Notícia n. 7551 - Boletim Eletrônico IRIB / Maio de 2005 / Nº 1740 - 11/05/2005
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
1740
Date
2005Período
Maio
Description
Conclusões do III Encontro Ibero-americano de Direito de Registro Santa Cruz de la Sierra, Bolívia - Entre os dias 3 e 6 de maio de 2005 foi celebrado em Santa Cruz de la Sierra, Bolívia, o III Encontro Ibero-americano de Direito de Registro convocado pela AECI, FIIAPP e o CORPME da Espanha sob o título de “Novas Tecnologias, Registros da Propriedade e Proteção de Dados”. Os participantes dos treze países presentes formulam e deliberam as seguintes conclusões com o objetivo de que se unam à Declaração de Antigua e ao anexo primeiro aprovado no II Encontro. 1ª. O reconhecimento constitucional do direito de propriedade não implica que todos e cada um dos cidadãos dos países que o acolhem se convertam em proprietários. Sua formulação sanciona unicamente a obrigação do Estado de tomar as medidas necessárias para facilitar que o maior número deles possa sê-lo. Para tal efeito, o primeiro requisito constitui-se na proclamação da instituição jurídica da propriedade. Para permitir que exista o direito de propriedade sobre um bem é preciso que o Estado estabeleça normas jurídicas que regulem sua aquisição, regime de exercício e proteção. O Registro de fé pública é a instituição que atribui os direitos reais, define o conjunto de poderes que cada um compreende, de modo que dois ou mais possam coexistir simultaneamente sobre um mesmo objeto e fixa sua prioridade no caso de que sejam incompatíveis. Porém, além disso, a inscrição protege o titular e impede que, salvo na hipótese de expropriação e prévia comprovação de ter-se cumprido a totalidade dos trâmites legais estabelecidos, seja privado de seu direito. Conseqüentemente, lhe permite conservá-lo tanto nos casos de dupla venda como de execução judicial por dívidas do anterior proprietário, salvo, obviamente, se seu pagamento estava assegurado por uma garantia que se achava inscrita antes que seu título acedesse ao Registro. O Registro é, portanto, a instituição que o Estado criou para cumprir o dever constitucional de proteger o direito de propriedade. A inscrição, por sua parte, constitui um ônus que o legislador impôs ao titular desse direito para obter sua proteção jurídica e eliminar a ameaça de uma possível perda. Além de certas obrigações de caráter fiscal e formalidades que o interessado tem de cumprir, a dispensa dessa proteção lhe obriga a proporcionar ao Registro um conjunto de dados pessoais cujo uso ou divulgação não controlada poderia lesionar seu direito à intimidade. Estas circunstâncias incluem o domicílio, sexo, estado civil e inclusive a religião, mas também dados familiares, como pode ser a causa de não recebimento de herança de um legitimário, a existência de filhos extramatrimoniais ou sua condição adotiva ou natural. Por outro lado, no Registro podem, além disso, constar anotações econômicas da pessoa que, atualmente, carecem de relevância como a existência de penhoras, constrições judiciais ou hipotecas já canceladas. 2ª. A atribuição e delimitação dos direitos reais que o Registro da propriedade concretiza tem como finalidade primordial criar segurança jurídica com o fim de permitir a existência e a expansão de um mercado imobiliário e hipotecário. Esta função explica o caráter público de seus assentos. Qualquer pessoa que intervenha nesse mercado tem o direito de ser informada da situação jurídica em que se encontra o bem que constitui o objeto de seu interesse. Embora a mesma finalidade que justifica a existência do Registro delimita o volume de informação que deverá ser proporcionada ao solicitante. Essa informação não conterá em nenhum caso circunstâncias que afetem a intimidade das pessoas ou que sirvam ou possam servir para confeccionar seu perfil ideológico, racial, sexual, econômico ou de qualquer outra índole. A necessidade de proteção da personalidade e o habeas data excluem a publicação indevida de fatos particulares ou familiares, embora não secretos, prescindindo de se são certos ou incertos. Unicamente se excepcionam os dados necessários para conhecer a situação jurídica dos bens objeto de solicitação. O direito dos cidadãos que as Constituições garantem de obter uma informação verdadeira e seu correlativo de comunicá-la e emiti-la livremente não legitima as intromissões na intimidade das pessoas nem seu exercício desmesurado ou exorbitante. Somente quando forem relevantes os dados solicitados, em ordem à consecução do fim que esse direito persegue, a formação da opinião pública, cabe admitir sua divulgação. A conveniência de atuar a segurança jurídica preventiva ratifica a importância de estabelecer as anteriores limitações. O surgimento e extensão de novas formas de delinqüência, como a violência doméstica ou a proliferação de bandos armados, aconselham extremar a prudência na hora de regular o direito à informação que, em nenhum caso, pode servir para amparar a curiosidade prejudicial de terceiros não legitimados. Isso sem prejuízo das obrigações que o auxílio judicial, a colaboração fiscal ou o dever de contribuir com dados para a Administração impõem ao Oficial de Registro. É preciso recordar que os cidadãos são os proprietários dos dados que afetam a personalidade. O consentimento prestado na sua figuração em qualquer Registro ou base de dados não enfraquece a afirmação anterior e o seu valor econômico e os interesses que existem em torno deles não devem prevalecer sobre os direitos dos seus titulares. 