Notícia n. 5217 - Boletim Eletrônico IRIB / Novembro de 2003 / Nº 916 - 03/11/2003
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Edição
916
Date
2003Período
Novembro
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Penhora. Bem de família. Pré-executividade. Medida não prevista para discutir nulidade da penhora - Sérgio Jacomino, seleção e verbetação Despacho. C.R.T.R. opõe os presentes embargos de declaração à decisão de fls. 231 e 236, em que neguei seguimento à presente cautelar, assim: “Vistos. C.R.T.R propõe a presente cautelar, com pedido de liminar, contra Prinstarc Engenharia de Ar Condicionado e Construções Ltda., para “agregar efeito suspensivo ao Recurso Especial interposto, bem como para determinar, nos autos de origem (execução), a suspensão de todo e qualquer ato de execução, impedindo quaisquer medidas constritivas relativas ao imóvel penhorado, até o trânsito em julgado da decisão do mérito do Agravo de Instrumento”. Alega o requerente, para tanto, que: “A requerida promove contra o requerente e outro, ação de execução por quantia certa contra devedor solvente fundada em título executivo extrajudicial (em trâmite perante a d. 31a Vara Cível do Foro Central de São Paulo, Capital – autos no 000.00.553623-5 – cópia na íntegra inclusiva – doc. 03), visando obter o pagamento de R$ 45.219,97 (quarenta e cinco mil, duzentos e dezenove reais e noventa e sete centavos), onde procedeu-se à penhora da metade ideal do apartamento no 101, localizado no 10o andar do Edifício Arlanza, sito na rua Gabriel dos Santos, no 756, Santa Cecília, São Paulo, Capital, de propriedade do requerente. Nos autos da referida Execução, peticionou o Requerente (denominando tal petição de “exceção de pré-executividade”) requerendo a decretação da nulidade da constrição efetivada - bem como dos atos processuais supervenientes (art. 248, CPC). eis que (i) o imóvel objeto da constrição constitui bem de família (fato documentalmente comprovado e incontroverso) e (ii) inexistiu ordem judicial para que se procedesse à constrição. Frise-se que, a par dos documentos que instruíram a referida petição comprovarem cabalmente que o imóvel penhorado serve efetivamente à residência do Requerente e de sua família, tal fato encontra-se, inclusive, atestado em diversas certidões lavradas pelo sr. Oficial de Justiça nos próprios autos, certidões estas que, relembre-se, possuem fé pública. Quanto ao segundo argumento, efetivamente não consta dos autos ordem judicial que determinasse a constrição do referido imóvel, sendo sintomático que, do aditamento do mandado de arresto conste a “transcrição” do seguinte “despacho”: “Fls. 62/64: desentranhe-se e adite-se o mandado como requerido”. O d. Juízo a quo indeferiu o pedido ali formulado sob o infundado argumento de que “a exceção só tem cabimento para matéria de Ordem Pública e nenhuma questão referente a isto foi ventilada” Adiante-se que ambas as matérias versadas na exceção de pré-executividade caracterizam indubitavelmente matéria de ordem pública, passíveis de conhecimento ex officio, seja no que se refere à impenhorabilidade do bem de família (art. 1o da lei 8009/90 e artigos 648 e 649, CPC), seja na elementar imprescindibilidade de ordem judicial para a efetivação da constrição (arts. 143, II, 577 e 657 e parágrafo único, todos do Código Adjetivo). Assim o Requerente manejou perante o E. Primeiro Tribunal de Alçada Civil, Agravo de instrumento contra o referido despacho (autos no 1.145.704-8 - doc. 04). Não obstante a flagrante insustentabilidade do r. despacho então agravado, o ilustre Relator em decisão singular, negou seguimento ao Agravo de instrumento consignando: “Exceção de pré-executividade, medida anômala, não prevista na lei processual, não se destina a discutir nulidade da penhora, que devem ser apontadas (sic) diretamente na execução. O recurso, pois, é de manifesta improcedência. Com fundamento no artigo 557 do CPC, negou-lhe seguimento.”