Notícia n. 5559 - Boletim Eletrônico IRIB / Fevereiro de 2004 / Nº 1029 - 18/02/2004
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
1029
Date
2004Período
Fevereiro
Description
Desapropriação indireta. Lotes rurais. Alienação. Posterior instituição de reserva indígena no local. Indenização. - Sérgio Jacomino, seleção e verbetação Despacho. Ação rescisória fundamentada nos incisos III, V, VI e IX, § 1o, do artigo 485 do Código de Processo Civil, proposta pela União Federal contra J.Q.F. e o Estado de Mato Grosso. 2.O acórdão rescindendo, prolatado na ação cível originária 297-4/MT, concluiu ser devido pela União Federal o pagamento de indenização por desapropriação indireta de lotes rurais alienados pelo primeiro réu – Estado de Mato Grosso – a J.Q.F.. 3.Para tanto, considerou provado que referidos lotes não se encontram na área tida como habitat imemorial dos índios Kayabi, mas teriam sido posteriormente atingidos quando da instituição da reserva indígena pela Funai, fato que resultaria no dever de indenizar a área expropriada. 4.Sustenta a autora os seguintes argumentos: - Os laudos periciais que fundamentaram a decisão de procedência da Ação Cível Originária 297-4 (Tribunal Pleno, 02/05/85) são documentos ideologicamente falsos, obtidos pelos interessados com a intenção deliberada de encobrir a verdadeira condição da área em litígio, circunstância que configuraria a hipótese de “dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida” (artigo 485, III, 1a parte, do CPC). - Ocorreu colusão entre os réus J.Q.F. e o Estado do Mato Grosso, o que se pode concluir a partir dos seguintes fatos: “(a) desrespeito à posse indígena e ao domínio da União Federal sobre as terras indígenas; b) alienação, sem autorização do Senado Federal, de porção de terra de dimensão superior a 10.000 (dez mil) hectares; c) desempenho das funções de peritos judiciais e de assistentes técnicos por parte de pessoas despidas de qualificação profissional para tanto e carecedoras dos necessários conhecimentos técnicos; d) reivindicação de propriedade não individualizada e indeterminada.” - Foram violadas normas constantes das Constituições de 1946, 1967, EC 1/69, do Código Civil e do Código de Processo Civil. 5.Após a citação dos réus, deferi requerimento da União para produção antecipada de prova consistente no depoimento do Padre J.E.D., audiência formalizada no termo de fls. 428/430. 6.O réu J.Q.F., apresenta contestação afirmando: - Preliminarmente o descabimento da ação rescisória por ausência de pressuposto de rescindibilidade. - No mérito, afirma deter a titularidade do domínio da área em litígio, que não constitui “posse imemorial dos índios Kayabi”. Alega ainda que a autora busca retorno à fase de instrução probatória da ação principal, ressaltando que “a boa ou má interpretação da prova, a justiça ou injustiça da decisão rescindenda não cabe discutir-se na rescisória”. 7.O Estado de Mato Grosso também contestou a ação, alegando, em síntese: - A Lei 6.001/73 (Estatuto do Índio) estabelece distinção entre as áreas reservadas e as de ocupação imemorial pelos índios, e apenas essas últimas seriam incluídas entre os bens da União. A área pertencente ao réu J.Q.F. foi incluída na modalidade “área reservada” e quando “da medição e demarcação da gleba do autor, foi verificada a inexistência de silvícolas”, o que demonstraria a legitimidade do processo de alienação. - As área em litígio “têm sua origem em alienações efetuadas pelo Estado do Mato Grosso (...) em 1954-1960, e foram, através de ação contenciosa, objeto do Registro Torrens, no competente Cartório de Registro de Imóveis, na Comarca de Diamantino/MT, prevalecendo o mesmo erga omnes”, tudo na vigência da Constituição de 1946, que não exigia prévia autorização do Senado Federal para “as alienações de terras devolutas estaduais não superiores a 10.000 hectares”. -“Os dados histórico-antropológico-arqueológicos são importantes para outros estudos científicos, mas que não comprovam posse permanente de índios à época em que o Estado de Mato Grosso alienou as quatro glebas a J.Q.F.”. - O domínio do Estado do Mato Grosso sobre a área alienada a J.Q.F. “lhe está assegurado desde a Constituição da República de 1891 (art. 64)“ e, que “os imóveis estão perfeitamente individualizados em seus títulos de propriedade, conforme certidões expedidas pelo Registro de Imóveis da Comarca de Diamantino”. Em “todos os laudos apresentados nos autos da Ação Cível Originária no 297, e que ora se pretende rescindir, estão confirmadas as transferências dos índios Kayabis para o interior da reserva criada pela União Federal”, sendo incabível falar em ausência de habilitação dos peritos e assistentes técnicos que atuaram no caso. 8.Partes legítimas e bem representadas. Dou por saneado o processo. 9.A autora reiterou o requerimento de provas formulado na inicial de fls. 176/177, verbis: “a) seja requisitada ao Estado do Mato Grosso a íntegra do procedimento administrativo atinente à concessão e/ou alienação de terras ao Réu J.Q.F., com os respectivos memoriais descritivos e plantas, tudo com as referências convenientes para a identificação, cadernetas de operação de campo, folhas de cálculo analítico, data da medição e nome do agrimensor, a fim de que possa ser submetido, oportunamente, à indispensável perícia técnica, destinada à verificação de sua autenticidade e validade, que desde já requer; b) seja deferida a realização da perícia topográfica, visando à materialização dos títulos dominiais no solo, sob a supervisão da autoridade judicial competente; c) seja deferida a realização de perícia arqueológico-museológica, referente ao território objeto da ação, destinada a pesquisar os vestígios da presença física de silvícolas na área, de 1934 até o ano de 1955; d) seja deferida a realização de perícia histórica, destinada a reconstituir os acontecimentos havidos na região de que trata a ação, com relação à presença indígena, no período que vai do advento da Constituição de 1891 até os dias de hoje; e) seja deferida a realização de perícia antropológico-cultural, destinada a identificar os grupos indígenas que presentemente habitam a região onde se situa a área objeto da ação, sua origem, individualidade étnica e afinidade cultural; f) seja deferida a oitiva de testemunhas;” 10.O réu J.Q.F. requereu a juntada oportuna de documentos e a oitiva de testemunhas. O Estado do Mato Grosso não especificou novas provas. 11.Defiro a realização das perícias requeridas pela União e determino seja requisitada ao Estado do Mato Grosso a documentação discriminada no item a do requerimento de provas da autora. 12.Nos termos do artigo 492 do CPC c/c o parágrafo único do artigo 261 do RISTF, delego competência a um dos Juízes Federais com jurisdição no Município de Diamantino/MT, a ser designado por distribuição, para, no prazo de 90 (noventa) dias, realizar a respectiva instrução. Brasília, 5/5/2003. Ministro Maurício Corrêa, relator (Ação Rescisória no 1.275-5/MT, DJU 15/5/2003, p.25/26).
Direitos
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Article Number
5559
Idioma
pt_BR