3ª. O Oficial de Registro é responsável por evitar a expedição ilegítima de informação que afete os direitos antes mencionados. Conseqüentemente, deverá controlar o uso dos livros sob sua responsabilidade e adotará as medidas necessárias para evitar a manipulação, cópia ou vazamento do seu conteúdo. Para o cumprimento desta tarefa, é conveniente observar as seguintes normas: A. O Oficial de Registro deve qualificar, sob sua responsabilidade, o interesse legítimo dos solicitantes da informação de registro e omitir, ao lavrá-la, os dados pessoais que não afetem a solicitação apresentada. B. Recomenda-se a não permissão de acesso direto ao conteúdo dos livros do Registro. A informação deve limitar-se aos dados que o interesse do solicitante justifique sem que, para sua emissão, seja aconselhável o uso de fotocópias literais dos assentos ou outros meios de reprodução exata do seu conteúdo, com exceção das informações liberadas em cumprimento dos mandados judiciais. C. Quando o Oficial de Registro tiver motivos fundamentados para considerar que a informação requerida pode vulnerar algum direito que afete o titular registral ou as pessoas cujos dados constam em um assento, negará a expedição ou o acesso. D. O titular de um direito inscrito poderá solicitar sua exclusão do princípio de publicidade dos assentos em virtude de uma causa justificada. Se o Oficial de Registro considerá-la suficiente, recusará qualquer petição que for formulada e, se for o caso, notificará sua decisão aos serviços correspondentes para que a apliquem. A proibição de informar ficará sem efeito a pedido do interessado, por resolução judicial ou decisão do próprio Oficial de Registro se entender que as causas que a justificaram tenham cessado. E. O pedido de informação relativa às pessoas será notificado ao interessado no domicílio ou endereço eletrônico que constar no Registro. Se dentro do prazo estabelecido ele se opuser, a expedição ou o acesso será negado. F. Todas as atuações que o Oficial de Registro praticar e as decisões que adotar em relação à informação serão recorríveis perante os Tribunais de Justiça nos termos que a lei determinar. 4ª. A documentação e arquivo eletrônicos, baseados em dispositivos reconhecidos de assinatura eletrônica, diminuem de maneira significativa os custos das transações. O contínuo incremento da contratação, unido à urgente necessidade de agilizar sua inscrição, obriga a incorporar as novas tecnologias aos Registros. A aplicação destas tecnologias possibilita que conste no Registro todo tipo de dados relacionados com os direitos e as propriedades sobre os quais recaem e, conseqüentemente, facilita que a publicidade compreenda a totalidade da informação territorial associada ao domínio inscrito. Requisito imprescindível para que o Registro possa converter-se no centro de informação dos dados, não somente jurídicos, mas também urbanísticos, fiscais ou de meio ambiente que afetem as propriedades, é a criação de bases gráficas que permitem a correta localização e identificação. O Oficial de Registro deve adotar a cada momento as medidas de segurança necessárias para evitar a materialização das novas ameaças que afetem os arquivos digitais como podem ser sua manipulação, invasão ou vazamento. A contínua evolução das tecnologias o obriga a realizar um esforço constante de atualização de tais medidas com o objetivo de garantir sua eficácia. O valor das despesas que os trabalhos de informatização, digitalização, incorporação de novas tecnologias e sua constante atualização supõe, reafirma a vigência do princípio de autofinanciamento dos Registros. Como já consta na Declaração de La Antigua, a utilização dos recursos que o Registro gera destinando-os para fins distintos do pagamento dos custos que o seu eficaz funcionamento demanda, além de dificultar, quando não de impedir, implica converter os honorários satisfatórios para obter sua proteção em imposto encoberto que onera o exercício constitucional do direito de propriedade. 