Notícia n. 5396 - Boletim Eletrônico IRIB / Janeiro de 2004 / Nº 981 - 14/01/2004
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
981
Date
2004Período
Janeiro
Description
CORREIO BRASILIENSE – 16/11/03 - Léa Portugal. Aqui ela cresceu, amadureceu e conheceu o melhor do ser humano. - Vinícius Nader Especial para o Correio "Que desolação”. Essa foi a frase que Léa Portugal lembra ter dito a bordo do avião que a trazia do Rio de Janeiro para Brasília aos 17 anos de idade. O mar de terra vermelha, única vista que ela tinha da janela da aeronave, aumentava ainda mais a angústia da jovem que trocava seu estado natal pela recém-inaugurada capital da República no dia 1o de setembro de 1960. Léa Portugal veio para Brasília acompanhando o pai aposentado e a mãe servidora da Justiça Eleitoral transferida e deixou para trás uma cidade praiana, com um cenário perfeito para a adolescente estudante de jornalismo da PUC carioca. A única irmã já era casada e ficou por lá mesmo. "Conversávamos muito em casa sobre a possibilidade de eu ficar no Rio de Janeiro, morando com algum parente, mas chegamos juntos à conclusão de que era realmente melhor eu vir para cá", conta Léa, sem nem um pingo de arrependimento. "Foi em Brasília que eu cresci, amadureci e conheci o melhor do ser humano, afirma ela. A universidade de jornalismo realmente ficou para trás. Léa ainda estagiou na sucursal do Diário da Manhã aqui, em uma época “que tínhamos que ir para uma agência dos Correios para telegrafar nossas matérias”. O desgosto com a mudança durou pouco e logo Léa estava acostumada com a nova cidade e impressionada com algumas coisas que a fascinam até hoje. “O pôr-do-sol de Brasília, o encontro das culturas de várias regiões do Brasil e jornaleiro em cada quadra residencial me conquistaram”, enumera. Se a carreira de jornalismo não deu certo, não podemos dizer o mesmo da de advocacia. Léa Portugal se orgulha de ter prestado o primeiro vestibular da Universidade de Brasília (UNB), em 1962. “Éramos, no máximo, 500 alunos matriculados nos poucos cursos oferecidos, mas conscientes da importância que representávamos”, conta ela, que classifica toda aquela geração como uma mesma turma de contemporâneos, independentemente do curso. Léa afirma que aquele foi um tempo marcado pela esperança e pela busca por algo novo e o considera como a grande época de sua vida. A universidade era um verdadeiro teste para todos – professores e alunos. “Era a primeira vez que uma universidade brasileira adotava o sistema europeu de ensino superior, com semestres e créditos”, lembra uma das primeiras advogadas formadas na cidade. E se a infra-estrutura não era das melhores – afinal era uma universidade em obras constantes – os alunos tinham professores muito bons. "Darcy Ribeiro trouxe os melhores profissionais que ele conseguiu, muitos vindo do exterior”, diz Léa. Outro aspecto que chama a atenção dela é a cooperação que havia entre os alunos e a universidade. “Os protestos eram políticos, naturais em uma faculdade", afirma ela, garantindo que material não era problema. "Às vezes chegávamos em uma sala e ela ainda não estava pronta. Mas ninguém se importava em mudar de sala para ter aula”, lembra. Quando a outra sala também não estava pronta, não tinha jeito: a aula era dada no gramado mesmo. "Aí dizia-se que estávamos no pastus e não no campus da universidade", diverte-se, com seu marcante bom humor. Aos 18 anos, Léa casou-se com o primeiro de seus três maridos e mudou-se para uma casa térrea na 708 Sul, quadra onde moravam os arquitetos que criaram a cidade. Nessa época, a estudante foi vizinha de homens da maior importância para Brasília, como Oscar Niemeyer e Athos Bulcão, para citar apenas alguns. "Essa convivência com tanta gente interessante acabou aguçando meu senso estético', avalia. Isso sem falar nas amizades conquistadas naquela quadra que duram até hoje e fazem de Léa a vice-presidente da Fundação Athos Bulcão. Foi também aos olhos desses arquitetos e pelas mãos de um ex-porteiro, que acabou se tornando advogado, que Léa aprendeu a dirigir em um jipe. "Era engraçado aprender a dirigir em um local como Brasília, um poeirão com barro para todos os lados", lembra, acrescentando que, por causa da terra, o carro escorregava muito nos dias de chuva. Para se divertir, um dos pontos preferidos dessa turma era ir a um dos locais que mais despertam saudades em Léa: o Brasília Palace Hotel. “O programa era ir tomar cafezinho lá depois do jantar. Mais tarde, começaram a fazer shows no local”, lembra ela, lamentando o incêndio que destruiu o hotel. Já formada em Direito, a agora advogada Léa Portugal reuniu uma turma e, juntos, estudaram para o concurso público para titular do 2o Cartório de Registro de Imóveis de Brasília, o primeiro depois da Constituição de 1967. “Esse cartório foi um dos primeiros no Brasil a ter seu titular determinado por concurso público, ato que passou a ser adotado por lei somente com a Constituição de 1988”, afirma. Aprovada no concurso, Léa só não sabia se era bom ou ruim, pois seu cartório seria responsável pelos registros da Asa Norte, Paranoá e Jardins, áreas que, além de sofrer preconceito, ainda estavam em construção. “Na Asa Norte tinham o que chamávamos de os barracos dos mudancistas, onde morava o pessoal que vinha transferido dos acampamentos da Cidade Livre (Núcleo Bandeirante) para o Plano Piloto. E só”, lembra. Por isso, Léa não podia pensar em ter uma estrutura grande logo de cara. “Comecei em uma pequena sala na 103 Norte, com apenas três funcionários”, lembra, ressaltando que um dos funcionários está com ela até hoje e é conhecido no meio como o Toninho da Léa. O tempo foi passando, a Asa Norte foi crescendo e o cartório de Léa também. “Crescemos juntos, eu, o cartório e Brasília”, afirma ela, que foi a primeira presidente da Anoreg-BR (Associação dos Notários e Registradores do Brasil), organização que reúne titulares de cartórios de todo o país. Hoje, já crescidos e amadurecidos, estão os três em ótima forma e vivendo uma bela história de amor – o cartório, Brasília e Léa Portugal. (Correio Brasiliense/DF, Coluna: Léa Portugal, 16/11/03, p.6 e 7)
Direitos
IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
Article Number
5396
Idioma
pt_BR