Notícia n. 1080 - Boletim Eletrônico IRIB / Outubro de 1999 / Nº 137 - 19/10/1999
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
137
Date
1999Período
Outubro
Description
REVISÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL. PRÁTICA DE PREÇO EXCESSIVO. - Recurso Especial interposto pela CEF com fulcro no art. 105, III, "a", da Carta Magna, contra v. Acórdão oriundo do Egrégio TRF da 5ª Região, da lavra do eminente Juiz Francisco Geraldo Apoliano Dias, que determinou a revisão de cláusula contratual para que seja reduzido o valor do imóvel, adquirido pela parte recorrida por ter havido prática de preço excessivo. No presente feito ajuizou-se Ação Ordinária com o fito de anular Contrato de Compra e Venda de Mútuo com Obrigações e Quitação Parcial e conseqüente nulificação dos ajustes de compra e venda e mútuo nele constantes de forma incorreta, para que os autores, retornando ao status quo ante, pudessem restabelecer o vínculo contratual conforme o avençado, negócio esse que envolveu o empreendimento "Parque dos Coqueiros". Alega-se que a v. decisão arestada violou os arts. 94, 147, II, e 158, do Código Civil, 128, 165, 333, I, 436 e 458 II, da CPC, negou vigência aos arts. 16, 17 e 21, da Lei n° 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos), assim como também contrariedade ao art. 5°, LV, e 93, IX, da CF/88. Relatados, decido. O apelo excepcional em exame não merece seguimento, haja vista ser manifesta a impossibilidade de sua apreciação, por ausência de prequestionamento. "A priori", descarto a análise com relação à contrariedade dos dispositivos constitucionais indicados, visto que ao Colendo STF compete tal apreciação. Examino os demais preceitos infraconstitucionais tidos por afrontados. No tocante ao prequestionamento, considere-se que os arts. 94, 128, 333, I, e 535, do CPC, como também a negativa de vigência à Lei n° 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos), não foram abordados, como suporte da decisão, em nenhum momento, no âmbito do voto condutor do aresto hostilizado. Não obstante a oposição de embargos de declaração para tal fim, não logrou êxito a recorrente. Confira-se o afirmado com a tese esposada no voto condutor e nos embargos declaratórios: Voto-Condutor: "Quanto ao mérito, data vênia, não merecem prevalecer os argumentos expendidos pela CEF.O exame percuciente dos autos revela a forma como agiram as Apelantes ao longo de toda a evolução do negócio jurídico que envolveu o empreendimento 'Parque dos Coqueiros' senão vejamos: A CEF concedeu empréstimo à Construtora para fins de construção de unidades habitacionais no empreendimento citado, cujo projeto inicial, embora pertencesse à COHAB, não pode por esta ser executado face a sua inadimplência perante o FGTS. Coube, à COHAB, prestar serviços de assessoria técnica, cadastrando os pretendentes e fiscalizando o andamento da obra. Informa a auditoria feita pelo MBES (Ministério do Bem Estar Social), que o custo inicial para a construção de cada unidade estava previsto em 1.265 UPF (Unidade Padrão de Financiamento), valor 41 % superior ao orçado para o empreendimento '30 de Setembro', em tudo semelhante ao Conjunto 'Parque dos Coqueiros'. Não obstante este fato, a CEF procedeu, à revelia dos Apelados, um realinhamento de preços da ordem de 47% e repassou o índice de 84.32% relativo à inflação (IPC de março de 1990) ao valor do financiamento, embora os salários dos trabalhadores estivessem congelados. Ora, não há como justificar este procedimento uma vez que o instrumento contratual impugnado prevê a UPF ( Unidade Padrão de Financiamento), como índice de correção monetária a ser aplicado no caso de variação dos preços alusivos à construção civil. Desnecessário dizer que estes aumentos oneraram sobremaneira o valor do imóvel, inviabilizando o pagamento das prestações (muito elevadas e incompatíveis com as condições econômicas dos mutuários). Aqueles (os mutuários), bem se vê, ao assinarem o contrato, já o fizeram na condição de inadimplentes, pois desconheciam o aditamento mercê do qual se procedeu o realinhamento de preços. O pior é que a Construtora não logrou desincumbir-se da execução da infra-estrutura tal como acertado na avença, embora tenha recebido da CEF, o repasse dos recursos financeiros solicitados. Face a essas constatações, é patente a inconsistência da argumentação desenvolvida pelas Apelantes, e o prejuízo sofrido pelos Apelados à conta do negócio jurídico que celebraram, impondo-se, por isso, a revisão das cláusulas contratuais inaceitáveis. Por pertinente recolho trechos da R. sentença transcrita nos autos da AC n° 112607-RN (Reg. 97.05.07615-4), a qual se amolda ao presente caso, 'verbis': "A