Notícia n. 5076 - Boletim Eletrônico IRIB / Outubro de 2003 / Nº 861 - 07/10/2003
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
861
Date
2003Período
Outubro
Description
A atividade notarial e de registro no Estado de Direito - Romeu Felipe Bacellar Filho* - O debate que questiona a Iegitimidade dos cartórios (expressão utilizada em homenagem à tradição) causa preocupação a todos que prezam a ordem jurídica. Sem dúvida, as funções atribuídas aos notários e registradores correspondem às conveniências básicas da sociedade, garantindo publicidade, autenticidade, segurança e eficácia aos atos e negócios jurídicos. Além disso, muitos dos atos praticados pelos cartórios constituem condição sine qua non para o exercício de direitos fundamentais. São exemplos disso o registro de nascimento, casamento e óbito, a constituição de pessoas jurídicas, o registro de imóveis, o registro de protesto de documentos de dívida, as escrituras públicas e os a testamentos. Assim exposto, fica claro que tais serviços são essenciais para os objetivos fundamentais do Estado, caracterizando-se como serviço público. Por isso mesmo a Constituição atribui sua titularidade ao Poder Público. Mas, ao mesmo tempo, a carta estabelece no artigo 236 que tal atividade seja exercida em caráter privado, mediante delegação, reconhecendo, desde logo, que a administração pública brasileira não reúne condições estruturais para a devida prestação destes serviços. Neste momento em que o Estado brasileiro está sendo redesenhado e seu papel social redefinido, a meta é oferecer aos cidadãos um modelo de administração pautado na qualidade e eficiência dos serviços públicos. Essa atuação, orientada para o cidadão usuário, passa por diversas políticas, entre elas a diminuição do aparelho estatal mediante parceria com os particulares. Nessas atividades que permitem outorga ou delegação, o Estado passa a ter funções eminentemente regulatórias e fiscalizadoras. Assim, pode-se dizer que o artigo 236 permitiu a dinamização e qualificação dos serviços dos cartórios, bem como a modernização é o melhor aparelhamento dos mesmos. Pode-se citar, só como exemplo, o "Projeto 2005”, que inclui a criação de banco de dados de abrangência nacional, a certificação digital, a criação de novos cursos de reciclagem e atualização, entre outras metas. Tudo visando a melhora dos serviços e um atendimento mais eficiente ao cidadão. Da mesma forma tratou-se o acesso às funções de notários e registradores. O concurso público não só é democrático, garantindo moralidade e impessoalidade na atividade administrativa, mas também é a maneira mais eficaz de seleção de pessoal técnico e especializado para o desempenho de funções públicas. Outro ponto de freqüente debate é a discussão em torno da remuneração de tais serviços. Como são operados por particulares, é natural que para os serviços dos cartórios sejam cobradas taxas de quem deles precisa. Mas vale lembrar que não são os notários e registradores que determinam os valores dessas taxas, ao contrário, o valor cobrado obedece normas fixadas por lei federal. Ou seja, apesar do serviço dos cartórios ter caráter privado, não atende a uma regra básica da economia privada: a livre fixação de preços. Ademais, o regime cartorial adotado pelo Brasil enquadra-se no sistema de tipo Iatino, existente nos países do Mercosul, em todas os países da União Européia e nos países do Leste Europeu. Num contexto de economia globalizada, em que a inserção no comércio internacional e a conquista de mercados consumidores estrangeiros é condição fundamental para o crescimento da economia, não parece prudente modificar uma estrutura de serviços compatível com os padrões internacionais. Isso sem falar em toda a legislação infraconstitucional brasileira. Neste contexto, pode-se depreender que uma alteração na forma de prestação dos serviços notariais e de registro, passando alguma de suas funções para o Estado, acarretaria um verdadeiro retrocesso em relação à Constituição de 1988, afetando não só a qualidade e eficiência na prestação de serviços, mas também representando um ônus extra para o aparelho estatal. É crucial observar que o regime privado para a prestação dos serviços atribuídos aos tabeliães de notas e oficiais de registro permite desonerar o Estado das custas com a prestação de tais serviços, tornando com isso possível o redirecionamento de recursos para as políticas públicas de cunho social, tão prementes no País, principalmente nos setores de prestação de serviços básicos, como saúde, educação e moradia. De igual modo, a responsabilidade civil por danos verificados no exercício dessa atividade é direta e pessoal do agente delegado desobrigando o Estado de qualquer atuação neste sentido. A sistemática hoje adotada no Brasil é a que melhor atende os interesses da coletividade. (Tribuna do Direito, SP, setembro/2003, p.16) * Romeu Felipe Bacellar Filho é doutor em Direito do Estado e professor da Faculdade de Direito da universidade federal do Paraná e da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
Direitos
IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
Article Number
5076
Idioma
pt_BR