Notícia n. 6130 - Boletim Eletrônico IRIB / Junho de 2004 / Nº 1177 - 30/06/2004
Tipo de publicação
Notícia
Coleções
Edição
1177
Date
2004Período
Junho
Description
Em entrevista à TV Justiça o secretário de Controle do Uso do Solo de Osasco fala sobre a regularização fundiária e os registros públicos. - O doutor José Carlos Vido, Secretário de Controle do uso do solo do Município de Osasco, foi entrevistado pelo registrador Ruy Rebello Pinho no programa Cartório, o parceiro amigo, da Anoreg-BR, exibido pela TV Justiça no dia 1º de junho e reapresentado no dia 4/6. No programa, o secretário falou sobre a regularização fundiária no Município de Osasco e destacou a importância dos registros no processo de regularização. Ruy Pinho – A regularização fundiária não depende somente da vontade da prefeitura, precisa de um contexto favorável. O que está sendo feito no município de Osasco? José Carlos Vido – Temos hoje uma situação de ambigüidade no município de Osasco. Na verdade, a primeira regulamentação da Constituição de 1988 veio com o Estatuto da Cidade. É uma legislação considerada bastante moderna pelos urbanistas, mas a realidade é diferente. As cidades estão implantadas de uma forma diferente. A solução para a regularização fundiária hoje passa por um grande compromisso de toda a sociedade. É fundamental que o órgão público da cidade, no nosso caso a prefeitura, os cartórios e o próprio Judiciário, através do Ministério Público, estejam dentro desse contexto. Não há solução se não houver um compromisso de todos. Ruy Pinho – Os cartórios do município de Osasco estão participando desse compromisso ético e moral em prol da regularização? José Carlos Vido – Apesar da realidade ruim sentimos um clima bastante favorável. São mais de 170 loteamentos com algum tipo de irregularidade no município, ou porque o loteador não implantou a infra-estrutura, ou porque o loteamento foi feito à revelia da lei. Loteadores inconseqüentes parcelaram e transformaram o sonho do adquirente em pesadelo, porque ele comprou o terreno do qual tem a posse, mas não tem a propriedade. Temos conversado bastante com os dois cartórios de registro de imóveis da cidade. O Ministério Público tem sido um grande parceiro nessa questão, prestando assessoria e nos orientando a encontrar caminhos. A legislação está aí e a realidade também. Osasco hoje vive um momento muito bom e favorável. Ruy Pinho – Discute-se que a regularização não acontece porque falta vontade política da prefeitura ou porque o registro de imóveis exige demais. Há outros órgãos institucionais em Osasco buscando soluções para o problema? José Carlos Vido – Os cartórios têm assessorado muito nessa questão. Algumas pessoas pensam que o cartório é o órgão que atrapalha o processo. Eu vejo de outra forma. Temos visto os cartórios como parceiros e consultores. Osasco é privilegiado nesse aspecto, pois temos dois registradores do melhor nível, que estão comprometidos e têm interesses iguais aos nossos. O que queríamos é que o cadastro imobiliário da prefeitura fosse rigorosamente igual ao do registro de imóveis. Essa seria a cidade legal que buscamos e planejamos. Não consigo enxergar essa situação, embora ainda tenhamos notícias de que cartórios são tradicionalistas e conservadores. E com o conservadorismo não corrigimos a cidade. Diferencio sempre isso, a cidade dos nossos sonhos e a cidade real. A região metropolitana, principalmente as invasões, ocupações de áreas verdes e institucionais, tornam um emaranhado de soluções impossíveis de serem atingidas se somente aplicarmos aquilo que está escrito na lei. Precisamos buscar alternativas modernas que consigam enxergar, além daquilo que é legal, aquilo que é possível fazer. Ruy Pinho – Como surgiu a idéia do Grupo Executivo de Regularização de Loteamentos, Gerlo, e quais as expectativas de desenvolvimento do grupo? José Carlos Vido – Há cerca de um ano e meio, em conversa com pessoas do governo do estado, buscávamos formas para a regularização. A própria Constituição estadual, no artigo 180, inciso VII, tira a autonomia do estado para legislar sobre o assunto. Essa é uma briga. Entendo que o município precisa ver a sua realidade, se adequar e buscar as melhores formas. Mediante pressões do governo do estado e reuniões com o pessoal do Graprohab, por exemplo, buscamos soluções que pudessem resolver alguns loteamentos com áreas invadidas, ocupadas indevidamente e sem a infra-estrutura adequada. Isso acabou combinando com a edição de um decreto, em dezembro, que criou o programa Pró-lar regularização. Esse programa está em fase de organização e deve combinar com um grupo diferente do Graprohab que vai tratar especificamente de regularização, uma vez que toda legislação pertinente se refere à aprovação e implantação de novos loteamentos. Não há lei específica para a regularização, e essa é a dificuldade. Em Osasco, antecipamos essas providências e criamos o Gerlo, um grupo executivo de