Notícia n. 5678 - Boletim Eletrônico IRIB / Março de 2004 / Nº 1056 - 18/03/2004
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
1056
Date
2004Período
Março
Description
VALOR – 8/3/2004 - Europeus vão cada vez mais à Justiça; sindicatos buscam ações coletivas - Charles Fleming Dow Jones Newswires, de Paris No escritório enfumaçado de um sindicato nos arredores de Paris, entre posters de Lênin e Che Guevara, François Desanti está pronto para recorrer a táticas revolucionárias. "Não temos escrúpulos com o fim justificando os meios”, diz esse sindicalista trotskista, de 38 anos. Desanti, porém, não está pregando usar coquetéis Molotov. Ele se refere a processos. Sob orientação de seu sindicato e outros grupos, cerca de 1.500 desempregados franceses lançaram este mês ações coordenadas contra uma agência do governo, alegando quebra de contrato depois que seus auxílios-desemprego foram cortados em janeiro. Esses casos terão audição em tribunais de toda a França nos próximos meses. Ações legais em massa representam uma revolução tática dos sindicatos trabalhistas europeus, como a Confederação Geral do Trabalho (CGT) de Desanti, que estão mais acostumados a buscar mudanças por meio de passeatas e greves. Um ataque legal coordenado é o mais perto que a França e a maior parte da Europa podem chegar das ações coletivas ao estilo americano, que não são permitidas pelas leis francesas. A briga legal da CGT reforça o temor de muitos poderes empresariais de que a Europa esteja seguindo os EUA, tornando-se cada vez mais litigiosa. Um número crescente de processos que buscam compensações vêm sendo classificados publicamente como "compo culture" na Irlanda, ou "aposta por dinheiro" no Reino Unido. Agora, em alguns países da Europa continental, mudanças legais e regulatórias estão encorajando as pessoas a buscar reparação nos tribunais. A tendência tem sido estimulada por advogados cada vez mais agressivos e exemplos bem documentados de acordos de milhões de dólares obtidos nos EUA. "Existe sem dúvida um maior desejo de recorrer aos tribunais, até mesmo em países sem uma tradição litigiosa, como a França e a Espanha", diz Paul Bowden, um advogado do escritório Freshfields Bruckhaus Deringer, de Londres. As empresas de seguros são as que mais devem perder com essa tendência. Executivos do setor – ainda sangrando com a perda de bilhões de dólares em processos movidos por pessoas contaminadas por amianto nos EUA - dizem que isso é o pior que poderia ocorrer. "O maior risco emergente para os grupos seguradores mundiais é a proliferação do sistema americano ou de elementos dele”, diz o principal diretor de risco da Allianz, Raj Singh. Embora uma série de elementos cruciais do sistema americano – como as ações coletivas – não estejam disponíveis em muitos lugares, é apenas uma questão de tempo até que advogados e ativistas que defendem o consumidor encontrem meios de contornar o problema, afirmam executivos do setor de seguros. A campanha de Desanti é um exemplo. A França, assim como outros países europeus, proíbe ações coletivas. Nesses processos, muitos demandantes unem forças num único caso; isso permite às pessoas cujas ações individuais são pequenas economizar com custos legais, além de aumentar as chances dos acusados se depararem com grandes perdas financeiras. No entanto, mudanças recentes no Reino Unido, Espanha, Suécia e Noruega abriram caminho para que grupos entrem com processos similares (mas não idênticos) às ações coletivas americanas. E uma abordagem coordenada, como a de Desanti, pode obter quase o mesmo resultado. Peter Levene, que chefia o mercado segurador do Lloyd's de Londres, estima que o custo anual dos litígios para o setor de seguros britânico seja de 10 bilhões de libras (US$ 18,6 bilhões), e que cresce 15% ao ano. "Há a preocupação de que esta doença esteja se espalhando para o resto da Europa." Advogados sugerem que a tendência resulta de uma ampla mudança política na Europa: a redução do generoso Estado do bem-estar social no final do século XX. Bowden vê na decisão da Espanha, há dois anos, de permitir um tipo de ação coletiva, como exemplo da "forte tendência liberalizadora na Europa", desencadeada por governos que estão transferindo a responsabilidade de pagamentos como a aposentadoria. Gerard Boulanger, advogado de Bordeaux que trabalha com Desanti e a CGT, diz que a tendência das ações está ganhando força em parte porque os trabalhadores estão desiludidos com as táticas tradicionais dos sindicatos. "As pessoas estão vendo que ir às ruas ou entrar em greve têm seus limites em termos de eficácia", justifica. Dominique Probiere, uma das pessoas que está processando a agência de desemprego do governo francês, conhecida como Unedic, diz estar mais motivado pela necessidade do que por sonhos de uma sorte inesperada. Pelo sistema social da França, esse homem de 40 anos e pai de dois filhos qualificou-se para receber os benefícios de 2.700 euros (US$ 3.379) por mês - um pouco mais do que metade de seu salário - por dois anos e meio. Mas há pouco descobriu que, devido à reforma na Unedic, perderia seu benefício sete meses antes do que imaginava. "É uma quebra unilateral de contrato." Para a Unedic, as ações são infundadas. "A lei obriga a Unedic a manter um equilíbrio financeiro, e em nenhum momento nenhum desempregado assina um contrato com a Unedic, apenas um pedido de benefícios", rebate Denis Maillard, porta-voz da agência. O caso ilustra o litígio crescente, mas mostra a grande diferença que ainda diferencia os sistemas legais da Europa do dos EUA. A reparação de, danos buscada nas cortes européias continua diminuta em comparação às decisões punitivas de muitos milhões de dólares vistas com freqüência nos EUA. No caso dos desempregados franceses, eles estão exigindo não mais do que 4.500 euros cada. Uma segunda grande diferença: em nenhum lugar da Europa advogados podem operar com base em comissões de contingenciamento, o sistema pelo qual os advogados são pagos apenas se forem bem sucedidos e recebem uma porcentagem sobre a compensação paga. Além disso, no Reino Unido e Irlanda, o lado que perde a causa acaba bancando as despesas legais do oponente, risco que evita que muitos processos especulativos e frívolos cheguem aos tribunais. (Valor/SP, Seção: Internacional, 8/3/2003, p.A9).
Direitos
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Article Number
5678
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