Notícia n. 5016 - Boletim Eletrônico IRIB / Setembro de 2003 / Nº 841 - 22/09/2003
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
841
Date
2003Período
Setembro
Description
Área. Divergência. Retificação. Correção da escritura. - Sérgio Jacomino, seleção e verbetação Decisão. J.T. e sua esposa ajuizaram perante a Vara da Comarca de Cáceres-MT ação de retificação de área, com fundamento no artigo 860 do Código Civil c/c os artigos 212 e 213 da Lei 6015 de 31 de dezembro de 1973 (Lei dos Registros Públicos). 2. Alegam que, por escritura pública de compra e venda, tornaram-se proprietários de uma área rural medindo 230,56 ha (duzentos e trinta hectares e cinquenta e seis ares), quando então adquiriram a parte de seus sócios B.S.G. e E.M.G. 3. Após levantamento topográfico realizado por profissional legalmente habilitado, constatou-se que a medida da superfície do imóvel era de 501,74 ha (quinhentos e um hectares e setenta e quatro ares) e não de 230,56 (duzentos e trinta hectares e cinqüenta e seis ares), conforme consta da escritura pública. 4. Todos os confrontantes e outorgantes, cientes da divergência entre as dimensões descritas na escritura e as encontradas pelo engenheiro contratado, concordaram com o objetivo desta ação, conforme declarações de fls. 17/21. 5. Requerem sejam consideradas as referidas anuências expressas pelos confrontantes e alienantes e se determine a retificação do registro e matrícula, a fim de que se faça constar a área real do imóvel em apreço como sendo de 501,74 ha (quinhentos e um hectares e setenta e quatro ares). 6. O Ministério Público local manifesta-se pelo acolhimento da pretensão. 7. Citado regularmente, o Estado do Mato Grosso apresentou contestação, sustentando que os autores pretendem incorporar terras devolutas do Estado ao patrimônio deles, o que contraria os artigos 212 e 213 da lei 6015/73. 8. Sustenta a invalidade das declarações dos confrontantes que deveriam ser citados para esclarecerem o impasse, conforme determina o §2o do artigo 213 da Lei de Registros Públicos. 9. A União manifesta seu interesse no feito e pede ao Juiz processante que decline de sua competência e envie o processo à Justiça Federal. Da mesma forma, o Promotor de Justiça arguiu a incompetência absoluta da justiça comum de Cáceres para o processamento e julgamento do feito, requerendo a distribuição dos autos à Seção Judiciária da Justiça Federal do Estado. 10. Abriu-se vista aos autores, que dissentiram da cota do Ministério Público local, argumentando que a União, regularmente intimada para manifestar seu interesse na ação, deixou o prazo transcorrer in albis. Além disso, as terras excedentes acham-se encravadas na “Sesmaria Boi Morto”, cuja titulação original provém do Governo Imperial, que a transmitiu na forma “ad corpus”, não procedendo, pois, a afirmação de que se trata de terras públicas. 11. Quanto à contestação do Estado do Mato Grosso, sustenta a falta de seu interesse no feito. 12. A Juíza estadual declina de sua competência em favor da Justiça Federal. 13. Distribuídos os autos à 1a Vara da Justiça Federal, o juiz em exercício determinou se retificasse a autuação para se incluir o Estado do Mato Grosso no pólo passivo, além de que os autores promovessem a citação do Incra como litisconsorte passivo necessário. 14. Posteriormente, o Juiz Substituto, observando que há nos autos divergência de interesses entre o Estado do Mato Grosso e a União, determinou fossem os autos remetidos ao Supremo Tribunal Federal, com fundamento no artigo 102, I, “f”, da Constituição Federal. 15. Nesta Corte, o processo foi autuado como ACO 506-0. Deleguei competência ao Juiz Federal da Primeira Vara da Seção Judiciária do Mato Grosso, “para praticar os demais atos instrutórios de ambos os processos, até os relatórios das decisões saneadoras, ocasião em que estes autos deverão retornar a esta Corte para nova deliberação (§ 2o do art. 247 do Regimento Interno)”. 16. Citado, comparece aos autos o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra, sustentando, preliminarmente, seu interesse na ação, tendo em vista encontrar-se a área excedente encravada na fronteira do Brasil com a Bolívia, incidindo, dessa forma, o inciso I do parágrafo único do artigo 1o do Decreto-lei 2375, de 24 de novembro 1987. 