Notícia n. 6984 - Boletim Eletrônico IRIB / Janeiro de 2005 / Nº 1484 - 07/01/2005
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
1484
Date
2005Período
Janeiro
Description
JORNAL DO BRASIL – 19/12/2004 Em ritmo de favelização - Dezoito anos após a extinção do Banco Nacional de Habitação, país amarga déficit habitacional de 7,2 milhões de moradias Israel Tabak Se o Rio é uma grande favela com uma cidade no meio, como disse há dias o secretário de Segurança, Marcelo Itagiba, outras metrópoles, além de cidades médias e até pequenos municípios do interior correm o risco de amargarem cenários parecidos. A deterioração urbana é um fenômeno em plena evolução no Brasil, órfão de políticas nacionais de habitação desde a extinção do BNH, há 18 anos. O dado mais recente obtido pelo Ministério das Cidades indica um déficit de 7,2 milhões de habitações, com 32 milhões de pessoas sem moradias decentes. Esse índice, na linguagem técnica, abrange moradias improvisadas (como as erguidas embaixo de viadutos), rústicas (uma habitação com folha de zinco, por exemplo) e os aglomerados subnormais, onde se encaixam as favelas. A massa de necessitados trouxe atrás de si uma nova classe de políticos clientelistas que fazem carreira e se reelegem à custa da ''proteção '' dos que erguem barracos em encostas perigosas, na beira de rios, embaixo de redes de alta tensão e em outros locais perigosos ou proibidos. Esse fenômeno político ajuda a travar planos de construção de habitações populares, que exigem parcerias entre as três esferas de poder. O Ministério das Cidades tem detectado falta de capacitação técnica de muitos municípios para levarem adiante políticas habitacionais adequadas, o que impede a liberação do dinheiro federal e gera críticas de lentidão nas ações do governo. A hipótese de que os costumes clientelistas contribuam para tornar ainda mais lento o processo não está descartada. - Não está inserida na cultura política dos municípios a noção de que é preciso reservar terra de qualidade para a população de baixa renda - analisa o diretor de desenvolvimento institucional do ministério, Kelson Vieira Senra. O urbanista Luiz César Queiroz Ribeiro, coordenador do Observatório das Metrópoles (que reúne 27 instituições especializadas) concorda com a avaliação de Senra e afirma que é crescente o surgimento de chefes políticos locais que se transformam em xerifes de áreas habitacionais degradadas. - A última eleição para a Câmara Municipal do Rio é um bom exemplo desse fenômeno em expansão. Só que governos responsáveis não podem ficar a reboque dessa lógica clientelista, que tolera a ilegalidade para criar eleitorados cativos - analisa o urbanista, professor titular da UFRJ. Luiz césar Queiroz Ribeiro observa que, diante da crise social e da falta de uma política habitacional nos últimos anos, ocorreu outro fenômeno: cresceu a pressão das populações de baixa renda para ocupar áreas mais centrais das cidades, próximas ao mercado de trabalho, tornando a expansão desordenada difícil de ser contida pelo poder público. Diretora de urbanização de assentamentos precários do ministério, Inês Magalhães lembra que, além das favelas, houve também uma forte expansão de loteamentos irregulares, geralmente na periferia das cidades, que igualmente revelam alta vulnerabilidade social e carência de infra-estrutura. Se algum prefeito não mostrar muito interesse na proposta federal de instituir parcerias e discutir a questão da habitação ao lado de outros problemas urbanos e sociais da cidade, a ação ''fica mais difícil'' - admite Inês Magalhães. - Por isso, nossa diretriz é debater questões como habitação e saneamento com todos os segmentos, motivando movimentos sociais, empregadores, promovendo encontros e incentivando as parcerias entre os três níveis de governo - complementa. Esse engajamento é importante - explica a técnica - porque a perspectiva é que haja mais dinheiro para investir no ano que vem. A crítica de que o Ministério das Cidades não investiu este ano o dinheiro em caixa se tornou freqüente e levou a especulações sobre a queda do ministro Olívio Dutra. Falta de dinheiro, de fato, não tem sido o maior motivo de queixas dos técnicos do ministério. Os recursos do FGTS destinados ao setor, por exemplo, que foram de R$ 4 bilhões em 2003, subiram para R$ 8,2 bilhões em 2004 e chegarão a R$ 11,2 bilhões em 2005. Foram contratadas R$ 5,1 bilhões em obras de saneamento, setor que deve deslanchar em 2005, segundo Kelson Viena Senra. Além disso, os técnicos do ministério se mostram animados ante a simpatia revelada pelos economistas do FMI para a tese de que que obras de habitação e saneamento não devem ser considerados gastos públicos e sim investimento, deixando assim de serem contabilizados como despesa para o superávit primário. Se o dinheiro para obras não é um problema tão dramático, por que a crítica de que o ministério não mostra resultados práticos? - As obras de saneamento seguem um trâmite burocrático específico. Cada passo tem uma lei que o regula, geralmente com a finalidade de tornar todo o processo mais transparente. Não temos interesse nenhum em atrasar os procedimentos. Se a burocracia é, de fato, demasiada, cabe aos legisladores mudar a lei - responde Kelson Senra. Uma outra forma de acelerar o emprego de recursos na área de habitação é capacitar os municípios a executar programas adequados. Este é justamente um dos principais programas do ministério - anuncia o dirigente. Subsídios para os mais pobres Um dos principais erros detectados pelos técnicos, na antiga política do Banco Nacional de Habitação, era a diretriz de que quase tudo poderia ser resolvido pelas leis do mercado. O resultado dessa visão equivocada foi a inadimplência em massa. O brasileiro pobre, principal cliente das cooperativas populares, não apresentava condições de pagar a prestação da casa própria, por mais despojada que fosse. Hoje os subsídios para as menores faixas de renda estão incorporados à política oficial. Mas nada de dar casa de graça. - Isto afeta a própria auto-estima do comprador e não ajuda a cidadania. Hoje muita gente é obrigada a pagar aluguel em favelas. Seria lógico, por exemplo, que esse dinheiro fosse usado na prestação da casa própria - comenta o diretor de desenvolvimento institucional do Ministério das Cidades, Kelson Vieira Sena. O urbanista Luiz César Queiroz Ribeiro ressalta que a política habitacional só funciona se vier acoplada a outras medidas como um planejamento racional de transportes, que garanta mobilidade para os mais carentes. Em razão das disparidades sociais e do baixíssimo poder aquisitivo da maioria da população - argumenta - os mais pobres procuram morar junto às áreas que se desenvolvem intensamente. - Onde há um pólo de desenvolvimento, nasce uma favela. Os pobres que vão servir aos mais ricos não têm outra alternativa. No Rio, um caso típico é a favela do Rio das Pedras, que cresce no mesmo ritmo da Barra da Tijuca - exemplifica Queiroz Ribeiro. Por isso - argumenta o urbanista - de nada adianta jogar milhares de pessoas em casas populares nas periferias distantes do mercado de trabalho, como era praxe há algumas décadas. Esses conjuntos acabam se transformando em guetos urbanos. No mesmo espírito, complementa Kelson Senra, é política do Ministério das Cidades aproveitar vazios urbanos em áreas centrais, muitas vezes em terrenos públicos, para a construção de casas populares. - O mais importante é que o município faça as suas ações de acordo com diretrizes de planejamento urbano, seguindo um plano diretor, com políticas integradas e a participação da sociedade - complementa Kelson Senra. (Jornal do Brasil – 19/12/2004)
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