cláusula de contrato de mútuo, portanto, que fixa o valor do imóvel adquirido pela parte autora em quantia sobremaneira elevada, apresenta vício, sendo de mister a sua redução. Penso que, nessa hipótese, aplica-se o princípio da lesão parcial do contrato, atingindo, tão somente, a cláusula que apresenta vício. Isso porque embora a parte autora não tenha sido compelida, compulsoriamente, à assinatura do contrato de mútuo, em virtude de o preço da unidade habitacional ter sido fixado com valor bastante superior ao devido, tem-se por viciada a relação obrigacional. A teoria da lesão do contrato, que lega o vício da vontade nada obstante ela tenha sido manifestada sem coação, tem aplicação quando uma das partes é levada à realização de avença que lhe seja excessivamente desfavorável, máxime quando se cuida, como no caso em apreciação, de contrato de adesão, em que o preço do financiamento é determinado unilateralmente por uma das partes, que é quem providencia o levantamento dos custos referentes à edificação da obra." Como bem destacou o insigne juiz monocrático, demonstra-se viciada a cláusula do contrato de mútuo que fixa o preço do imóvel em valor excessivamente elevado, impondo-se a sua redução, pois não é justo que os mutuários suportem o repasse dos valores fixados (aos do Agente Financeiro e da Construtora), máxime porque se cuida de financiamento para população de baixa renda. Outrossim, não existe a menor possibilidade jurídica de convalidação do dispositivo contratual que determina a retroação dos efeitos do contrato a outubro de 1991, obrigando unilateralmente o mutuário a assumir obrigações pretéritas, e que não lhe dizem respeito. O contrato de financiamento de imóvel, pactuado sob os influxos das normas que regulam o Sistema Financeiro da Habitação, deve reger, prospectivamente (vale dizer, para o futuro), as obrigações das partes assim, é mister a anulação de cláusula retroativa ali inserta, sem o que ocorrerá, inevitavelmente, locupletamento ilícito em desfavor do mutuário. Com fundamento nas razões acima expendidas, nego provimento à Apelação da CEF." Voto dos embargos de declaração: "Data vênia, não vejo como prosperar as afirmativas da CEF. A alegação de não apreciação da 'questão federal', relativa à aplicabilidade dos dispositivos de lei federal invocados na defesa da CEF (o artigo 94 do Código Civil, o artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil, e os artigos 16, 17 e 21 da Lei n° 6.015 de 1973), não merece acolhida: O não acatamento das argumentações contidas no recurso não importa em omissão, posto que ao julgador toca apreciar o tema de acordo com o que reputar atinente à lide. Inexiste norma legal que impeça o juiz de proferir sua decisão, tomando por base a fundamentação de outro julgado tampouco é defeso que o Juízo deixe de referendar, no todo ou em parte, os fundamentos da decisão monocrática proferida no feito que esteja a analisar vale o mesmo em relação à Doutrina ou à Jurisprudência colacionada pelas partes em suas manifestações. Destarte, não está o juiz obrigado a julgar a questão posta, de acordo com o pleiteado pelas partes, mas sim com o seu livre convencimento (artigo 131, do CPC) para tanto, vale-se do exame dos fatos e dos aspectos pertinentes ao tema, das provas produzidas, e da Doutrina e da Jurisprudência que reputar aplicáveis ao caso concreto. Deveras, é essa a verdadeira pretensão da Embargante: que a matéria, pelo mérito, seja examinada ('... que essa Egrégia Corte se pronuncie sobre a matéria ... em função da necessidade do devido prequestionamento para fins de Recurso'). Rogo vênia, para consignar que este Tribunal não pode, nas vias estreitas dos Embargos de Declaração, rever ou reconsiderar a decisão proferida, o que seria da competência dos colendos Supremo Tribunal Federal ou Superior Tribunal de Justiça, por meio, respectivamente, dos Recursos Extraordinário ou Especial. Penso que se pretende a obtenção de efeitos infringentes para os Embargos insiste-se, repriso, em um novo julgamento da causa, o que não se comporta em sede de Embargos de Declaração. Forte nessas razões, nego provimento aos Embargos Declaratórios." Este Colendo Superior Tribunal de Justiça já se posicionou nessa linha: "Incidindo, na espécie, o óbice relativo ao prequestionamento dos dispositivos legais tidos como violados, mesmo que tal afronta se dê no próprio acórdão, devem ser opostos embargos de declaração, para suprir a referida exigência" (STJ - 1ª Turma, Ag. 7.239-RJ AgRg. Rel. Min. José de Jesus Filho, j. 17.04.91, DJU de 06.05.91, p. 5.645). (Recurso Especial nº 216.869/RN DOU 26/8/99 pg. 217)
Direitos
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1080
Idioma
pt_BR