17. Requer, preliminarmente, a exclusão do Estado do Mato Grosso da lide, para que, a final seja o pedido indeferido e que busquem os autores, via administrativa, a regularização do imóvel. 18. Intimadas as partes para especificação de provas, os autores e a União deixaram de manifestar-se, tendo o Incra declarado que “não será pela via judicial através da Ação Ordinária, caminho a ser trilhado para regularização e incorporação do imóvel rural ao patrimônio do Autor”. 19. O Procurador-Geral da República opina pela extinção do processo sem julgamento do mérito, por impossibilidade jurídica do pedido, visto que o vício apontado pelos autores corresponde à escritura pública e não ao registro imobiliário, havendo, assim, necessidade à que se lavre nova escritura, sendo defeso ao oficial de registro proceder a qualquer retificação. Ultrapassada a preliminar, requer sejam os autos remetidos ao Juízo a quo para que se proceda à citação dos confrontantes e alienantes do imóvel na forma do artigo 213 do CPC, devendo ser analisados os requerimentos das partes quanto à produção de provas e realização de perícia, verificando-se a real dimensão do bem, além de sua efetiva localização, e a juntada, pelos autores, de documentos que comprovem a propriedade das terras e sua cadeia dominial. 20. É o relatório, decido. 21. Os autores alegam que o imóvel em apreço possui área maior do que a constante da escritura pública juntada por cópia às fls. 116/119, a qual, consignando a área de 230,56 ha, diverge do levantamento topográfico realizado por profissional, que encontrou a medida de 501,74 ha. 22. Vê-se que a alegada divergência entre as medidas se verifica entre a escritura pública e as terras, e não entre a escritura e o registro, pois este confirma integralmente os dados daquela, conforme se pode constatar à fl. 120. 23. Esta Corte, quando ainda era possível exame de matéria infraconstitucional em recurso extraordinário, teve oportunidade de apreciar hipótese idêntica, ao julgar o RE 92464-MS, Djaci Falcão, RTJ 98/415, em que foi mantida a sentença de primeiro grau, tendo o juiz afirmado que “os autores não podiam, como fizeram, com os fundamentos trazidos, pedir a retificação do registro imobiliário, sem que, ou antes, ou cumulativamente, pedissem a correção do enunciado na escritura, para adequá-la, à vontade, e à real avença das partes”. 24. Concluindo seu voto, o eminente Relator assim se pronunciou: “Dessarte, julgando extinto o processo, sem apreciação do mérito, dada a impossibilidade jurídica do pedido, o aresto recorrido jamais negou vigência aos artigos 960 [rectius 860] do C.Civil e 212 da Lei dos Registros Públicos, eis que segundo as decisões na instância ordinária não se cuida de retificação do teor do registro por não exprimir a verdade”. 25. O mesmo se verifica na espécie. Os autores contrapõem a medida constante da escritura à área encontrada pelo engenheiro contratado. O registro, por sua vez, não diverge da escritura. Fica evidenciado, portanto, que os autores escolheram ação inadequada, uma vez que “a retificação de que trata o artigo 860 do Código Civil e o artigo 212 da Lei de Registros Públicos diz respeito à corrigenda que se vincula ao título registrado”. 26. É por isso que M.H.D., mencionada no parecer do Procurador-Geral da República, acentua, verbis: “O interessado deverá, então, providenciar primeiro a realização de outra escritura na qual compareçam as mesmas partes da escritura retificanda, para, depois, retificar-se o registro (RT 160/768; 182/754; 274/680, 389/165)” (in ‘Sistemas de Registro Imobiliário’, São Paulo, Saraiva, 1992, p.236). Ante tais circunstâncias, com fundamento no artigo 21, parágrafo 1o do RISTF, c/c o artigo 267, VI, do CPC, extingo o processo sem julgamento do mérito. Brasília, 10/12/2002. Relator: Ministro Maurício Corrêa (Ação Cível Originária no 506-9, DJU 11/02/2003, p.13/14).
Direitos
IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
Article Number
5016
Idioma
pt_BR