. Considerando que a r. decisão, a par de incongruente, prescinde de motivação e fundamentação, colide com os entendimentos doutrinário e jurisprudencial pátrios, nega vigência a dispositivos constitucionais e legais e olvida matéria de conhecimento ex officio, colimando com a flagrante negativa da prestação jurisdicional e evidente afronta ao devido processo legal (arts. 5o, LV e 93, X, CF), o Requerente dela interpôs Agravo interno (ou Regimental). Assim, submetido o recurso a julgamento pela C. Câmara, sobreveio o V. acórdão que, negando-lhe provimento, restou assim ementado: “Agravo de instrumento. Denegação de Seguimento. Matéria relativa à penhora de imóvel deduzida por meio de exceção de pré-executividade. Meio inadequado. Matéria a ser deduzida nos autos da execução. Recurso que seria improcedente. Seguimento denegado com base no artigo 557, do CPC. Decisão mantida. Regimental não provido”. O ora Requerente manejou Embargos de Declaração eis que, a par da insubsistência do entendimento esposado, o V. Acórdão incorreu em flagrante contradição e em omissões, a saber: (i) encerra contradição afirmar-se que a exceção de pré-executividade é meio inadequado para argüir a matéria e que deveria ter sido deduzida ”nos autos da execução”, sendo certo que a referida petição foi efetivamente manejada naqueles autos; (ii) omissão na apreciação do segundo fundamento argüido pelo Requerente (inexistência de ordem judicial que determinasse a constrição - artigos 143, 11, 577 e 657 e parágrafo único, CPC), nem sequer mencionado pelo aresto recorrido; (iii) missão na apreciação das matérias de ordem pública, de conhecimento de ofício (especialmente artigo 1o da lei 8009/90 e artigos 648 e 649 do Código Adjetivo), com flagrante infringência aos artigos 245, parágrafo único, e 267, §3o, primeira parte, ambos do mesmo Codex. Não obstante, os referidos Embargos foram rejeitados sem que nenhuma das relevantes omissões e contradição objetivamente apontadas fossem apreciadas ou sanadas. Como se não bastasse, a C. Câmara julgadora ainda impôs ao Requerente multa prevista no parágrafo único do artigo 538 do Código Adjetivo, por entender que tal recurso teve caráter procrastinatório. Intimado do v. acórdão em data de 03 de fevereiro passado, o Requerente recentemente dele interpôs o competente Recurso Especial, conforme cópia inclusa, não tendo, ainda, sido apreciada a sua admissão. Considerando a inexistência do efeito suspensivo ao Agravo de instrumento originalmente interposto bem como aos recursos posteriormente manejados, a execução vem prosseguindo, estando em vias de proceder-se ao registro imobiliário da penhora, já tendo o exeqüente requerido a avaliação do bem para o seu praceamento (arts. 136, 137 e 152). Com efeito, a par do patente periculum in mora que acarretará irreparável dano ao Requerente e sua família, a plausibilidade do direito restará amplamente demonstrada, autorizando o presente requerimento cautelar que deverá ser deferido com a máxima urgência.” Decido. A presente cautelar não merece processamento, tendo em vista a ausência dos requisitos legais. Consta dos autos que o requerente, nos autos da execução proposta pela requerida, apresentou exceção de pré-executividade para afastar a penhora de imóvel que, segundo alega, constitui bem de família, já que nele reside com sua esposa e filhos. O Juiz de Direito indeferiu a exceção de pré-executividade assim: “Fls. 106/112 - Indefiro. A exceção só tem cabimento para matéria de Ordens Pública e nenhuma questão referente a isto foi ventilada. Certifique se já decorreu o prazo do edital e dos embargos. Depois digam” Interposto agravo de instrumento pelo executado, o Relator do mesmo, junto ao 1o Tribunal de Alçada Civil de São Paulo (Ag no 1145704-8), negou-lhe seguimento monocraticamente, anotando que “exceção de pré-executividade, medida anômala, não prevista na lei processual; não se destina a discutir nulidade da penhora, que devem ser apontadas diretamente na execução” O agravo interno, por sua vez, foi desprovido pela 1a Câmara do Tribunal de origem, estando o Acórdão assim ementado: “Agravo de instrumento. Denegação de seguimento. matéria relativa à penhora de imóvel deduzida por meio de exceção de pré-executividade. Meio inadequado. Matéria a ser deduzida nos autos da execução. Recurso que seria improcedente. Seguimento denegado com base no artigo 557, do CPC. Decisão mantida. Regimental não provido.” A discussão processual gira em torno do cabimento, ou não, da exceção de pré-executividade para afastar a penhora de bem de família. Em princípio, segundo a jurisprudência da Corte, a via utilizada pelo executado destina-se a tratar de matérias relativas aos pressupostos processuais e às condições da ação, antes mesmo da penhora, e desde que não dependam do exame de provas. Confira-se: “Exceção de pré-executividade. Cabimento. Apresentação de embargos de devedor agasalhando impregnação sobre a nulidade do título. Precedentes da Corte. 