e traduziu no instituto oficial do Registro, que se pode definir a sistematização jurídica da publicidade", verberava com peculiar percuciência o Des. Sá Pereira, já em 1914, fazendo eco à doutrina registralista. Hoje a sociedade brasileira padece pelo franco incentivo ao clandestinismo, travestido de "deformalização" dos negócios jurídicos, marotamente qualificada de burocracia dispensável. A Prodigalidade da viúva O Brasil dá-se ao luxo de consumir milhões de dólares desperdiçados na estupenda máquina de ineficiência e corrupção que se instalou no coração dos negócios públicos, ancorada na displicência e preconceito que cercam o registro público brasileiro. O desmonte dos registros de segurança jurídica é a falência do controle social em matéria em que sobeja o interesse público e de terceiros. O mais curioso e paradoxal disso tudo é que essa desvalia é apregoada pelos principalmente atores jurídicos e pela nomenklatura que aninha na medula do estado brasileiro. Não é à toa que, ao lado dos registros públicos mercantis brasileiros, vicejaram, ao longo dos anos, empresas privadas que exploram justamente a falta de segurança jurídica decorrente dos deficientes mecanismos de publicidade registral mercantil. São empresas de informação que lucram vultosas quantias mercadejando a informação que afinal vem a ser o elemento essencial e estruturante da publicidade registral. A vocação do contrato de gaveta é o conflito Assim como ocorre corriqueiramente com o registro público mercantil brasileiro, os registros imobiliários padecem do mesmo mal que acaba por vitimar os terceiros de boa-fé que celebram compromissos particulares clandestinos cujo potencial de litígios e conflitos não é percebido e enfrentado pelas autoridades brasileiras. Aqui também a sociedade brasileira consome enormes recursos e energia para resolver litígios, conflitos e embaraços legais que seriam facilmente evitados se o desaguadouro natural desses contratos fosse o notário e o registrador públicos. A vocação do contrato de gaveta é o conflito. Ainda agora esses pobres consumidores brasileiros, já suficientemente explorados pelas taxas escorchantes cobradas por empresas públicas e privadas para "formalizarem" seus contratos - valores superiores aos cobrados pelos notários, diga-se de passagem - vêm de ser notificados pelos agentes financeiros para arcar com o resíduo de saldos devedores por inobservância da regra legal proibitiva de aquisição de mais de um imóvel financiado pelo SFH. Quantos adquirentes não firmaram contratos particulares no âmbito do SFH, "orientados" e "aconselhados" por agentes administrativos, unicamente para a malsinada composição de renda para favorecer a aquisição de terceiro, normalmente um seu parente? Quantos adquirentes de imóveis não firmaram contratos particulares de gaveta unicamente para escapar da cupidez financeira que sempre anda de braços com a incompetência governamental na concepção do sistema e na administração do saldo devedor? Quantos consumidores não se viram estrangulados por cláusulas abusivas, impostas unilateralmente pelos fornecedores de bens imóveis, firmando contratos particulares eivados de nulidades? Até quando os profissionais do direito, e os responsáveis pela administração pública vão ignorar olimpicamente que a destruição do sistema registral brasileiro significa o débâcle do que se poderia chamar metaforicamente de sistema imunológico das relações jurídicas? (SJ)
Direitos
IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
Article Number
1692
Idioma
pt_BR