Notícia n. 1497 - Boletim Eletrônico IRIB / Março de 2000 / Nº 180 - 15/03/20
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
180
Date
2000Período
Março
Description
Ponto crítico I * Condomínio - alteração de convenção não registrada - Biasi Ruggiero* - Recentemente, comentei a crescente insegurança no exame de documentação imobiliária. Mais um perigo ronda o adquirente, desta vez de unidade condominial. Sempre se entendeu que a convenção é oponível a todos, desde que registrada no serviço imobiliário. È o que dispõe a lei ( art. 9, § 1º, da Lei nº 4.591/64 ). Se não estiver registrada, é oponível aos que dela participaram, no caso condôminos que, episodicamente, eram condôminos naquele momento da assembléia instituidora ou modificadora da convenção. Nos bons tempos, quem adquiria unidade autônoma ia ao registro de imóveis e examinava a convenção arquivada e suas eventuais alterações. Para esse adquirente, as resoluções não registradas eram consideradas "res inter alios", vale dizer, inoponíveis para quem, na época em que tomadas, não era condômino, mas terceiro estranho ao condomínio. Só aplicável a quem dela participara ou teve ciência inequívoca. E há alterações importantes que atingem cláusulas pétreas que, até por bom senso, dependem da totalidade de votos para sua aprovação, pois dizem respeito ao direito de propriedade. À guisa de exemplo, podemos lembrar: mudança de destinação, alteração da fachada, venda de área comum e, como no caso ora comentado, alteração do critério de participação no rateio das despesas. Entretanto, a c. 10ª Câmara do e. Segundo Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, adotando inovador conceito de "terceiro", eliminou a garantia que a lei quis dar aos adquirentes. Prolatou r. julgado, no sentido de que o adquirente, simplesmente por tornar-se condômino, não pode alegar sua condição de terceiro perante o condomínio e as alterações da convenção, ainda que não registradas na serventia competente, pois tem plena ciência da decisão assembleária... A questão estará bem posta, se a premissa (ciência inequívoca) estiver certa. Todavia, cuidando-se de adquirente que, na ocasião da mudança da regra convencional, nem imaginava que um dia seria participante desse condomínio será certo não considerá-lo terceiro? O condômino que não é terceiro é o que participou ou tomou conhecimento da alteração. Quem adquire posteriormente, a menos que se prove seu pleno conhecimento das novas regras, não pode ser surpreendido, como na hipótese, de alteração do sistema de rateio, passando a ser bem diferente do que consta da convenção. Aliás, essa alteração, que baliza o percentual das unidades no pagamento das despesas, dependendo do que vier a ser modificado, não pode ser alterada nem mesmo pela maioria, ainda que qualificada. E o r. julgado a que me refiro, Apelação nº 595025-0/6, subscreveu premissa parcialmente correta, mas, a meu ver, no caso enganosa, do recurso: "Os terceriros referidos na peça decisória (da oponibilidade "erga omnes"), cuja obrigatoriedade de observância decorre do efetivo registro da convenção no cartório imobiliário competente são: os locatários, os usurários, os visitantes, os ocupantes eventuais, mas nunca os próprios condôminos. Condôminos não são terceiros! Eles fazem parte de um todo que é o condomínio." E, assim, equiparou a situação jurídica do adquirente com a de mero visitante ou prestador de serviço como o entregador de pizza. Outra passagem surpreendente foi o v. acórdão considerar cartório imobiliário competente, para fins de oponibilidade perante terceiros, o Cartório de Registro de Títulos e Documentos... O pior é que essa respeitável, mas infeliz ementa poderá ser publicada e passará a ser aplicada pelos leguleios, provocando enorme prejuízos até que se restaure o até então pacífico entendimento. Portanto, quem quiser adquirir um apartamento deverá percorrer todos os cartórios de registro de títulos e documentos do Brasil para descobrir se não foi registrada alguma ata alterando, digamos de 3% para 30%, a participação do apartamento que pretende comprar. Ou, então, ler todos os livros de atas eventualmente encontráveis, a partir da instituição do condomínio. O comprador é submisso, apenas e tão-somente, aos atos formalmente perfeitos e, principalmente, alteração de convenção registrada no cartório imobiliário que não é o de Registro de Títulos e Documentos, mas o Serviço de Registro de Imóveis. Não se confunda a característica "propter rem", para os legítimos encargos da unidade, ainda que anteriores à venda. Mas a ata a que se refere a r. ementa está imperfeita, de validade "intra muros", limitada ao condômino do momento, não obriga o sucessor que não tinha como conhecê-la. Afinal, a finalidade do registro, no direito brasileiro, é a publicidade. Sem registro não houve publicidade. O adquirente, que entrou na relação condominial após a secreta alteração, não poderia ter sido atingido por ela. "Data maxima venia", a e. Câmara foi seduzida por um sofisma. __________________ * Advogado em São Paulo, Capital. O texto foi originalmente publicado na Tribuna do Direito, nov. 99, p.2. O Dr. Biasi Ruggiero é renomado estudioso de direito imobiliário no Brasil e foi contatado pela editoria deste Boletim Eletrônico para aprofundar o tema exposto no artigo supra. Lamentavelmente fomos informados que o ilustre causídico acha-se em coma profundo, decorrente de acidente vascular. Rendemos aqui nossas homenagens ao grande estudioso, augurando pronto restabelecimento. (NE)
Direitos
IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
Article Number
1497
Idioma
pt_BR