Notícia n. 6261 - Boletim Eletrônico IRIB / Agosto de 2004 / Nº 1227 - 11/08/2004
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
1227
Date
2004Período
Agosto
Description
VALOR ECONÔMICO – 23 A 25/7/2004 - Americanos compram terras no Brasil - Tatiana Bautzer De Washington Agronegócios – Preços baixos e potencial de crescimento da produção atraem cada vez mais investidores dos EUA Fazendeiros do Meio-Oeste americano continuam comprando terras no Brasil para produzir soja, milho ou algodão para exportação. O crescente ganho de competitividade do agronegócio brasileiro acelerou esse processo, e as diversas visitas de associações agrícolas dos EUA realizadas nos últimos anos começam a render frutos e fortalecer a "migração", com investimentos concentrados em regiões produtoras dos Estados de Tocantins, Mato Grosso e Bahia. O movimento de compra de terras ganhou força depois da desvalorização cambial de 2002, estimulado pelo lançamento de cotas de investimento por alguns fazendeiros americanos entre conhecidos e sócios de cooperativas no Meio-Oeste, tradicional área de produção agrícola nos EUA. A diferença entre o preço da terra agricultável nos EUA e no Brasil, além do custo do trabalho, são os principais chamarizes para os investidores. Um acre (0,4 hectare) na região norte de Illinois, um dos Estados americanos produtores de soja custa cerca de US$ 5 mil (R$ 15 mil), enquanto na região de fronteira do Tocantins pode sair por US$ 200. Exemplo típico do interesse americano pelo Brasil é o do fazendeiro Phil Corzine, que até 1998 cuidava de uma pequena propriedade de sua família, de 340 acres, em Assumption; Illinois, cultivando milho e soja. Graduado pela Universidade de Illinois, Corzine dividia a administração da terra com o trabalho em órgãos de financiamento à produção agrícola e a representação na diretoria de associações de produtores de soja do estado. Depois de uma viagem organizada por uma associação de produtores de soja dos EUA à América do Sul, em 1998, Corzine começou a pensar em investir no Brasil, desde que ele não tivesse que se mudar dos Estados Unidos. Dono de uma empresa de consultoria, Corzine decidiu reunir recursos para comprar uma fazenda de grande porte para cultivo de soja no Brasil em uma segunda viagem ao país, em fevereiro do ano passado. Durante a viagem, Corzine encontrou-se com o governador do Mato Grosso, Blairo Maggi - ele próprio o maior produtor individual de soja do mundo -, e também ficou impressionado com as fazendas de soja de Goiás. Surpreendeu-se ao ter sido bem acolhido e visto não apenas como um competidor pelos fazendeiros brasileiros. Conheceu a advogada Neige Caiapó, hoje diretora de sua empresa agropecuária no Brasil, e quando voltou para os EUA abriu uma empresa para captar US$ 2 milhões e comprar uma grande área para cultivo de soja. Para abrir a companhia, em agosto de 2003, Corzine associou-se a dois amigos americanos da mesma região, Brad Glenn e Kent Sorrels. Como diretora da empresa no Brasil, Neige recebeu uma cota de 2% do capital e os restantes 98% ficaram com os três americanos. A South American Soy LLC teve autorização da Securities and Exchange Comission (SEC) para captar recursos junto a investidores, em cotas de US$ 10 mil cada, que dão direito a participação na subsidiária brasileira, a Nova Fronteira Agropecuária, com sede em Uberaba, Minas Gerais. A primeira experiência foi o arrendamento, por três anos, de uma pequena faixa de terra de 21 hectares no sul do Estado de Tocantins, para pesquisa. A safra inaugural de soja plantada em novembro, foi colhida em abril deste ano. No último mês de maio, já com quase US$ 700 milhões captados, Corzine comprou no Brasil a fazenda Campo Grande, de 210 alqueires (4,81 hectares por alqueire) no município de Araguaçu, na região do Rio Formoso, em Tocantins. A fazenda fica a 9 quilômetros de Alvorada, onde há uma unidade da multinacional Bunge que comprará a colheita. Por enquanto a fazenda tem apenas dois funcionários, sendo um deles Silvio Caiapó, irmão de Neige, que será o administrador da fazenda. Em novembro próximo, deverão ser plantados entre 20 e 30 alqueires de soja em uma área que hoje está ocupado pela criação de gado. A idéia é aumentar a área plantada ano após ano, até atingir os 65% da área total permitidos pela legislação ambiental na região. Corzine diz que o que mais atrai os investidores é o baixo preço da terra e do custo do trabalho. "Essa é a principal vantagem econômica", diz. Mas não é só, observa. Há outros fatores que favorecem o crescimento da competitividade da soja brasileira em relação à americana. Um deles é o regime de chuvas, bem mais regular do que na região de Illinois onde ele tem sua propriedade. "Nós temos normalmente um período de seca que nem sempre é possível ver com exatidão e que influencia muito a produção", afirma. O custo do maquinário produzido no Brasil também é mais baixo do que nos Estados