Notícia n. 1031 - Boletim Eletrônico IRIB / Setembro de 1999 / Nº 130 - 28/09/1999
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
130
Date
1999Período
Setembro
Description
Autoridades do Judiciário, Executivo e Legislativo prestigiam abertura doRESPONSABILIDADE CIVIL E APOSENTADORIA COMPULSÓRIA EM DEBATE romeu felipe bacellar - Convidado a falar sobre a responsabilidade civil do notário e do registrador, o Prof. Romeu Felipe Bacellar Filho, Doutor em Direito Administrativo pela Universidade Federal do Paraná, abriu a terça-feira de trabalhos no XXVI Encontro dos Oficiais de Registro de Imóveis do Brasil. O Professor refez e ampliou as colocações apresentadas no Encontro Regional de Londrina (Boletim do Irib 264, maio/99). Segundo ele, os Tribunais Superiores são coerentes quando responsabilizam o Estado pelo dano causado pelo notário/registrador depois de defini-los como funcionários públicos e aposentá-los compulsoriamente. O professor discorda das duas coisas, aposentadoria compulsória para notários e registradores e responsabilização do Estado quando se fala em agentes delegados agindo por sua própria conta e risco. Sua palestra suscitou grande interesse e o Boletim do IRIB vai publicá-la na edição de setembro. Veja a seguir, algumas das questões dirigidas ao professor no debate que se seguiu à palestra. P - Maiores esclarecimentos sobre a defesa do notário/registrador no que se refere à culpa exclusiva da vítima, força maior e caso fortuito. R - Um aspecto fundamental diz respeito à caracterização do dano a ser indenizado, que tem que ser anormal, especial e ofensivo ao direito ou interesse legitimamente protegido. Isso é imprescindível. Não existe direito em relação a interesses que não são legitimamente protegidos. Por exemplo, um cartório de Títulos e Documentos, registra uma "sociedade de incentivo ao consumo da droga". Posteriormente esse ato é anulado e a sociedade diz que deixou de funcionar e teve prejuízos em função disso. Esse não é um dano indenizável porque não diz respeito a um bem ou interesse legitimamente protegido. O dano normal, causado a toda a comunidade de uma forma geral (por exemplo, as limitações administrativas ao direito de construir), também não é indenizável pelo Poder Público uma vez que não é específico para uma propriedade. Não é um dano anormal porque ocorre normalmente em função do atendimento ao interesse público. Esse tipo de dano não pode ser indenizado. No caso dos notários e registradores terá que haver uma avaliação séria do dano a ser indenizado. Na maior parte dos casos, quem se diz vítima contribui por ação ou por omissão para a configuração do evento lesivo. A defesa está justamente aí, se o registrador não pode dizer que não agiu com dolo ou culpa, ele pode dizer que quem agiu com dolo ou com culpa foi a vítima. Eventos de força maior, de caso fortuito, como uma inundação no cartório, que causem danos irreparáveis também podem servir de excludentes pelo princípio da razoabilidade (CF). E assim por diante: sempre haverá uma defesa. Claro que a situação aparentemente mais cômoda é a da responsabilização subjetiva. Mas mesmo em sede de responsabilização subjetiva, o Poder Público se subroga de direitos para depois ir em cima do notário e do registrador. P - Uma vez perpetrada contra o titular a ação de reparação por dano causado a terceiro, por ato de preposto., do titular para com este, quebra-se o vínculo da confiabilidade. Neste caso, o fastamento do preposto de suas funções a quem compete: ao titular ou à autoridade julgadora? R - Se o preposto causa dano e é imediatamente afastado, essa é uma atitude pouco recomendável, porque já parece configurado o reconhecimento explícito de que ele deixou de merecer a confiança do registrador por alguma razão que possa ser fundada em dolo ou culpa em sua atividade. Mas penso que, se o ato de designação é do titular do Ofício, o ato de desligamento também é. Até porque existem muitas implicações que são estranhas à atividade do Corregedor ou da Corregedoria como, por exemplo, a relação empregatícia. Quem vai responder na Justiça do Trabalho e, portanto, tem que tomar certas cautelas é o registrador. Acho que