Notícia n. 5835 - Boletim Eletrônico IRIB / Abril de 2004 / Nº 1103 - 19/04/2004
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
1103
Date
2004Período
Abril
Description
HOJE EM DIA – 3/4/2004 - Novo Código Civil afeta compra de imóvel - Kênio de Souza Pereira* Kênio de Souza Pereira é diretor da Caixa Imobiliária, advogado especializado em Direito Imobiliário, representante em Belo Horizonte da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário (Abami). Tel. (031) 3225-5599* As transações cotidianas que envolvem os maiores valores financeiros do mundo são as imobiliárias. As pessoas, quando vendem ou compram imóveis, o fazem geralmente uma ou duas vezes na vida. Mas é incrível que, com tão pouca experiência, tais pessoas se julguem verdadeiros especialistas no assunto e passam a negociar a mercadoria mais cara do planeta como se fossem comprar ou vender um eletrodoméstico. Ignoram, sistematicamente, a complexidade do ramo imobiliário, a necessidade de profunda pesquisa sobre a documentação do imóvel, sua construção, se há impedimentos, a legitimidade de quem se apresenta como proprietário, sua situação conjugal e creditícia, se há ações judiciais que possam repercutir na transação, e especialmente a elaboração do Contrato de compra e venda. Até mesmo na escolha do imóvel que será comprado, há descuido quanto às suas dimensões, seu acabamento, estrutura, regularização da obra ou garagem, já que quase ninguém vê a Convenção do Condomínio, que estabelece os direitos e deveres de quem adquire uma unidade condominial. O novo Código Civil (CC) motiva a mudança das convenções feitas antes de 2003, já que mais de 70% delas estão repletas de erros, pois foram copiadas de outros edifícios que possuem características construtivas e de ocupação diferentes. O Contrato de compra e venda constitui o principal elemento de segurança para o comprador e o vendedor, sendo lógico que os interesses são diferentes. É nele que todos os objetivos devem ser inseridos e as dúvidas eliminadas, após a devida análise de tudo que poderá ocorrer. Mas, infelizmente, constata-se, no fechamento da compra de imóveis, um amadorismo e falta de reflexão impressionantes. O comprador e o vendedor deixam a cargo de um leigo a elaboração de um contrato que envolve, muitas vezes, a poupança de uma vida de trabalho ou até mesmo milhões de reais. Pior: na maioria das vezes, quem elabora o contrato tem interesse direto no fechamento, desconhece os diversos dispositivos legais que regulam a matéria, bem como a técnica da redação jurídica e, especialmente, a forma de julgar e compreender do Poder Judiciário, já que, no caso de litígio, caberá ao juiz interpretar o "esboço de contrato", geralmente copiado e remendado de vários outros modelos. Quando o pagamento é parcelado ou através de financiamento bancário, ocorrem omissões que acabam gerando problemas, prejuízos e até rescisão com multa, que seria perfeitamente evitável. Muitas vezes, a rescisão torna-se um martírio, pois, apesar da boa-fé das partes, ocorrem problemas intransponíveis quando o vendedor crédulo gasta o dinheiro recebido a título de sinal, inviabilizando assim a devolução do mesmo. O novo Código Civil inovou em vários aspectos. Consagra a função social do contrato no artigo 1.228 que, interpretado, conduz à idéia de que, toda vez que uma compra e venda for feita, as partes devem atentar para o fim social e econômico da coisa, a finalidade lícita do negócio, sob pena de o Estado intervir de forma contundente, caso seja acionado. A ética e a boa fé devem ser a base dos contratos, não se admitindo cláusulas ambíguas e obscuras. Este tipo de contrato deve ser comutativo, ou seja, tem que haver correlatividade. O vendedor deve vender pelo valor justo e o comprador pagar o que vale, sendo, portanto, arriscado fazer a compra por preço simbólico, pois tal transação poderá ser anulada judicialmente. Antes, o antigo artigo 859 falava que o registro gerava a presunção da propriedade, mas hoje o artigo 1.245 do novo CC é mais incisivo ao estipular: "Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis". Quanto à posse do imóvel, os contratos de compra e venda são uma lástima. Os "copiadores" de contratos de compra e venda inventaram o termo "posse precária”, esquecendo-se de que a posse gera direitos e obrigações, inclusive o direito de indenização no caso de rescisão, gerando assim grandes confusões e prejuízos. Nos termos do artigo 1.204 "adquire-se a posse desde o momento que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade”. O novo CC consagrou a força do contrato particular de compra e venda, que deixa de estipular a possibilidade de o vendedor arrepender-se. Não sendo previsto o direito de arrependimento, o comprador adquire o direito real à aquisição do imóvel, mesmo que o vendedor se recuse a receber as parcelas restantes do preço ou não assine a escritura. A regra do mercado consiste no seguinte: as partes dispensam qualquer consultoria jurídica especializada, ignoram todos os riscos e dúvidas, e incumbem um leigo da função de redigir o contrato de compra e venda. Interessante seria o corretor de imóveis, que só ganha sua comissão se o negócio for fechado, tomar a iniciativa de levantar dezenas de dúvidas que poderão desestimular a sua efetivação. Obviamente, o corretor cumpre com competência sua função de aproximar as partes, de promover a venda, eliminando os pontos de divergência, não sendo sua função trabalhar contra o seu interesse ou assumir a função de advogado de uma das partes. Qualquer contrato bem elaborado, especiaImente um que envolva grandes quantias, tem sua importância realmente reconhecida no momento do conflito, para dirimir a dúvida que deveria ser prevista de forma profissional, no momento de sua elaboração. (Hoje em Dia/MG, Seção: Kênio de Souza Pereira, 3/4/2004, p.1).
Direitos
IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
Article Number
5835
Idioma
pt_BR