Unidos. "A longo prazo, a agricultura crescerá muito no Brasil e criará riqueza. Queremos que nossos fazendeiros participem um pouco desse crescimento. Além disso, comprando terras na fronteira há um potencial de alta de preços imobiliários que pode elevar nosso retorno", explica Corzine. Os dividendos só começam a ser pagos depois de sete anos, e Corzine prevê uma taxa de retorno em dez anos de 22% a 23% do capital, em dólar. Espera-se que a empresa pague entre 40% e 50% dos lucros como dividendos aos acionistas nos EUA. Até o fim do ano a companhia deve atingir a meta de US$ 1,5 milhão a US$ 2 milhões e usar o dinheiro para a compra de mais terras, maquinários e sementes para ampliar a produção em terras brasileiras. Corzine diz que escolheu o sul de Tocantins, entre o Mato Grosso e Goiás, por causa dos preços mais baixos da terra e da possibilidade de escoamento da produção por via fluvial. E afirma que, ao abrir uma empresa na área de fronteira brasileira, está "repetindo um pouco da história” de sua família, que desbravou uma área do Meio-Oeste americano há algumas gerações. No curto prazo o fazendeiro não pretende mudar-se para o Brasil, porque sua mulher, Carolyn, tem "um bom emprego" nos Estados Unidos e a adaptação de suas duas fiIhas, Michelle e Andréa, seria difícil. Mas Corzine pretende visitar o empreendimento brasileiro de três a quatro vezes por ano. Na mesma direção está Adam Howell, 29 anos, que também está captando recursos para a compra de uma fazenda na região de cerrado do oeste da Bahia. Seu objetivo é captar cerca de US$ 4 milhões, tanto de fazendeiros do Estado de Indiana, onde mora sua família, como de ex-colegas de universidade - Howell é formado em economia pela Universidade de Princeton, uma mais prestigiadas dos Estados Unidos e do mundo. Por enquanto, Howell tem 500 acres comprados com recursos próprios no oeste da Bahia, onde cultiva experimentalmente soja, algodão e milho, e emprega apenas uma pessoa. Como tem maquinário, fez um acordo com uma fazenda vizinha para emprestar as máquinas e receber em troca a ajuda de alguns de seus empregados. Howell já morou no Brasil durante a produção da primeira safra, na temporada 2002/03, e quer radicar-se definitivamente no país quando completar a captação de recursos para a compra da fazenda. Sua ligação com a agricultura também está no sangue. Em Indiana, a família do economista arrenda cerca de 4,5 mil hectares para o cultivo de soja, melancia e tomates. Ele concorda que a diferença nos preços da terra e do trabalho é um dos principais motivadores de seu investimento no Brasil. Na região escolhida, oeste da Bahia, os preços não são tão baixos quanto em área de fronteira, porque a região já tem produção comprovada e está próxima de centros consumidores no Nordeste. Mesmo assim, o acre de terra custa cerca de um terço dos US$ 2,5 mil a US$ 3 mil praticados no Estado de Indiana. O fazendeiro conheceu o Brasil também em 1998, e resolveu passar alguns meses no país com um amigo americano, aprendendo português e fazendo contatos para o trabalho no Brasil. Nesse período arrendou um pequeno lote de terra para começar o cultivo de maneira experimental. Depois comprou um lote de 500 hectares, cuja produção começou este ano. Até agora produziu milho e algodão, mas sua intenção é adquirir uma fazenda grande para a produção de soja. Quando concluir a captação de recursos junto a ex-colegas de faculdade e fazendeiros interessados em sua região, Howell pretende comprar uma fazenda de grande porte no oeste da Bahia. "Os primeiros a perceber o potencial da agricultura brasileira são os americanos que trabaIham na área. Os preços de terra nos Estados Unidos estão disparando por fatores que não estão ligados à produção, como subsídios, razões fiscais ou a pressão de desenvolvimento de cidades", diz Howell, que acredita que a competitividade da agricultura brasileira vai "chacoalhar" a agroindústria nos EUA. Hoje de volta a Indiana, para fechar os contratos com os investidores, Howell deve voltar à Bahia no fim do ano para concluir a compra da fazenda e começar o negócio. A intenção é contratar de 25 a 30 pessoas para o trabalho. O economista tem um discurso diferentes de outros americanos que vendem o Brasil como uma nova "corrida do ouro". "Vejo muito esse discurso de ficar rico rápido, de ressaltar apenas o preço baixo da terra e do trabalho". De fato, alguns fazendeiros ressaltam aos amigos americanos os baixíssimos salários no interior do Brasil, lembrando que o salário mínimo representa menos de US$ 3 (R$ 9) ao dia e é considerado bom em algumas regiões remotas do país. "Acho que esse não é o único fator. A mudança é mais profunda na indústria agropecuária global. A vantagem competitiva continuará no Brasil a longo prazo, mesmo depois que os preços da terra e os salários subam com o desenvolvimento do país", afirma Howell.
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