1. Já decidiu a Corte que a exceção de pré-executividade é cabível quando as questões suscitadas não dependem de prova. No caso, os embargos de devedor que foram apresentados já contém a impugnação sobre a inépcia da inicial e a impropriedade da via executiva diante da não existência dos comprovantes de depósito, construindo mais um obstáculo para o sucesso da exceção. 2. Havendo contraditório na exceção de pré-executividade, não há razão alguma para afastar o cabimento da verba honorária, configurada a sucumbência diante do julgamento de improcedência. 3. Recurso especial não conhecido.” (REsp no 296.932/MG, 3a Turma, da minha relatoria, DJ de 04/02/02) “Processo civil. Embargos do devedor. Penhora. Os embargos do devedor pressupõem penhora regular, que só se dispensa em sede de exceção de pré-executividade, limitada à questões relativas aos pressupostos processuais e às condições da ação; nesse rol não se inclui a alegação de que a dívida foi paga. Recurso especial conhecido e provido.” (Resp no 146.923/SP, 3a Turma, Relator o Ministro Ari Pargendler, DJ de 18/06/01) “Processo civil. Execução fiscal. Penhora de bens. Agravo de instrumento contra a decisão que a ordenou contra terceiro indicado como sucessor tributário. A regra na execução fiscal, é a de que o executado deverá alegar toda a matéria útil à defesa nos embargos do devedor (Lei 6.830, de 1980, art. 16, §2o). Excepcionalmente, admite-se a exceção de pré-executividade, no âmbito da qual, sem o oferecimento da penhora, o executado pode obter um provimento, positivo ou negativo, sobre os pressupostos do processo ou sobre as condições da ação - decisão, então, sujeita a agravo de instrumento. Hipótese em que o interessado interpôs desde logo o agravo de instrumento contra o ato que ordenou a penhora. Mal sucedido nesse recurso, não podia substituí-lo pelo mandado de segurança. Recurso ordinário improvido,” (RMS n o 9.980/SP 3a Turma, Relator o Ministro Ari Pargendler, DJ de 5/4/99). “Processual civil. Execução fiscal. Exceção de pré-executividade. Ilegitimidade passiva ad causam. Possibilidade. Precedentes. 1. Recurso Especial interposto contra v. Acórdão que manteve decisão singular nos autos de execução fiscal que acolheu exceção de pré-executividade, excluindo do pólo passivo o recorrido, ao argumento de que o inventariante somente é responsável pelos tributos devidos pela espólio, e não quanto aos devidos pelo de cujos. 2. A doutrina e a jurisprudência, como todos conhecem, aceitam que “os embargos de devedor pressupõem penhora regular que só se dispensa em sede de exceção de pré-executividade, limitada à questões relativas aos pressupostos processuais e às condições da ação”, incluindo-se a alegação de que a dívida foi paga (Resp no 325893/SP). 3. A jurisprudência do STJ tem acatado a exceção de pré-executividade, impondo, contudo, alguns limites. Coerência da corrente que defende não ser absoluta a proibição da exceção de pré-executividade no âmbito da execução fiscal. 4. No caso em exame, o acórdão bem aceitou a exceção de pré-executividade, haja vista ter ficado demonstrado ser o executado parte ilegítima na relação jurídica buscada pelo INSS. 5. Recurso não provido.” (REsp no 371.460/RS, 1a Turma Relator o Ministro José Delgado, DJ de 18/3/02) Neste caso, independentemente da linha de fundamentação adotada pelo Acórdão atacado no especial, parece que, de fato, a exceção de pré-executividade não serve para o fim colimado pelo requerente. A cautelar requerida, assim, no meu entender carece do fumus boni iuris. Por outro lado, observo que o Tribunal de origem não afastou a possibilidade do executado comprovar que a penhora incidiu sobre bem de família e de requerer a nulidade da constrição nos autos da execução mediante simples petição. Observe-se a parte inicial da fundamentação do