regularização de loteamento, onde temos quatro secretarias municipais que estão representadas, a Secretaria de Planejamento, Secretaria dos Negócios Jurídicos, Secretária da Habitação e a Secretaria de Controle do Uso e do Solo, da qual sou o atual titular. Convidamos e tivemos a satisfação de contar com a participação dos dois cartórios de registro de imóveis da cidade. Vendo isso com muito otimismo, o grupo começou a se reunir, foi criado por decreto do Executivo em janeiro e, cerca de 15 dias depois, demos posse à comissão. Ruy Pinho – Quais são os resultados que se esperam desse grupo? José Carlos Vido – Esperamos regularizar pelo menos 50% dos loteamentos que hoje estão em situação irregular. Ruy Pinho – Essa meta é ambiciosa ou realista? José Carlos Vido – Realista e ambiciosa. Se não houver ambição não temos norte. Ruy Pinho – Qual deve ser a participação do Graprohab no processo de regularização de loteamentos já implantados? Existem posições divergentes a respeito, uma entendendo que tudo deve passar pelo Graprohab, e outra que defende que nos casos de loteamentos já implantados não há necessidade da participação do Graprohab. José Carlos Vido – Em São Paulo temos o exemplo da ocupação indevida de 1 milhão de pessoas que vivem no entorno da Represa Billings, sendo ela uma área de mananciais. Como resolver essa situação? Onde vamos colocar 1 milhão de habitantes? Nesse caso é preciso levar em conta o aspecto social. Da mesma forma que o inciso VII, do artigo180, da Constituição estadual veda ao município alterar a destinação, também tira do município a possibilidade de resolver o problema. Ruy Pinho – Uma solução possível para a preservação das áreas públicas seria a regularização por concessão e direito real de uso que, sendo um contrato administrativo, poderia prever cláusulas. Poderia prever, por exemplo, que em caso de fusão de lotes para a verticalização uma porcentagem dessas áreas retornaria ao patrimônio público. Assim, uma área que hoje não tem registro, tem baixo valor de mercado e está condenada à estagnação econômica se transformaria em oportunidade de investimento para os empreendedores e possibilidade concreta de retorno dessas áreas para a municipalidade e para o uso comum do povo. Como o senhor vê essa possibilidade? José Carlos Vido – Sem dúvida, seria grande a valorização patrimonial dessas áreas a partir de intervenções transformando favelas em núcleos habitacionais. A questão é que como se tratam de áreas públicas, entende-se que a comunidade que comprou o seu terreno e foi morar num loteamento novo na expectativa de ter uma qualidade de vida melhor, precisa ser levada mais em consideração. Por isso, entendo que a solução passa por um grande projeto habitacional que envolva os governos municipais, estaduais e principalmente federal, que deve ter a grande parcela de responsabilidade. Poderíamos, por exemplo, transformar uma favela em conjuntos habitacionais, ainda que haja a necessidade de comprar ou desapropriar áreas particulares, e há dinheiro para isso, o que precisa é a decisão de se fazer esse projeto para que se substitua de fato esses núcleos subnormais. Aí sim, teremos a possibilidade de devolver para a comunidade aquilo que lhe pertence. Áreas públicas, áreas verdes e institucionais estão incorporadas no patrimônio da municipalidade, mas pertencem à comunidade, o direito de uso dessas áreas é dela. A comunidade precisa disso, faz parte do seu contrato de compra e venda e tem que ser cumprido. Ruy Pinho – A diretora do Resolo de São Paulo, Evangelina Pinho, propõe o uso do microcrédito para tornar possível a instalação de equipamentos urbanos, mas, muitas vezes, a municipalidade não tem verba para viabilizar isso. A regularização fundiária não pode ser parcelada como uma geladeira, um fogão. Como incentivar a regularidade dinâmica, uma vez que os custos do sistema brasileiro de registro são mais baixos do que os custos do sistema norte-americano, por exemplo, que é de seguro. Eu diria que esse é um dos fatores que diferencia o cadastro municipal do registro de imóveis. Muita gente tem a escritura definitiva, o imóvel quitado, mas não leva a registro porque tem que pagar à vista. O Banco do Povo talvez pusesse ajudar. O ideal seria que houvesse uma fonte de recursos que pudesse ajudar a regularizar o imóvel de forma parcelada e suave para o morador. Esse seria um grande avanço. Mas é também necessária a ajuda dos governos. No caso de São Paulo, o Banco do Povo criado pelo governo Geraldo Alckmin vem sendo bastante estimulado na geração de renda, de empregos, buscando financiar atividades produtivas. Entendo que seria uma alavanca forte para que as pessoas buscassem o registro e a regularização do seu imóvel. O imóvel é o melhor patrimônio que o ser humano pode ter, por isso é preciso ter o título.
Direitos
IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil
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6130
Idioma
pt_BR