Notícia n. 5591 - Boletim Eletrônico IRIB / Março de 2004 / Nº 1039 - 02/03/2004
Tipo de publicação
Notícia
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Edição
1039
Date
2004Período
Março
Description
Penhora. Alienação. Ausência de registro. Terceiro de boa-fé. Fraude à execução não caracterizada. - Sérgio Jacomino, seleção e verbetação. Decisão. Processual civil. Execução fiscal. Embargos de terceiro. Penhora. Imóvel. Ausência de registro da constrição. Fraude à execução. Inocorrência. 1. Não há que se falar em fraude à execução se à época da alienação do bem não havia o respectivo registro da penhora, fato que infirmaria a presunção de boa-fé do terceiro adquirente. Precedentes. 2. Ressalva do ponto de vista do Relator que, à luz do artigo 263 do CPC, entende perpetrada a fraude por parte do executado desde que proposta a ação. Destarte, a fraude à execução independe do elemento subjetivo, posto opera-se in re ipsa. 3. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (CPC, art. 544, § 2o). Vistos. Trata-se de agravo de instrumento interposto pela Fazenda do Estado de São Paulo com fulcro no artigo 544 do CPC visando reformar decisão que negou seguimento a recurso especial sob o fundamento de que não houve prequestionamento explícito. Presentes as peças essenciais e preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade do recurso, impõe-se a análise de seu mérito. Consta dos autos que Á.S., ora agravado, opôs embargos à execução fiscal movida pela Fazenda do Estado de São Paulo em face de P.R.F., pugnando pela desconstituição da penhora recaída sobre imóvel que lhe havia sido vendido pelo executado, sustentando que o executado não fora citado e que alienara o imóvel mediante compromisso particular de compra e venda, datado de 27/2/93, para A.G.A., tendo a escritura definitiva sido lavrada em 29/10/93.O pedido foi julgado improcedente em primeiro grau, tendo a sentença sido reformada pelo acórdão recorrido, consoante se depreende da leitura da ementa abaixo transcrita: “A penhora de bem imóvel não registrada na matrícula imobiliária, mostra-se ineficaz com relação a terceiro. Por consequência, para que se configure a fraude à execução, é necessário que a Fazenda comprove que o adquirente tinha plena consciência da constrição e, mesmo assim, adquiriu o bem." Irresignada, a Fazenda do Estado de São Paulo interpôs recurso especial, com fulcro na alínea "a" do permissivo constitucional, sustentando violação do artigo 185 do CTN, porquanto ao entender necessário o registro da penhora do bem imóvel na matrícula imobiliária para a caracterização da fraude à execução, o Tribunal a quo teria negado vigência ao artigo 185, do CTN. Contra-razões ao recurso especial apresentadas pelo ora agravado sustentando a manutenção do acórdão recorrido às fls. 39/40. Contraminuta ao agravo de instrumento pugnando a manutenção da decisão agravada às fls. 48/49. É o relatório. Decido. Preliminarmente, a matéria federal apontada encontra-se devidamente prequestionada, viabilizando, assim, o conhecimento do apelo. Contudo, o presente agravo de instrumento não merece prosperar. A recorrente aponta ofensa ao seguinte artigo do Código Tributário Nacional: "Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens, ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa em fase de execução." O dispositivo legal acima transcrito deixa claro que a presunção de fraude incide apenas quando o débito esteja "em fase de execução”. Destarte, a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de afastar a caracterização da fraude à execução quando na época da alienação do bem não havia o respectivo registro da penhora, fato que geraria a presunção de boa-fé do terceiro adquirente. Neste sentido, os seguintes precedentes: "Processual civil. Fraude à execução. Alienação na pendência de ação de conhecimento. CPC, Artigo 593, II. Inexistência de inscrição da penhora. Boa-fé presumida dos terceiros adquirentes. A 4a Turma do Superior Tribunal de Justiça, ainda que relativamente a casos anteriores à lei 8.953/94, hipótese dos autos, vem entendendo que não basta à configuração da fraude à execução a existência, anteriormente à venda de imóvel, de ação movida contra o alienante capaz de aduzi-lo à insolvência, somente admitindo tal situação quando já tivesse, então, havido a inscrição da penhora no cartório competente, salvo se inequívoco o conhecimento dos adquirentes sobre a pendência judicial, prova que incumbe ao credor fazer. Ressalva do ponto de vista do relator. Recurso especial conhecido e provido, para cancelar constrição. Procedência dos embargos de terceiro." (Resp 200.262/SP; relator ministro Aldir Passarinho Júnior; DJ 16/9/2002) "Processo civil. Ação reivindicatória. Arrematante contra a pessoa que adquiriu de terceiro o imóvel alienado pelo executado após a penhora não registrada. Ausência de prova da ciência do adquirente. Fraude de execução declarada em processo que não envolveu o réu da reivindicatória. Invalidade da declaração em relação ao adquirente que não houve o bem do próprio executado, mas de terceiro. Precedentes. Recurso provido. - Segundo entendimento firmado na Segunda Seção, no sistema anterior à lei 8.953/94, com lastro inclusive em orientação doutrinária, para a