Acórdão: “Com bem anotado na decisão que negou seguimento ao recurso, a matéria deduzida na exceção de pré-executividade, deverá ser deduzida nos próprios da execução, por simples petição, eis que relativa, exclusivamente, à penhora do imóvel realizada”. Conseqüentemente, entendo não presente, ainda, o periculum in mora. Ante o exposto, nos termos do artigo 34, inciso XVIII, do Regimento Interno, nego seguimento à presente cautelar. Alega o embargante que, verbis: “Observa-se, contudo, que apesar de declarar que não estavam presentes os requisitos processuais necessários para o deferimento da cautelar; em nenhum momento indicou os motivos pelos quais firmou este entendimento. O V. Acórdão se restringiu a declarar que a discussão processual girava em torno do cabimento de afastar a penhora de bem de família mediante exceção de pré-executividade, transcrevendo jurisprudência sobre o assunto. Todavia, não se referiu a todos os pontos ventilados na inicial da cautelar não se manifestando expressamente quanto aos seguintes aspectos: (i) quanto ao desrespeito ao artigo 649 do Código de Processo Civil, uma vez que as nulidades absolutas, e que afrontam o interesse público, são arguíveis a qualquer tempo e grau de jurisdição; (ii) quanto à violação aos artigos 1o da lei 8009/90 e 648, 649 do Código de Processo Civil, e, sobretudo, que a penhora sobre bem de família é matéria de ordem pública, ensejando, inclusive, seu conhecimento de ofício pela autoridade julgadora; (iii) quanto à alegação de que a exceção de pré-executividade foi interposta mediante a “simples petição” a que se referiu o v. Acórdão do 1o TAC. (iv) quanto ao periculum in mora evidenciado pelo fato de que, em prosseguimento à execução, é iminente o registro imobiliário da penhora, uma vez que o Exeqüente já requereu avaliação do bem para seu praceamento; Observa-se, dessa forma, que a decisão embargada não tratou de assuntos amplamente discutidos na inicial da cautelar e, muito menos, indicou os motivos pelos quais entendeu que estavam ausentes os requisitos necessários, para o deferimento da cautelar. De fato. A mera transcrição de julgados não constitui fundamentação do julgado, o que importa flagrante violação aos artigos 5o, LV e 93, X, da Constituição Federal. Verificou-se, além do mais que a ausência de fundamentação do julgado, sem dúvida, acaba por prejudicar o direito de defesa do Réu, uma vez que se encontra ele sem segurança se deve se insurgir contra a declaração de inexistência dos requisitos processuais ou contra as razões de mérito e ilegalidade da constrição de bem de família.” Decido. Conforme anotei na decisão embargada, discute-se o cabimento da exceção de pré-executividade para afastar penhora de bem de família. Trouxe, ainda, a jurisprudência desta Corte, no sentido de que a via utilizada, exceção de pré-executividade, destina-se a resolver questões relativas aos pressupostos processuais e às condições da ação, antes mesmo da efetivação da penhora e desde que não haja necessidade de exame de provas. Não serve a exceção de pré-executividade, então, para afastar constrição de determinado bem. Esta fundamentação, por si só, é suficiente, para descaracterizar a presença do fumus boni iuris, sendo impertinentes as apontadas omissões vinculadas às alegações de nulidade absoluta, matéria de ordem pública e da possibilidade de apresentação de exceção de pré-executividade mediante simples petição. Enfim, restou claro, que a via utilizada é imprópria para o fim colimado. No tocante ao periculum in mora, restou observado que o Tribunal de origem não afastou a possibilidade do executado comprovar a incidência de constrição sobre bem de família e nem de requerer a nulidade da constrição nos autos da execução por simples petição. Poderá, assim, o requerente pleitear o que for de direito em primeiro grau na via adequada nos moldes traçados pelo Tribunal de origem. Omissão, portanto, não há, também, nesta parte. Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração. Brasília, 17/3/2003. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, relator (Edel na Medida Cautelar no 6.138/SP, DJU 27/03/2003, p.255/256).
Direitos
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Article Number
5217
Idioma
pt_BR