há muito apego ao regime anterior. Não estou pregando aqui uma carta de alforria para notários e registradores, toda atividade pública tem que ter a necessária fiscalização. Mas ela tem que acontecer nos exatos limites do razoável. Se houve uma ruptura do sistema anterior e a idéia da delegação está presente, então nós passamos a viver uma nova fase. Parece que essas amarras com o sistema anterior têm complicado um pouco a situação, levando a absurdos. P - Como justificar que a pena de suspensão possa ser fixada em até 90 dias, prorrogável por mais 30 dias? A pena não deve ser aplicada de forma definitiva? Como se justifica a possibilidade de sua prorrogação? R - A lei errou. Na verdade, aqui não seria uma pena de suspensão mas um afastamento temporário. Até no processo disciplinar há uma falha. Primeiro deveria haver uma sindicância para que não se submeta à execração pública o nome do registrador. À comissão de sindicância caberá responder a duas indagações: se o fato é irregular ou não e, caso seja, se há presunção de autoria. Se houver presunção de autoria, instaure-se o processo administrativo contra o servidor, mas aí já é outra etapa. Então, da sindicância não pode resultar pena. As penas têm que ser proporcionais à gravidade da falta. Lei de suspensão por 90 dias e prorrogação por mais 30 é um absurdo. Não se trata de pena, é um afastamento preventivo para evitar que o titular prejudique o andamento das investigações. Uma vez desconstituída a acusação, a pessoa absolvida tem direito a uma recomposição dos valores que perdeu. A lei é pouco elucidativa a esse respeito. E quem ficou respondendo pelo cartório tem que ser pago pelo Poder Público que instalou o processo. Essa é a minha opinião. P - Para que serve o substituto se, em caso de afastamento, ele jmais substitui o titular, sendo que a CGJ nomeia sempre um interventor? R - É aquela amarra, ainda, ao sistema anterior. Na realidade, a Lei 8.935/94 não tem sido concretizada por inteiro. Eu costumo dizer que, no que prejudica, ela tem sido aplicada rapidamente, mas no que beneficia não. Aí criam-se obstáculos, a controvérsia surge, volta-se àquela velha concepção do notário/registrador como funcionário público. E nós estamos enfrentando vários problemas a esse propósito. É claro que o substituto existe pra substituir. E se não há nada que se possa alegar quanto à honorabilidade e aptidão do substituto, ele é o substituto natural e não um estranho que vai ficar apenas três ou quatro meses no cartório. O substituo existe para substituir, acho que essa é uma amarra inexplicável em relação ao sistema anterior. P - Qual a sua opinião sobre a responsabilidade civil objetiva e aposentadoria compulsória? R- Eu penso que a CF, (art. 236, combinado com o art. 175 e art. 37, parágrafo sexto) e o art. 22 da Lei 8.935/94 inegavelmente impõem uma lei objetiva a notários e registradores. Hoje, no Brasil, a responsabilidade objetiva está pegando até irresponsavelmente. Mas, no caso dos notários e registradores me parece que é uma interpretação coerente com a idéia da delegação. Quanto à aposentadoria compulsória, com todo o respeito que tenho pelo STF, acho que é uma decisão política, uma vez que o não reconhecimento da aposentadoria compulsória podia incorrer na idéia de perpetuidade. Mas é assim mesmo. O objetico da CF foi exatamente esse: estabelecer uma delegação vitalícia, embora não diga expressamente. E penso mais, não só em relação a notários e registradores. Se o serviço está funcionando bem, está sendo prestado a contento, não há nenhuma razão para que o Poder Público interfira. Se a prestação de serviço é adequada, para que mudar? Não há razão. Principalmente porque a confiança é a marca registrada do notário/registrador. O principal é não descurar de que houve uma mudança radical e essa mudança tem que ser aceita doa a quem doer. A CF é claríssima. A Lei 8.935 também é clara no sentido de que o notário/registrador não deve ser submetido á aposentadoria compulsória. A decisão do Supremo Tribunal Federal, aqui, foi muito mais política do que jurídica.
Direitos
IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
Article Number
1031
Idioma
pt_BR