caracterização da fraude de execução, "não registrada a penhora, a ineficácia da venda, em relação a execução, depende de se demonstrar que o adquirente, que não houve o bem diretamente do executado, tinha ciência da constrição" Resp 110.336/PR; relator ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira; DJ 5/8/2002) "Agravo interno. Processual civil. Fraude à execução. Alienação de bem penhorado. Embargos de terceiro. Mesmo antes da lei 8 953/94, para que se pudesse ter como ineficaz a venda de imóvel, sob o argumento de que o bem estaria penhorado, fazia-se necessário o registro da penhora ou a demonstração concreta de ciência por parte do adquirente do ato constritivo, entendimento pacificado no âmbito desta Corte Agravo a que se nega provimento." (AGA 357.334/RS; relator ministro Castro Filho; DJ 24/6/2002) "Locação predial urbana. Execução. Penhora sobre imóvel. Ato de constrição não levado a registro. Alienação do bem a terceiro. Artigo 593, II, CPC. Fraude de execução. Descaracterização. A presunção de que trata o inciso II, do artigo 593, do CPC é relativa, e para configuração da fraude de execução torna-se necessário o registro do gravame. Na sua ausência, incumbe ao exequente provar que o terceiro adquirente tinha ciência da ação ou constrição. Acresce que, pelo § 4o, do artigo 659 do CPC, o registro da penhora não é pressuposto da sua validade, mas sim de e eficácia erga omnes. Recurso conhecido e provido." (Resp 293.686/SP; relator ministro José Arnaldo da Fonseca; DJ 25/6/2001) Assim, inexistindo registro de penhora, cabe ao exequente a prova de que o terceiro adquirente tinha ciência da constrição para que fique configurada a fraude e, em conseqüência, seja decretada a ineficácia da alienação. Não havia registro de constrição na época em que se deu a alienação do bem, motivo pelo qual não há que se falar em violação do mencionado dispositivo legal, pois afastada a presunção da fraude, cabia à Fazenda demonstrar a eventual má-fé da embargante, o que inocorreu na hipótese. É o que se depreende da leitura do acórdão recorrido: “No caso presente, a apelada não providenciou o exato cumprimento do mandado de penhora com o cogente registro da penhora. Agiu com manifesta negligência e portanto não pode ver presumida a fraude à execução, como reconhecida pela sentença. Descurou-se a apelada de provar mediante elementos concretos que o apelante tivesse plena ciência da constrição. Além de o apelante ter adquirido o bem de outra pessoa, que o comprara do executado, somente se comprovou, pelo reconhecimento da inicial, que o impedimento ao registro da escritura seria a dívida ativa com o INSS. Ora, esse fato não induz o 'consilium fraudis' exigido para a caracterização da fraude." Sem prejuízo, afinamo-nos com essa tese jurisprudencial ao assentarmos em \"Curso de Processo Civil": "Em nosso entender, à luz do texto, é fraudulenta a alienação depois da propositura da ação e antes da citação, uma vez que a exigência da lei para considerar ineficaz o ato é de que, ao tempo da alienação, corra contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência. Ora, considera-se demandado o devedor desde que distribuída a ação onde houver mais de um juízo em competência concorrente ou despachada onde houver mais de um juízo (art. 263 do CPC). É imperioso que, antes de o andamento jurídico preocupar-se com o terceiro de boa-fé, volte-se para proteção da parte primeiramente lesada e que recorreu ao Judiciário. Na verdade, o terceiro adquirente é lesado em segundo grau. A jurisprudência, contudo, revela não haver pacificidade quanto ao tema. Hodiernamente a lei exige o registro da penhora, quando imóvel o bem constrito. A novel exigência visa à proteção do terceiro de boa-fé, e não é ato essencial à formalização da constrição judicial; por isso o registro não cria prioridade na fase de pagamento, penhora e depósito. Entretanto, a moderna exigência do registro altera a tradicional concepção da fraude de execução; por isso, a alienação posterior ao registro é que caracteriza a figura em exame. Trata-se de uma exceção criada pela própria lei, sem que se possa argumentar que a execução em si é uma demanda capaz de reduzir o devedor à insolvência e, por isso, a hipótese estaria enquadrada no inciso II do artigo 593 do CPC. A referida exegese esbarraria na inequívoca ratio legis que exsurgiu com o nítido objetivo de proteger terceiros adquirentes. Assim não se poderia mais afirmar que quem compra do penhorado o faz em fraude de execução. 'É preciso verificar se a aquisição precedeu ou sucedeu o registro da penhora'. Em caso de aquisição, por parte do comprador, insciente do processo não se declara a fraude, cabendo ao exeqüente substituir o bem penhorado. Neste passo, a reforma consagrou no nosso sistema aquilo que há muito se preconiza nos matizes europeus." (Fux, Luiz. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2001, pp. 1049 e 1050). Ex positis, haja vista que o acórdão recorrido encontra-se em sintonia com o entendimento sólido desta Colenda Corte, nego provimento ao Agravo, com base no artigo 544, § 2o do CPC. Brasília, 11/7/2003. Ministro Luiz Fux, relator (Agravo de Instrumento no 507.255/SP, DJU 10/9/2003, p.148).
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