5ª. O caráter jurídico do conteúdo e os efeitos de seus assentos constituem a essência do Registro da propriedade. Conseqüentemente, a criação do Registro digital, de cujo funcionamento a assinatura eletrônica reconhecida é uma peça essencial, não somente não exclui a persistência da qualificação do Oficial de Registro, como também é característica sine qua non de tal caráter, suporá sua extensão a totalidade da informação territorial dos bens. A certeza técnica que a documentação eletrônica proporciona sobre o fato da outorga dos documentos, fixação de sua data, identidade das partes que nele intervêm, a ausência de alteração do seu conteúdo e seu recebimento pelo destinatário e o conseqüente aumento da segurança que tal certeza aporta em relação à forma tradicional de certificar esse conjunto, aconselham a fomentar sua utilização pelos operadores que atuam no mercado. Dada a importância que o princípio de prioridade tem e a necessidade de preservar a igualdade entre a pluralidade dos agentes que têm a capacidade para produzir documentos susceptíveis de causar um assento nos livros do Registro, corresponde a este fixar o sistema por meio do qual tal documentação eletrônica será enviada. Por outro lado, a conveniência de centralizar a informação e de homogeneizar os critérios de qualificação dos Oficiais de Registro, assim como a necessidade de atualizar e pôr ao seu dispor a totalidade dos textos legais utilizados, aconselha a criar em cada país uma rede interna de comunicação entre os diferentes Registros existentes. 6ª. A publicidade do registro pretende prover aos adquirentes potenciais os conhecimentos sobre a situação jurídica dos bens com o objetivo de proporcionar-lhes a segurança que demandam para contratar. A informação que um Registro de documentos proporciona é, por si só, insuficiente para satisfazer a esta demanda. A inexistência dos princípios de fé pública e legitimação determina que a informação fornecida seja incompleta, que unicamente proveja uma prova indiciária e sinalize um âmbito de busca. Não obstante, dado que o Registro não garante a validade do título de aquisição do hipotético vendedor nem do de seus causadores, sua anulação posterior pelos Tribunais é sempre factível, salvo prescrição da ação correspondente. Esta deficiência em satisfazer o nível de segurança que o mercado exige obriga a criação de outros arquivos nos quais se coletam dados diferentes, como os relativos à morosidade, à quantidade de gasto ou aos antecedentes econômicos e, em algumas ocasiões, criminais das pessoas, com o objetivo de reforçar a confiança dos operadores. A dispersão nas fontes de consulta para contratar com segurança produz, por sua vez, um aumento nos custos que a obtenção de uma informação fiável exige e um traslado ao setor privado das tarefas de obtenção, elaboração e garantia desta informação. Pelo contrário, o jogo dos citados princípios de fé pública e legitimação permite ao Registro de direitos proporcionar aos potenciais adquirentes ou prestamistas a informação bastante para conhecer a situação jurídica dos bens. A presunção de validez, legalidade e exatidão que ampara seus assentos é suficiente para satisfazer sua demanda de confiança já que sabem que, se adquirem do titular do registro, de boa fé e a título oneroso, a anulação do direito daquele em virtude de uma causa que não conste inscrita não afetará sua titularidade. Conseqüentemente e diferentemente do que ocorre com as bases de dados comuns, pode-se afirmar que o Registro de direitos se caracteriza porque elabora a informação que lavra e porque esta constitui sempre a realidade jurídica. O Registro não se limita a publicar ou, o que é igual, a fixar a prioridade e tornar oponíveis os direitos que resultam dos negócios documentados senão que, no caso destes serem anulados e frente a terceiros que apresentem os requisitos mencionados, os abone. Ou, dito em outras palavras, a incorporação aos seus livros dos dados, dos direitos que publica, outorga-lhes realidade, ainda que não a tivessem. Por este motivo, cabe afirmar que a inscrição constitui um mecanismo de criação de direitos, circunstância que, por sua vez, obriga a extremar o cuidado em sua lavratura mediante a aplicação do princípio da qualificação. Deste ponto de vista, a publicidade, o resultado final que a existência de um Registro de direitos produz, é a prestação pelo Estado de um serviço que implica uma economia de tempo e dinheiro e um aumento de segurança para os cidadãos. Conclusão necessária desta conseqüência e do princípio de responsabilidade é a obrigação do Oficial de Registro, por si ou por meio do mecanismo de seguro legalmente previsto, de reparar os danos causados pelos erros contidos na publicidade lavrada mediante certidão. Em relação ao regime de responsabilidade daqueles que tem sua origem na informação obtida mediante o acesso direto aos livros do Registro, com a correspondente autorização prévia, será o que se aplica geralmente à lavratura e cancelamento dos assentos. 7ª. Considera-se conveniente a constituição de uma rede internacional de publicidade de registros com o objetivo de facilitar os intercâmbios de bens e serviços entre os países e de reforçar a segurança destas transações fronteiriças. 8ª. Recomenda-se impulsionar a criação de uma rede de intercâmbio livre de informação tecnológica registral e de desenvolvimento compartilhado em código aberto. 9ª. Resulta indispensável a difusão destas conclusões entre os operadores de Registros dos diferentes países assim como entre as autoridades de governo das quais depende a aprovação das modificações normativas que se requerem. Santa Cruz de la Sierra, 6 de maio de 2005. Imagem
Direitos
IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
Article Number
7551
Idioma
pt_BR